3. Nome de anjo

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Samuel estacionou o carro de Elias em frente ao restaurante. Escolheu um que ficava aberto até altas horas, já que era quase uma da manhã. Quando o amigo emprestara-lhe o dinheiro e o carro, apertara sua mão com orgulho. Iria crucificá-lo se soubesse que ele a estava levando para jantar. Quando desceram do veículo, Samuel contemplou-a mais uma vez: Arlequim abandonara completamente o visual de stripper; usava uma blusa folgada branca, de mangas compridas, e jeans azul. Os cabelos já secos haviam ganhado volume.

Deus, como é linda, pensou.

Os dois entraram no restaurante; ela o olhando intrigada. Não sabia qual a intenção dele levando-a até ali. Escolheram uma mesa para eles. O garçom aproximou-se e cada um pediu algo. Assim que se afastou, Samuel percebeu que ela o olhava intensamente nos olhos.

— Fico sem graça com esse olhar — disse sorrindo.

— Estou tentando descobrir de que planeta veio.

— Nossa, sou tão feio assim?

Ela riu.

—Eu olho em seus olhos e não vejo maldade, nem segundas intenções. Posso fazer uma pergunta que está me deixando louca?

— Claro.

— Você é gay?

Primeiro ele riu, depois pareceu ofendido.

— Claro que não. Eu pareço gay?

— Não — ela sorriu. — É que não consigo pensar em nenhum heterossexual que recusasse passar uma noite comigo de graça.

— Já disse que não recusei. Estamos juntos, não estamos?

Ela sorriu mais uma vez ternamente. Como uma figura colorida em um desenho preto e branco.

— Você dança muito bem — ele elogiou.

— É meu trabalho — ela disse olhando para baixo. Seu olhar tornara-se triste.

Samuel notou claramente que aquele era um assunto desconfortável para ela.

— Bebe cerveja?

— Também.

Ele chamou o garçom. Pediu uma cerveja gelada. Não queria realmente beber, mas além de querer dar a ela a impressão de que não era um menino, queria se soltar mais.

— Por que "Arlequim"?

— É um personagem da CommediaDell'arte, um gênero de teatro que surgiu na Itália no século XVI. Arlequim é na verdade um personagem masculino.

Ele estava impressionado com a resposta dela. Percebeu que a estava subestimando.

— Interessa-se por teatro?

— Meu sonho era ser atriz ou bailarina. Sabe, usar o corpo para encantar as pessoas — deu um sorriso triste. — de certa forma eu faço isso hoje.

Mais um assunto desagradável, pensou Samuel. Ele tentaria fazer ao máximo com que ela não ficasse triste ou constrangida. A cerveja chegou. O garçom derramou nas duas taças o líquido espumante e se afastou. Samuel bebericou pensando em alguma coisa inteligente para perguntar.

— Me fala um pouco de você — ela disse tomando um gole, olhos fixos nos dele, como se o estudasse o tempo todo.

— Não tenho muita coisa pra falar. Minha vida é um saco.

— Aposto que não. Já jogou "eu nunca"?

— Não.

—Jogava na faculdade. É bem simples. Mas só tem graça com bebida quente — ela disse já fazendo um sinal para o garçom. — Uma garrafa de tequila, por favor.

Arlequim [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora