dias atuais

26 4 1
                                    

Pov: Billie

Estávamos sentadas em uma cafeteria improvisada dentro do aeroporto, cercadas por malas e pelo murmúrio constante de pessoas indo e vindo, cada uma com seu destino traçado. Para qualquer um que olhasse de fora, éramos apenas mais duas viajantes, tentando decidir para onde ir. Mas para nós, aquela decisão era muito maior. Era sobre vida ou morte.

Eu segurava um guia de viagens na mão, folheando distraidamente enquanto mordiscava um biscoito de chocolate. Estava tranquila, algo raro para mim. Depois de meses de tensão, finalmente tínhamos conseguido sair da ilha sem que ninguém nos seguisse - ou assim eu acreditava. O mundo estava diante de nós, e a ideia de escolher um novo lugar para recomeçar era quase emocionante.

- E que tal o sul da França? - perguntei, olhando para Alyssa com um sorriso. - Imagine só: vinhedos, comida incrível, campos de lavanda...

Ela não respondeu. Estava sentada à minha frente, com os braços cruzados e o olhar fixo em algum ponto distante. O maxilar dela estava tenso, e eu sabia exatamente o que isso significava. Alyssa não estava feliz. Não estava tranquila.

- Ok, talvez a França não seja o seu estilo. - Tentei outra abordagem, folheando o guia até encontrar outra página colorida. - Que tal a Nova Zelândia? Longe de tudo, paisagens incríveis... Podíamos até criar ovelhas. Você sempre disse que queria uma vida simples.

- Billie - ela cortou, a voz baixa e séria.

Parei de folhear o guia e olhei para ela. Alyssa ainda estava encarando o nada, mas a intensidade no rosto dela me fez largar o livro.

- O que foi? - perguntei, tentando esconder a preocupação.

Ela finalmente virou o rosto para mim, e o que vi nos olhos dela foi o suficiente para fazer meu estômago revirar. Não era apenas preocupação. Era medo.

- Isso não vai funcionar - ela disse.

- O que não vai funcionar? - retruquei, confusa.

- Fugir. Ficar correndo de um lugar para o outro. Fingir que podemos simplesmente desaparecer e recomeçar.

Suspirei, recostando-me na cadeira.

- Alyssa, nós conseguimos. Estamos longe. Ninguém sabe onde estamos. Podemos escolher qualquer lugar no mundo para começar de novo.

Ela balançou a cabeça, os lábios se comprimindo em uma linha fina.

- Meu pai não vai parar, Billie. Ele nunca para. Você sabe disso.

- Ele nem sabe onde estamos - insisti, tentando manter a calma.

- Não importa. Ele vai descobrir. Sempre descobre.

Fiquei em silêncio por um momento, deixando as palavras dela pairarem no ar. Eu sabia que ela tinha razão, mas não queria admitir. Não depois de tudo o que fizemos para escapar.

- Então o que você sugere? - perguntei finalmente, cruzando os braços.

- Que a gente volte.

- Voltar? - Minha voz saiu mais alta do que eu pretendia, e algumas pessoas ao redor nos lançaram olhares curiosos.

- Sim, voltar. Para Los Angeles. Para resolver isso de uma vez.

Ri sem humor, balançando a cabeça.

- Resolver como, Alyssa? Pedindo gentilmente para o seu pai nos deixar em paz? Você sabe que isso não vai acontecer.

- Então a gente faz acontecer. - Ela se inclinou para a frente, o olhar dela queimando o meu. - Billie, eu não vou ficar fugindo pelo resto da vida. Eu não vou passar cada segundo olhando por cima do ombro, esperando que ele mande alguém nos matar.

Engoli em seco, desviando o olhar. Eu sabia que ela estava certa, mas isso não tornava a ideia menos aterrorizante.

- Eu larguei tudo por você, Alyssa - sussurrei, as palavras saindo mais duras do que eu pretendia. - Larguei meu posto, minha família, minha vida inteira. Eu fiz isso porque achei que poderíamos ser felizes, longe de tudo isso.

- E eu sou grata por isso, Billie. Mas não dá mais. Não é vida. - A voz dela quebrou no final, e eu senti um aperto no peito.

Ficamos em silêncio por alguns minutos. O som do aeroporto parecia mais alto agora, cada voz e cada passo amplificados.

- Voltar significa guerra, Alyssa - falei finalmente, a voz baixa. - Você entende isso, não entende?

- Eu entendo. Mas guerra é melhor do que viver assim.

A sinceridade na voz dela me desarmou. Alyssa não era como eu. Ela nunca quis aquele mundo. Nunca quis a violência, o sangue, as decisões impossíveis. Mas ela estava disposta a enfrentar tudo isso agora, por nós.

Respirei fundo, fechando os olhos por um momento.

- Tudo bem - disse finalmente. - Se você acha que é a única maneira, então vamos voltar.

Quando abri os olhos, ela estava me encarando com uma mistura de alívio e determinação.

- Juntas? - ela perguntou.

- Juntas. - Peguei a mão dela por cima da mesa, apertando-a com força.

Era assustador, mas era a única coisa que fazia sentido. E, apesar de tudo, eu sabia que enfrentaríamos o que viesse. Juntas.

Separated by blood Onde histórias criam vida. Descubra agora