Quando eu e Merry chegamos na frente do colégio, eu me surpreendi. O local era simplesmente lindo, parecia um castelo moderno, sem torres.
— Você não se perde aqui? — perguntei. — Meu senso de direção é péssimo.
— Não precisa ter senso de direção aqui. — Merry me explicou quando entramos. — As salas de aula são por ordem alfabética e nível de dificuldade. Iremos ir para a aula de História de Marte I., ou seja, só precisamos seguir o primeiro corredor até chegar na letra H.
Por dentro era tão bonito quanto por fora. Por fora parecia ter, no mínimo, cinco andares, por dentro, parecia muito mais. Por fora era dominado de cores e desenhos de grafite, por dentro também. Em diversos lugares dentro havia nomes de alunos, desenhos profissionais e outros nem tanto.
Por fora havia grama e muitas árvores, mas naquele tom de outono, avermelhado, parecendo prestes a cair. Por fora o local parecia ser gigante, por dentro, maior ainda.
Assim que entrávamos, víamos cinco elevadores transparentes, cada um indicava um nível do I ao V, e indicando também que em cima eram as últimas letras do alfabeto, M a Z. Logo em baixo, no térreo, havia seis corredores. Três de um lado, indicando os níveis I e II, junto com uma placa que dizia de A a N, e o banheiro masculino e feminino; outro indicando os níveis restantes, também do A a N.
— Existem matérias do A a Z? — questionei, lembrando-me que o meu folheto deveria ter apenas umas dez matérias, e a maioria com a letra A.
— Sim, algumas turmas são de apenas cinco pessoas. É quase uma conversa entre um professor e alunos.
— Mas por que eu não recebi todas as matérias?
— Não é necessário, sinceramente, algumas matérias não serviriam para nada pra você, mas com o tempo você as descobrirá e decidirá se tem ou não interesse em frequentá-las.
Eu e Merry entramos no corredor de nível I, que estava quase vazio. Na verdade, todo prédio parecia vazio, provavelmente a maioria já estaria em aula. Alguns passavam por nós indo e vindo das salas, mas tudo tão organizado que nem barulho faziam.
— Qual a matéria no X?
— São para coisas bem específicas, afinal, tem gosto pra tudo... Tem a equipe do Xadrez, e há aulas de Xantóforo, mais outras coisas estranhas.
— Xantóforo? — nunca tinha ouvido falar nessa palavra.
— É algo relacionado a animais, como peixes e crustáceos. Eu sei lá, é muito louco pra minha cabeça.
Eu ri, assentindo. Se era louco para cabeça dela, quiçá para minha.
Quando chegamos em frente à sala de Loren, eu fiquei tensa de puro medo, nem sequer tinha porta, nenhuma sala tinha porta, e a parede ao redor da sala dele era verde.
— Eu nem trouxe caderno! — sussurrei para Merry.
— Não usamos caderno em Marte, só de desenho. — Merry me avisou. — Você trouxe seu celular, certo? — assenti. — Então é tudo que você precisa, Pequena Claire.
Ao ouvir o "Pequena Claire", Loren nos viu, parando sua aula e sorrindo.
— Entrem, meninas.
Eu e Merry entramos junto com outra menina, porém a menina logo se sentou e eu junto com Merry continuamos em pé de frente a toda classe. Todos nos olhavam, e tive mais uma vez um vislumbre de meu sonho, mas os olhares deles não eram como do sonho, eram tranquilos, menos o da menina que acabara de entrar. Ela parecia respirar — figurativamente — o ódio. Sua cor era vermelha, como seu cabelo e toda sua roupa. Ela não deveria ser muito mais velha que eu.
Eu não tinha parado para pensar sobre as cores, e se elas se misturavam no dia a dia, pois no refeitório, cada um sentava em sua mesa, porém ali na sala havia pessoas de todas as cores, sobretudo, cada um sentava em seu próprio grupinho, como um colégio normal.
No fundo da sala o grupo do neutro enchia, mas havia um ou outro de outras cores. Logo na frente o grupo do amarelo e verde sobressaia, no meio da sala os de vermelho e rosa eram maioria, nos cantos os de azul e roxo dominavam.
— Alunos — anunciou Loren —, essa é Claire Blue e sua Acompanhante, Merry Pink.
Numa sala de aula normal os alunos acenariam e continuariam sentados, em Marte, numa sala de aula pra lá de incomum, os alunos, grande maioria deles, se levantavam, nos cumprimentavam e se apresentavam; outros continuavam sentados, mas acenavam com sorrisos afetivos, até os das cores neutras.
Por ser nível I os alunos deveriam ter minha idade, isso era tranquilizador, talvez fosse o primeiro dia de aula de alguns deles também.
— Podem se sentar, meninas. — Loren nos disse. — A única regra dentro da sala é: nada de uso de seus poderes.
Havia um lugar na antepenúltima cadeira do canto e outra ao lado da mesma, logo me sentei na do canto, e Merry ao meu lado.
— Pegue seu celular. — Merry me disse e eu arqueei uma sobrancelha. — Pegue e coloque em cima da mesa.
Estranhando, obedeci. O celular era uma telinha de vidro e, assim que eu coloquei em cima da mesa da minha frente e apertei no meio, como automaticamente mostrou para eu fazer, uma imagem surgiu na minha frente e percebi que era uma folha de caderno virtual.
Olhei para os lados e Merry assentiu, rindo, entendendo meu estranhamento sobre aquela maravilha digital.
Reparei como todos da sala usavam seus celulares. Quando a imagem refletia na frente de cada um, eles escreviam e rabiscavam com o dedo. Tentei fazer o mesmo e funcionou. Em cima da folha estava escrito:
"Todos os arquivos serão salvos automaticamente.
Esse conteúdo pertence à Claire Blue, sendo assim, só ela tem acesso a eles.
Em caso de perda, a mesma poderá pegar outro, com todos os seus arquivos do atual na loja mais próxima.
Se for achado por terceiros, será devolvido."
Marte era realmente um planeta digno. Não havia a suposição de ser ou não devolvido, ele seria devolvido, pois como Loren havia falado, não teria lógica roubar uma coisa que você poderia ter de graça.
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A Estranha
Science-FictionClarice Jones. Esse era meu nome. Claire Blue. Esse tornou-se meu nome quando James Sky, um Rastreador, disse-me que eu era uma Renascida. Metade terráquea, metade marciana. Eu era uma Estranha em meu país, em Marte eu tornei-me ainda mais Estranha...