12. Branco

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Do you recall, not long ago

We would walk on the sidewalk

Innocent, remember?

All we did was care for each other. *

Major Lazer feat MØ, Lean On

                            

- Olá, Sol.

Ela nem se mexeu.

O cheiro era demasiadamente pesado. Barulhento, escuro e nojento. Era esgoto, certeza. Não consigo me lembrar do momento o qual decidi me aproximar daquela mulher. Logo após descobrir quem era, caminhei a passos largos, embora vagarosos, até o corpo.

Sutiã, minissaia, salto alto, brincos e uma bolsa minúscula. Branco, preto, vermelho, preto e prateado, respectivamente. Ela ainda não havia me visto quando parei, perguntando a mim mesmo se devia fugir ou aproximar-me. Afinal, eu falaria o quê a ela? "Oi, tudo bem? Vi você aqui no beco e vim lhe encontrar"?!

Em meio aos meus devaneios, ela voltou toda sua massa em minha direção. Fitando-me e tirando o cigarro de vez em vez da boca. Não tive reação, por mais que desejasse acariciá-la, perdi as forças e a coragem.

Ficamos assim durante um tempo. Separados fisicamente por um metro, mas psicologicamente por um ano-luz. Olhos nos olhos.

Um cravado ao outro. Seus olhos estavam vermelhos, e estranhamente miravam a mim como carne no almoço. Seria desejo? Pude sentir seu olhar me tocando, carregado de sexualidade explícita. Ela era um demônio. Crescia em minha pele labaredas infindáveis. Apenas com seu olhar.

Corpo da Sol era bonito. Mas, eu não consegui sentir nada além de ânsia e de uma vontade primitiva tomando espaço em mim pouco a pouco.

A mulher, não mais senhorita, jogou o cigarro no chão violentamente, e sem tirar, nem por um segundo, seus olhos dos meus, veio em minha direção. "Inspira, expira, inspira" meu consciente tentava me manter vivo. No entanto, a cada passo daquela mulher, eu queria o demônio.

Ela se aproximou muito de mim, tanto que eu podia sentir seu hálito e  com um pequeno esforço seu nariz encontrava o meu. Não sabia o que falar. Apenas continuei olhando-a. Com ódio, mas entregue à Sol.

Sol pegou minha mão e virou-se para o beco. Pensei em resistir, mas só pensei mesmo.

- Venha - ela disse baixinho.

Soltei sua mão e segui seus passos. A medida que avançávamos no beco, o cheiro de esgoto aumentava. Logo, a mulher parou defronte a uma porta de madeira velha e gasta. Tirou um monte de chaves de dentro da bolsa, e entramos.

- Sobe, é o segundo quarto à direita.

- Como assim, Sol?

- Sol? Quem é Sol?

Engoli a seco. Como assim? Deus, como assim? Ela estava brincando comigo? Ou havia mentido para mim?

- Qual o seu nome?

- Mariana. Agora, sobe.

Subi a escada achando que ia cair a qualquer momento. O mal-cheiro estava atenuado lá, passei pela primeira porta, e adentrei no segundo cômodo.

Havia uma cama. Somente isso. Nada de janelas, ou armários. Apenas uma cama. Era de ferro, o colchão envelhecido e coberto por um pano branco. As paredes tinham inúmeras marcas de infiltração e não tinha muita luz para que pudesse ver com mais nitidez.

- O que estou fazendo aqui? - desejei como nunca voltar para o livro, pensei em sair do quarto e ir embora, mas logo, a Sol ou a tal Mariana adentrou no recinto.

- Senta na cama.

Ela estava nua. Abri, inconscientemente minha boca em um grande "o".

- Sol... Calma. - Lançou a mim um olhar feroz e eu sentei.

O ataque da leoa fora certeiro. Os instantes que passei ali provavelmente não sairão da minha mente tão cedo. No entanto, entre as milhares de perguntas que tentei fazer a ela, nenhuma fora respondida. Tentei passar as mãos em seu cabelo, beijar sua boca. E ela não me permitia nenhum ato. Nenhuma palavra.

Quando o "trabalho" acabou, apenas me disse para ir ao banheiro e depois sair por onde entrei. Saiu do quarto, e não a vi mais.

                            

* [ Você se lembra, não muito tempo atrás

Nós andávamos na calçada

Inocentes, lembra?

Tudo que fazíamos era cuidar uns dos outros. ]

Sol Onde histórias criam vida. Descubra agora