— Ele [James] é um cara que vale a pena. — sentei-me quase deitando na cama, Merry continuou na beira da mesma.
Dei de ombros, fingindo não me importar.
— Embora seu irmão, nem tanto. James tem alguns problemas com seu irmão mais velho. Acho que sérios problemas.
— Por quê?
— Eles são filhos do mesmo pai: Loren. Mas Loren nem sempre foi um exemplo de homem, traiu a mãe do irmão de James com a mãe de James, Ally.
— Loren terminou com sua antiga esposa para ficar com Ally?
— Não chamamos de "esposas" ou "maridos" em Marte. Não nos casamos, achamos essa atitude estúpida, na verdade. Complicado também, somos práticos, nunca trocamos nossos nomes ou adicionamos outros. É desnecessário, entende? Casamento, na Terra, é só um papel e trocas de nomes. Amor de verdade aqui funciona de uma forma diferente.
Eu assenti e ela continuou:
— Mas sim, Loren terminou com sua antiga mulher para ficar com Ally. Isso devastou seu outro filho, e ele colocou a culpa em James. James poderia ser considerado na Terra um "bastardo".
— E aqui o que James é considerado?
— Uma prova de amor. — Merry respondeu. — Loren e Ally se amam, é para sempre, ambos provaram isso para o outro com a tatuagem.
— Tatuagem? — arqueei uma sobrancelha.
Merry balançou sua cabeça.
— Desculpe não explicar isso. Uma prova de amor em Marte pode ser com um filho, e uma tatuagem no pulso, com o desenho que você quiser, mas com a cor da pessoa que você pretende amar até o fim de sua vida.
Reparei naquele momento a tatuagem no pulso de um coração da cor lilás em Merry.
— Por que o pulso? — indaguei.
Merry tocou a sua tatuagem enquanto sorria.
— Minha mãe. — respondeu minha pergunta não verbalizada. — Sabe, nós temos dois olhos, duas orelhas, duas pernas, duas mãos, dois braços, enfim, uma série de partes do corpo em dois. Nós podemos entrar em coma se formos atingidos no cérebro, ou sangrar um sangue quase vivo se formos atingidos no estômago, mas podemos morrer se for cortado um de nossos pulsos.
— Há em nossos pulsos uma veia ligada diretamente ao nosso cérebro. Você pode sobreviver enxergando com um olho, uma orelha, uma perna, um braço, mas não poderá sobreviver se for cortado um de seus pulsos.
Institivamente olhei para meus pulsos.
— O amor é assim. Algo totalmente avassalador, aquilo que nunca sequer pensamos em viver sem, porque não conseguiríamos. E como nossos pulsos, que são dois, podemos amar de uma forma avassaladora duas vezes em nossa vida, seja pelos seus pais, amigos, namorado, ou até namorados.
Fiquei calada por um tempo. Eu não sabia o que dizer. Merry dizia com tanta propriedade que eu só sabia acenar concordando.
— Acho que te enchi com minhas próprias merdas sentimentais, huh?
— Não, claro que não! — respondi. — Acho que estou um pouco fascinada com sua descrição sobre o amor.
— Você nunca amou ninguém, Claire?
— Eu sempre achei que amava minha mãe — comecei sinceramente —, mas eu não sinto nem falta dela. Isso me faz um ser humano péssimo, não é? — afundei minha cabeça no travesseiro, deitando-me na cama.
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A Estranha
Science FictionClarice Jones. Esse era meu nome. Claire Blue. Esse tornou-se meu nome quando James Sky, um Rastreador, disse-me que eu era uma Renascida. Metade terráquea, metade marciana. Eu era uma Estranha em meu país, em Marte eu tornei-me ainda mais Estranha...