Não sei o que faz um pai lançar tanto ódio sobre seus filhos.
Quanto a mim, nunca me deu carinho, nunca olhou sequer para meu rosto como pedaço da sua existência, como fonte do seu gene.
Maria sempre me protegeu das maldades que o pai queria me provocar.
Daquela vez, usava até o próprio corpo para isso.
Ele terminou de jogar aquele líquido amarelado e de odor forte, que saia do seu sexo, sobre as folhas do livro, sobre as folhas de couve.
Os personagens se escondiam embaixo delas, tentavam proteger o rosto para não verem o horror das cenas que sucederiam.
O pai continuou um movimento frenético com aquilo que saia de dentro da sua calça - mais parecia um chicote grosso.
Friccionava a pele pra cima e para baixo até que deu outro grito, parecido com aquele que fez quando estava sobre Maria, e lançou no rosto dela um cuspe grosso que saltou do seu açoite.
Antes de fechar a braguilha e guardar aquilo que não deveria estar exposto, usou-o para dar, no rosto da minha irmã, duas lambadas fortes.
"Já te fiz de brinquedo meu..." - falou maldosamente ele - "...cuide da sua bonequinha..." - disse referindo-se a mim - "...mas não atrase meu almoço"
Sua áspera língua ainda realizou uma última visitada em Maria: seu rosto delicado, onde não havia o cuspe grosso, foi a estrada para ela passar.
Como uma lesma, o caminho trilhado deixou uma gosma brilhando.
Antes ele tentou lamber seus miúdos lábios, mas ela fugiu.
No rosto foi inevitável, pois ele segurou-a firme pela nuca.
"Eu sei que você gosta, não precisa fazer charme."
O cheiro de fumo caseiro ficou impregnado no rosto de Maria, junto com tantos odores que estavam repletos naquele ambiente.
Por causa do líquido amarelado que pai lançou sobre as folhas, as letras do livro foram se misturando umas as outras como se estivessem dissolvendo: do mesmo jeito como se jogasse aguarrás em uma obra de arte.
Os personagens foram sumindo.
Parecia que derretiam no ar.
Deixaram-me ali, sozinho com aquela situação nova e desconhecida.
Eu realmente entendia quase nada do que estava acontecendo.
Antes de desparecer definitivamente, Diadorim até tentou me dar a mão para me levar para o seu mundo fantasioso e me tirar do meu exageradamente realista.
Cheguei tarde até ele.
O que sobrou da fantasia foram manchas.
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Espero suas percepções, viu?
E se merecer, uma estrelinha?
Valeu!
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Trágica Família (Parte 1)
General FictionSINOPSE: Quatro pessoas de uma família (um filho, uma filha, um pai e uma mãe) encontram-se instalados no chão da sala de sua casa. Algo grave aconteceu com eles e cada um, antes de apagar os olhos, relembram os momentos da vida que os conduziram n...