Já era quase meia-noite quando despertei. Não sabia como eu conseguira dormir com calça, moletom e tênis, mas pelo visto nada disso fizera diferença para meu corpo exausto. No meu quarto não havia banheiro exclusivo, era para todas as garotas, então eu me levantei devagar, peguei minha nécessaire, uma toalha e um roupão. Eu detestava me vestir nos banheiros. Sempre me sentia sendo observada.
O banheiro que era enorme e continha vários chuveiros, pias e privadas, depois que as luzes eram acesas à noite, só eram apagadas pela manhã, pois o banheiro era o único lugar do colégio que se poderia ir a qualquer hora do dia e da noite. Como eu imaginava, estava vazio. Melhor assim. Coloquei minha toalha e roupão na porta da cabine do chuveiro, pus minha nécessaire e roupas sobre um banco comprido no meio do banheiro.
Já debaixo do chuveiro, abri a torneira e deixei a água quente molhar meu cabelo e corpo. Tomar banho era revigorante e um calmante natural, definitivamente era uma das poucas coisas que eu não detestava nessa minha vida. Eu estava tão absorta ao meu banho terapêutico que mal ouvi passos. Estremeci. Ninguém além de mim tomava banho quase meia-noite.
— Olá? — disse.
Eu não estava com medo, uma das minhas qualidades era minha coragem. Coragem que obtive através dos vários filmes de terror que assisti sozinha, já que eu nunca tinha ninguém para assistir comigo. Um dos meus preferidos: Carrie — A Estranha, o original, não o remake, por favor. Irônico ser esse o meu preferido? Provavelmente, daí vinha meu "fascínio" ou coincidência por nomes com "C".
A única resposta que obtive foi o apagar de todas as luzes do banheiro, deixando o espaço na completa e extrema escuridão. Rapidamente vesti meu roupão, mesmo com meu corpo molhado e abri a porta, tentando sem sucesso enxergar alguma coisa. Dei de ombros para mim mesma e saí tateando até chegar no banco, peguei minha roupa e nécessaire, não fiz questão de pegar a toalha, queria mesmo era sair logo dali, não por medo, mas para me prevenir de qualquer brincadeira que estava por vir. Sim, eu tinha certeza que isso só poderia ser coisa da G-alguma-coisa. Essa era sua réplica contra mim.
Andei devagar e me batendo em algumas coisas pelo caminho até chegar na porta do banheiro, que, como eu esperava, estava trancada. Clichê, até mesmo para a G-alguma-coisa. Eu não acredito que ela achava mesmo que me deixar trancada em um banheiro me daria medo, ou que eu começaria a gritar e chamar por ajuda, enquanto me arrependia de todos os meus pecados, ou uma mistura doida de tudo isso. Enfim, eu simplesmente comecei a rir. Sério, eu gargalhei alto como nunca antes.
— G... isso é ridículo até pra você. — disse entre risos. — Eu não tenho medo do escuro, pelo contrário.
Era uma pegadinha até engraçada, eu admitia. Afinal, meu aniversário era no dia 2 de novembro, simplesmente o dia dos finados em alguns países... Será que a G-alguma-coisa sabia disso e queria, sei lá, me matar de medo? Sinceramente, eu amava ironias desse tipo, mas a única "morte" que ela poderia me dar, era de rir.
Ainda rindo, caminhei até o banco e me deitei nele, usando minha roupa como travesseiro. Meu aniversário estava a cada minuto mais perto e eu nem queria pensar nisso, esperava que ninguém mais do colégio soubesse que amanhã eu completaria mais um ano, como diria meu pai, mais perto da morte. Surpreendi-me quando a porta do banheiro foi aberta e a luz acesa.
— Isso é ridículo para você, Estranha? — sim, G-alguma-coisa me chamava de 'estranha' como se fosse meu nome.
Gleda... Groa... eu realmente não gravava seu nome, estava no banheiro acompanhada com suas duas amigas metidas. Levantei-me do banco e comecei a andar até a saída do banheiro, quando as três pararam na minha frente. Eu não aguentava mais aquilo. Por que elas não podiam fingir que eu estava morta? Seria uma solução perfeita para todas nós.
— Saiam agora! — berrei e por incrível que pareça as três caíram de bunda no chão em sincronia. Não era que minha voz parecia ter algum poder? Incrível! Teria que usá-la mais vezes.
Passei por cima delas e continuei a caminhar devagar até a saída, como se nada tivesse acontecido, mas G-alguma-coisa não pensava dessa forma, ela novamente cravou suas unhas em meu braço, dessa vez doendo mais, pois eu só usava um roupão fino. Virei-me para mandá-la ir à merda, mas eu fui novamente surpreendida por ela. Tive tempo de ver suas amigas em pé com os olhos arregalados, e sem esperar mais, a outra mão da G-alguma-coisa voou no meu rosto.
Eu percebi sua mão no ar antes de me atingir, mas eu não havia sido tão rápida, dei um passo para trás e senti os dedos da G raspar em minha bochecha, contudo, esse não havia sido o problema, o problema era o que aconteceu no momento que eu dera um passo para trás: eu escorreguei e cai. Tudo em seguida aconteceu rápido, mas para mim parecia ser em câmera lenta e agonizante. Pude ouvir os gritos das amigas da G e da própria G-alguma-coisa, como plano de fundo, enquanto eu caía.
Seus gritos não eram de escárnio, eram de susto, pois eu parecia morta. Eu não me via, obviamente, mas eu podia imaginar o que elas viam: minha cabeça batendo no banco, muito sangue e meu corpo enfraquecendo. Elas não estavam erradas em gritar, eu realmente estava morrendo.
Eu até já me sentia morta.
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A Estranha
Ciencia FicciónClarice Jones. Esse era meu nome. Claire Blue. Esse tornou-se meu nome quando James Sky, um Rastreador, disse-me que eu era uma Renascida. Metade terráquea, metade marciana. Eu era uma Estranha em meu país, em Marte eu tornei-me ainda mais Estranha...