Fragmento 7: Provisões

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"O terror dá asas aos pés."

Virgílio

As ruas estavam vazias num cenário que lembraria o pós-guerra, exceto que as construções estavam de pé. A agitação corriqueira da maior cidade da América Latina evaporou no ar e nada lembrava mais o grande centro e coração financeiro do país. Era apenas um lugar, com construções, sem vida, sem movimento. E aquele cheiro. O cheiro que constantemente os lembrava da situação complicada em que estavam. Leonardo desligou o ar condicionado do carro. O ar podre que tomava conta da cidade e a deixava com cheiro de morte achava seu caminho pelas entradas de ar. Tinham que sair da cidade.

_ Pra onde a gente vai?

_ Tô pensando, to pensando – ele resmungou.

_ Você não disse que eles destruíram as estradas?

_ E destruíram, a gente vai ter que se virar por dentro mesmo.

Dirigindo rápido, contornando ruas, seguindo pela contramão, Julia viu quando entraram na Avenida Nossa Senhora do Ó. Muito lixo no asfalto, alguns corpos também. Parando repentinamente, Leonardo encostou o veículo e desligou o motor.

_ O que foi?

_ Suprimentos.

Ao seguir o que ele apontava, conseguiu ver a placa de um grande supermercado. Havia luzes em seu interior, possivelmente de algum gerador próprio. Mas não podiam simplesmente entrar e pegar o que queriam. Havia um estacionamento coberto e um ao ar livre, mas com certeza havia mais daquelas coisas espreitando na penumbra do subsolo. Além do mais, era uma área muito aberta. Logo ao lado do mercado tinha a ponte da Freguesia e seus escombros que antes ligavam o bairro da zona norte com a Lapa.

_ A gente tem que ir num mercado menor – Julia pareceu ler seus pensamentos.

_ É, tem razão. Eu não me lembro de nenhum por aqui... – coçava a cabeça, pensando.

_ Tem um na Itaberaba, lá em cima – ela apontou

– com entrada para a avenida. Deve ser fácil encostar na frente e entrar.

_ Boa ideia.

Ligando novamente o carro, os dois atravessaram a Inajar de Souza e seguiram na contramão até a avenida Itaberaba, importante eixo de ligação do bairro. Leonardo seguiu por ruas paralelas, temendo encontrar zumbis ou forças federais. Quando entraram na avenida de fato, já perto do mercado que Julia mencionara, viram um cenário de guerra. Barricadas tinham sido montadas na porta do supermercado. As grades estavam no chão, retorcidas. Carros virados nas calçadas, lojas pegando fogo. Sangue manchando o asfalto e pessoas mortas baleadas no estacionamento de uma loja. Analisando a entrada do mercado, Leonardo viu que ele estava escuro. Tinha muito lixo na porta, que estava escancarada. Alguém já passara por ali, o lugar foi saqueado.

_ Valeu a tentativa – ele disse – a gente não tem escolha, tem que ser lá mesmo.

_ Mas e se tiver daquelas coisas lá dentro?

_ Se a gente não arriscar, Julia, não tem como a gente sair da cidade.

Fazendo a volta, eles continuaram pela avenida que conduziria de volta à Nossa Senhora do Ó, o ponto de partida. Mas quando já estavam perto da descida, Leo parou, deu marcha ré e parou para observar a delegacia do bairro. Portas abertas, muita bagunça no interior, corpos estirados na entrada e no estacionamento, barricadas com sacos de areia nos acessos laterais e um jipe militar virado do avesso na calçada.

_ O que foi?

_ Armas. Preciso de armas e munição. Fica aqui.

_ Leo...

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