Fragmento 9: Informações

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"Não me venham com conclusões! A única conclusão é morrer."

Fernando Pessoa

Com o sol da manhã no rosto, Leonardo acordou dolorido por ter dormido encostado à grade do deck da piscina. Seu relógio marcava sete da manhã. Um ar frio da madrugada ainda pairava sobre os morros do vale do Juqueri, mas o sol brilharia com força mais tarde. Julia estava quase invisível sobre a montanha de edredom com cobertores e a única parte visível era a cabeça e tufos de cabelo. Ele estava cansado, queria poder dormir numa cama e ter uma boa refeição. Mas um banho já resolveria seus problemas por ora. Olhando para a piscina que apesar de ter algumas folhas e gravetos flutuando estava limpa, Leonardo pensou num banho matinal gelado para despertar.

Julia sentiu o sol batendo em seu rosto. Acordando de um sonho sem sonhos, ela respirou fundo o ar gelado da manhã e ouviu o barulho de água. Não se lembrava de estar na praia. Quando se virou, viu que Leonardo nadava na piscina de tamanho razoável e provavelmente devia estar congelante. Mas ele parecia não se importar. Dava longas braçadas, indo e voltando, indo e voltando, com grande habilidade. Como ele conseguia, ela nem podia imaginar. Mas seus olhos ficaram grudados quando Leo apoiou as mãos na beira da piscina e num impulso pulou para a parte seca. Era um corpo atlético, muito bem cuidado. Ainda tinha marca de uma sunga, deixando suas nádegas brancas. Tinha um dragão negro de olhar feroz e fumaça saindo pelas ventas tatuado na omoplata esquerda, um arame farpado abraçando todo o seu bíceps esquerdo e o tigre branco, símbolo do GOE tatuado no ombro direito. Taí uma coisa que não se via todos os dias, ainda mais molhado. Julia pareceu perder os pensamentos por um instante, enquanto apenas o via sacudir o corpo, tirando o excesso de água para terminar de se enxugar. Voltando à posição original, ela esperava não ser pega no flagra e fingiu continuar dormindo. Só ouviu o portão fechando o mais silenciosamente possível quando ele desceu para trocar de roupa.

Assim que ele voltou com alguns bolinhos e suco para o café da manhã, a viu de pé bocejando e procurando calçar os tênis.

_ Ei, bom dia.

_ Bom dia... – ela resmungou, vendo que ele já estava completamente vestido, jeans, tênis, camiseta do GOE e um agasalho preto por cima.

_ Café da manhã?

_ Ah, valeu. Onde você tomou banho? – ela viu seu cabelo molhado.

_ Na piscina, quer tentar? Só que tá gelada – falou de boca cheia de bolo.

Leonardo parecia tão bem-disposto, que ela arriscaria um banho.

Após comerem, ele colocou as coisas no carro e ficou lá embaixo esperando, com o fuzil de prontidão e recarregado, de vigia. Ele não ouviu grunhidos, nem o farfalhar de passos pela grama seca ao redor da casa, mas sabia que tinha mais daquelas coisas por ali. Ouviu o gritinho abafado de Julia quando ela entrou na água e riu de lado com as reclamações dela. Era bom ter companhia. Sem namorada, que não aguentou a rotina de um policial, sem a irmã, que pegou uma doença maldita e era melhor estar morta do que ser um zumbi, sem ter como saber se a família em Sorocaba estava bem. Pensando nisso, ele puxou seu smartfone do bolso do moletom.

Estranhamente tinha sinal. E quando tentou acessar a internet, ela entrou. Não acreditou no que via. Sinal de civilização, enfim. As notícias, no entanto, eram de um dia. Até os grandes jornais do país estavam desatualizados. A palavra em letras garrafais era EVACUAÇÃO em todos eles, por decreto federal. Imagens de conflitos nas ruas, rodovias detonadas e ruas entupidas cheias de carros com pessoas que tentaram fugir das cidades. Imensos crematórios ao ar livre com os zumbis já abatidos e pessoas que virariam zumbis executadas pelas autoridades. Todos os aviões estavam no chão com ordens de Brasília para derrubar qualquer tipo de aeronave não autorizada. Tentativas desesperadas de conter uma doença que se espalhava cada vez mais rápido.

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