Hoje tenho uma reflexão filosófica, poética, literária (com certeza), por isso venho sozinha e não em terceira pessoa. Venho Alice.
Antes, é importante que você tenha ciência dos símbolos do autismo: o quebra-cabeça e o símbolo de infinito. O quebra-cabeça eu acho bem bonitinho e inclusivo, afinal, somos todos peças diferentes que se encaixam e cada uma tem o lugar certo, exato, para fazer sentido neste todo coletivo o qual chamamos de mundo. Cada peça tem suas cores, seu formato e sua importância. Como dizer que isso não é um bom símbolo de inclusão?
Mas, um podcast sobre o significado de infinito, deixou-me inquieta. Primeiro aprendi que o nome do símbolo é lemniscata, vem do latim lemniscus e representa algo sem começo nem fim. Talvez a representação pictográfica tenha origem na serpente grega Ouroboros, a qual devora a si mesma a partir da cauda, retrato de que tudo pode ser recriado. Que coisa linda! Tanta cultura envolvida num simples número oito repousado...
Além disso, aprendi que o infinito é o contrário de finito. Óbvio, eu sei, porém quando pensamos em definições, isso passa a dar um tilt no cérebro. Tenta comigo. Se definirmos o finito como aquilo que pode ser particionado e contado ou mensurado num dado tempo - ainda que extremamente longo -, teremos que o infinito é imensurável, portanto eterno e nunca teve um início, simplesmente é. Isso muda parâmetros das dimensões conhecidas pela Física e cálculos matemáticos ficam ainda mais abstratos.
Ok, já entendi que estou entediando você com toda essa nerdice! Então, vamos lá: por que este símbolo - lemniscata - com toda essa complexidade e poder de indefinição representa o autismo? E, para ajudar, não é de qualquer cor, mas um conjunto de todas as divisões da cor branca. Isso foi proposital para dar um hiperfoco para os autistas? Conseguiram! Pelo menos para mim!
Infinito é algo que não se define, mas é a própria definição, como seu símbolo - e sim, eu gostei da palavra lemniscat, por isso a estou repetindo. E o autismo é algo que não se define, nem define as pessoas do espectro. É inimaginável, intangível, mas sensível. Como assim?
O simples viver é uma forma de sentir a infinitude. É como o pensamento, você jamais consegue parar de pensar, mas nunca sabe de que forma ou quando começou. É como sentir os grãos de areia, ou as gotas do oceano, ou a brisa, ou a chuva. Você sabe que em algum momento aquela sensação vai acabar. Para mim, não vai.
Eu fecho os olhos e me deparo com essa eternidade. Sim, em um momento ínfimo, eu sinto o caos que me preenche. E este caos sempre existiu, sempre existirá. Eu só preciso escolher as informações corretas no milissegundo que você espera por uma resposta ou uma reação. Isso exige um esforço imenso. Imagine viver naquelas caixas de sorteio que funcionam com vento, só que não é possível se mexer direito de tantas coisas voando. Estas coisas são partículas de glitter. Às vezes elas machucam, arranham.
É assim. Eu acho que descobrir que sou autista me fez perceber ser infinita na plenitude dos meus pensamentos, na eternidade das minhas palavras, no momento de um piscar de olhos, do tamanho do meu caos. Ficou confuso para você? Imagina para um autista, então!
Nunca um símbolo foi tão bem escolhido!
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O cativante universo de Alice
Non-FictionAos 39 anos descobrir que é autista não é algo muito feliz, principalmente quando passou todo esse tempo tentando se encaixar e tendo plena consciência de ser diferente, mas sem saber o motivo.