"Luz, mais luz."
Johann Wolfgang von Goethe
Julia estava apreensiva, andando de um lado a outro do muro com o binóculo na mão. Viu a Blazer passar por uma rua de seu campo de visão, mas a perdeu atrás das árvores. Mas então ouviu um som conhecido de ronco de motor. Com o binóculo, ela buscou pela estrada e lá vinha ele, saindo da cidade a milhão. Ele deve ter encontrado alguma coisa, talvez mais daqueles zumbis malditos. Julia às vezes se repreendia por pensar assim, pois eles foram pessoas um dia.
Ela desceu correndo as escadas, pegando o controle que abria o portão. Ficou esperando, oculta por uma parede, esperando pelo sinal, duas buzinadas de leve. Pouco tempo depois, ela ouviu o chiado nervoso do motor encostado perto do portão e o sinal. Subindo devagar, o portão de ferro deu passagem e Leonardo passou apressado para dentro e parou bem adiante. Nenhum zumbi do outro lado, Julia fechou o portão. Voltava com um sorriso tímido indo ao seu encontro e o viu sair da Blazer, batendo a porta com força, jogando o 762 no chão, algo que ele sempre tinha muito cuidado. Com as mãos no capô, ele resmungava, xingava, bufava, sem lhe dirigir o olhar.
_ Leo, que foi?
Ele tremia, seu rosto nem parecia do sempre calmo Leonardo. Olhava para baixo o tempo todo, arranhava a lataria do capô, socando ao mesmo tempo. Quando Julia tentou chegar perto ele se afastou, contornou a Blazer e foi para o outro lado, longe dela.
_ Que foi? Que aconteceu?
Girando no lugar, sem saber o que fazer, Leo abriu o porta-malas e ela viu a quantidade de coisas que ele trouxera.
_ Você vai ter bastante suprimento, é só racionar que vai ficar tudo bem...
_ Leo...
_ Tem combustível aqui suficiente até pra sair do estado, mas procure áreas menos populosas...
_ Leo – ela o interrompeu de novo.
_ Cala a boca e escuta!
_ Você tá me assustando! – ela berrou com ele.
Julia nunca pensou que fosse vê-lo chorar. E era um choro de desespero. Segurando seu rosto com as duas mãos, ele a olhou profundamente, querendo beijá-la, mas sem poder.
_ Você vai ter que ficar sozinha, minha gata... Eu não posso te acompanhar mais, nem te proteger...
_ ... o que...
_ ... Mas com o que eu te ensinei, você é esperta... vai conseguir se virar.
_ Leonardo, o que aconteceu lá embaixo?
Ele tremia tanto que nem conseguia falar. Julia pensou o pior. Viu seu agasalho aberto e o tirou. Ao levantar sua camiseta, perto das suas costelas, uma marca nítida de mordida.
Leonardo nunca saía sem seu colete. Justo naquele dia, ele não o usou.
_ Ah, não... – lágrimas verteram de seus olhos – Leo...
_ Você vai ter que ficar longe de mim meu anjo... Eu vou ser um perigo pra você em pouco tempo.
Uma dor capaz de dilacerar seu coração a impediu de gritar, mas Julia estava desesperada por ver a pessoa que salvou sua vida, aquele que amava, para quem se entregou sem pudor, agora condenado e sem chance de salvação. Sentindo-se um imbecil, burro e descuidado, ele também chorava, distante dela pelo menos uns cinco metros. Sabia que logo viria a febre, as convulsões, as dores pelo corpo cedendo ao vírus e ele se tornaria um perigo a qualquer um ao seu redor. Gemendo de dor, de medo, pela perda, pela solidão que a envolvia, Julia caiu no chão e lá ficou vários minutos, apenas chorando.
O que ele tinha feito? Tinha estragado tudo...
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MUNDO Z
TerrorE se no meio de um apocalipse zumbi, você se encontrasse na maior capital do país? O que você faria?