08 - Luke Cloud, parte 1

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Marte; A-Zero, 86 de Primavera.



Já não era mais noite, Luke dissera-me, era madrugada, e passara tão rápido ao lado dele que eu não sabia se era ruim ou péssimo. Eu estava mais próxima do que deveria de meu Conselheiro.

Assim que fechou a porta atrás de si e disse a mim que poderíamos começar, minha tensão foi quase palpável. Mas não começamos de imediato, ele levou-me para o sofá e explicou-me calmamente sobre as cores e os possíveis poderes que eu poderia ter.

— Claire, você é roxo, com forte afinidade ao azul, naturalmente os poderes dessas cores, como sua profissão, são algo voltado à arte. Seu poder pode ser simplesmente o de harmonizar uma música, é um poder comum, singelo, mas nenhum poder é considerado inútil.

— Não quero que você se menospreze caso seu poder não seja de grande importância para a sociedade, mas poderá ser para si mesma. As pessoas das cores neutras, como eu, têm forte habilidade com a mente e emoções alheias. Nosso poder mais comum é o de ver auras, ter sextos sentidos fortes, ver o futuro iminente de segundos à frente ou um futuro mais distante. Pessoas de amarelo e verde são ligadas às outras também, mas de uma forma menos invasiva. Elas leem feições, por exemplo.

— Como Loren. — disse.

— Sim, como Loren. — Luke assentiu. — Seus poderes comuns são de ler feições, sentir leves sextos sentidos, e alguns até tem o poder de fazer piada, alegrar naturalmente a todos ao seu redor é um poder. As pessoas de vermelho e rosa são mais ligadas aos objetos, por serem mais agressivas.

— Como Merry. — sorri.

— Sim, ela levita coisas, derruba outras, um poder leve, nada muito fora do normal. Há alguns piores, que movem uma pessoa, por exemplo.

Arregalei os olhos e Luke me tranquilizou:

— Não se preocupe, essa prática é proibida, como qualquer outra que possa vir a ferir alguém, a não ser na Arena de Esportes, que eu te apresentarei depois, quando for a hora. Recapitulando: pessoas de amarelo são ligadas às sensações humanas, pessoas das cores neutras são ligadas às mentes humanas, pessoas de azul são ligadas às artes, mas muitos acabam mexendo com mente alheia também, e finalmente, pessoas de vermelho são ligadas aos objetos, alguns podendo mover quase qualquer coisa viva ou não.

— Eu não sou muito ligada à arte. — admiti. — Menos a filmes, gosto de filmes, mas só de assistir, não me imagino cantando, nem atuando, ou seja lá mais o quê.

Luke riu.

— Provavelmente você mexerá com a mente, mas os de azul ou roxo que mexem com a mente só podem fazer isso de uma forma branda, podendo ler apenas os pensamentos do momento, não de toda uma vida da pessoa, como os de cores neutras podem fazer.

— Qual seu poder? — perguntei tensa.

— Eu não posso ler mentes! — Luke estava sentado ao meu lado do sofá e sorria de um jeito caloroso. — Eu vejo o futuro.

— Próximo ou distante?

— Ambos.

— Como funciona exatamente isso? — questionei.

— É simples: se algo considerado por mim importante vier a acontecer, em poucos segundos, eu verei. Como tomar uma queda. Ver o futuro distante é diferente, eu posso colocar meu foco sobre determinada pessoa e ver flashes do futuro distante dela. Flashes reveladores, é claro. Por isso sou um Conselheiro, dou conselhos e opiniões reais sobre o futuro da pessoa, e então moldamos para tudo correr bem.

Sorri.

— Como vamos saber quais são os meus poderes?

— Testes, dos mais diversos.

Luke sorriu e uma parte de mim ficou ainda mais tensa, quente, parecendo viva. Quase da mesma forma que eu me sentia quando estava com James.

* * *

Quando os testes começaram eu não sabia direito o que fazer. Foi ao mesmo tempo tenso e engraçado.

— Por que designaram você como meu Conselheiro? — perguntei enquanto estava de pé com poucos metros de distância entre mim e Luke.

— Porque nós não combinamos. Eu não posso ser seu amigo, senão poderá atrapalhar na minha visão de futuro distante para você.

— É quase como um psicólogo ou psiquiatra?

— Eles não podem se relacionar com seus clientes?

— Não.

Luke sorriu e levantou a mão rápida no ar, encostando-a em minha bochecha.

— Sim, eu sou como um psicólogo, mesmo que em Marte não se tenha isso. E a propósito, você não é ágil.

Sorri sem graça pelo seu toque em minha bochecha e afastei sua mão dela, batendo com a minha em seu braço.

Este era um dos testes. O primeiro. Luke havia me explicado brevemente que, se eu tivesse habilidades com as feições ou mente humana, logo saberia o que ele viria a fazer comigo, caso fosse algo grave, como um tapa.

Eu me sentia estranhamente bem com Luke e confiava nele. Esse poderia ser um problema, ou o problema. Eu confiava nele a ponto de saber que ele não faria nada grave comigo.

— Claire — Luke chamou minha atenção e eu fitei aqueles benditos olhos cinzentos —, seu celular está no bolso, se você vier a se irritar muito comigo poderá sair daqui e ligar facilmente para Loren, certo?

Reparei que Luke não havia chamado Loren de pai, mas apaguei isso de minha mente e assenti pensando no que era realmente importante no momento.

— Certo. — disse.

Estávamos próximos, meus pés, já descalços, encostavam em algumas almofadas do chão, minhas costas estavam próximas da parede e estranhamente começaram a ficar ainda mais próximas quando Luke deu o primeiro passo em minha direção. E outro.

Luke estava lentamente chegando mais perto de mim, e eu estava me afastando. Não sabia o que fazer, não sabia o que decidir. Eu me sentia hiperventilar, se meu coração estivesse batendo, ele definitivamente estaria a mil por hora.

— Você está bem? — ele murmurou.

Eu dei mais um passo para trás e senti minhas costas baterem na parede, deixando-me sem saída.

O olhar de Luke era um tanto assassino, mas, ao mesmo tempo, sedutor. Eu sentia-me perdida. Seria isso ainda um teste? Oh, eu não sabia. Eu era péssima com uma série de coisas, e adivinhações era uma delas.

Assenti à pergunta de Luke, embora eu não estivesse bem, sobretudo, eu não estava mal.

Sem eu me dar conta, Luke já estava de frente a mim, com sua testa quase colada a minha. Eu sentia seu hálito de algo que eu não reconhecia, mas parecia ser bom.

Em um certo momento eu achei que Luke iria me beijar, pois ele estava muito perto e então me assustei quando ele me jogou no chão, me empurrando levemente.

Eu cai perfeitamente em cima das almofadas e Luke Cloud riu da minha cara.

— Definitivamente você não lê feições. — ele disse entre risos. — Se lesse saberia que eu estava aprontando alguma. Mas também há uma outra razão de você não ter feito nada...

— Que seria? — indaguei aproveitando para deitar-me confortavelmente nas almofadas.

— Talvez você quisesse minha proximidade.

Cloud sorriu e, de uma hora para outra, seu sorriso já não era mais de graça e sim de pura sedução. Ali em pé, próximo a mim, eu via o próprio anjo alado, porém um anjo pecador, ou melhor, selvagem.

A EstranhaOnde histórias criam vida. Descubra agora