Capítulo VI - Brianna - "Sentimento recíproco"

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Passei o peso de um pé para o outro, entediada. Nick e Nate conversavam há um tempo sobre pizza, e não me deixavam falar. Bom, acho que se deram bem logo de primeira. Juntos, eram meio loucos.
Inclinei minha cabeça para trás, observando meu reflexo retorcido na barra de metal do portão da escola devido a um dobramento. Mordi com força o lábio inferior, sentindo minha mão formigar. Eu não parava de pensar naquela peça de teatro. Eu não queria atuar nela, mas pelo visto, era uma obrigação.
Ergui os olhos para ver o carro preto que tinha acabado de virar a esquina, vindo em nossa direção. Minha mãe, finalmente. A aula tinha acabado fazia algum tempo, e a escola estava quase vazia, pois todos os alunos - ou quase todos - já tinham ido embora.
Fui correndo apressada para entrar no carro e ir para minha casa, os cabelos esvoaçando por causa do vento refrescante, e ao mesmo tempo, congelante. Abri a porta com força e me virei, vendo que para Nick e Nate ainda discutiam, encostados no muro, balançando as mãos freneticamente, enfatizando cada uma de suas palavras. Eles pararam e acenaram com a cabeça para mim.
Me sentei no banco do carona, apoiando a cabeça no revestimento de couro preto do carro. Minha mãe me olhou com um sorriso estranho, e eu lancei um olhar para suas mãos levemente enrugadas pousadas sobre o volante, e ela acompanhou meu olhar.
- Ah... Não...
- Mãe...
- Brianna, não.
- Mãe!
- Não mesmo!
- Por favor!
Ela fechou os olhos e contraiu os lábios, prendendo a respiração. Virou a cabeça lentamente em minha direção e depois respirou fundo.
- Está bem, está bem.
Trocamos de lugar e meus olhos brilharam ao segurar a volante com força. Girei a chave, e comecei a sair com o carro bem devagar.
- É fácil, você consegue. É s-só... - estreitei os olhos e pude ver as mãos da minha mãe tremendo. Bem, eu não tinha carteira, mas não podia ser tão ruim assim.
Mordi o lábio inferior e afundei o pé no acelerador, e o vento forte veio direto contra a minha cara, provocando uma risada estranha que brotou do fundo da minha garganta. A cada vez eu ia mais rápido e ficava bem melhor. Pude sentir meu coração disparar, meus dedos tremerem e as palmas de minhas mãos suarem, mas não tinha melhor sensação do que estar na direção de um automóvel.
Quando parei no semáforo, lancei um olhar para a minha mãe. Ela estava com o olhar fixo na traseira do carro da frente, e seu rosto estava sem cor. Ela engoliu em seco e contraiu os lábios.
- Relaxa mãe. - sorri.
- Q-que fique bem claro que se acontecer algum acidente, é você que vai pagar os prejuízos, o.k.?- ela me fitou - E se por acaso eu morrer, quero um caixão de luxo.
- Mãe! Eu não vou bater o carro! Pare de colocar isso na minha cabeça! E... Bom, temos assuntos mais importantes pra discutir agora.
Senti os pelos da minha nuca se eriçarem e minhas pernas tremerem. Endireitei-me no banco e mordi com tanta força o interior de minhas bochechas que por um segundo senti um gosto fraco de sangue. Eu estava com medo da reação de minha mãe. Até porque, se eu fosse minha filha, eu ficaria com medo de mim mesma. Porém, ao contrário do que eu imaginava, minha mãe soltou uma risada tão inesperada que fez com que eu desse um pulo.
- Ah, não se preocupe com isso, Briza. Finalmente você faz uma coisa como essa em anos e ainda espera que eu fique brava? Já estava na hora de começar a soltar mais essa franga.
Meu corpo relaxou quando ela disse isso, e só aí percebi como estava tensa. Suspirei, aliviada, e continuei quando o semáforo ficou verde novamente.
Quando chegamos em casa, eu entreguei a chave do carro para minha mãe e ela passou a mão na testa, "aliviada por não ter morrido". Nunca foi comprovado cientificamente, mas acho que ela tem algum tipo de distúrbio mental.
Me joguei em cima da cama, exausta, e não foi difícil pegar no sono. Depois de algum tempo acordei com um barulho vindo de cima da cômoda do meu quarto e esfreguei os olhos. Estiquei um pouco o corpo e ergui o braço, tirando o telefone do gancho.
- Alô?- respondi, tentando disfarçar a voz nasal.
- Ahm, Brianna? Oi, é o Nate.
- Nate!- me levantei tão subitamente que meu pé bateu na quina da estante de madeira. Reprimi um grito e fui pulando até uma poltrona com um pé só, segurando o outro com a mão direita. - Oi...
- Então - não podia vê-lo, mas percebi que ele estava sorrindo do outro lado da linha. Isso me provocou um sorriso também - Você está livre hoje? Sabe, sem nenhum compromisso, ou outra coisa...
- Hum, não. Por quê?
- É que eu... Queria te chamar para sair comigo qualquer hora... Quem sabe ir ao Javi, ou coisa do tipo.
Javi era um tipo de lanchonete- restaurante- bar da cidade, um dos mais chiques que tinha.
- Bem... Hoje? Sim, eu posso.
- E a senhorita estaria pronta às seis?
- Certamente, meu caro. - nós dois rimos e houve uma pausa.
- Até lá, então.
- Até...
Coloquei as duas mãos sobre a cômoda e mordi o lábio. Por que meu coração estava tão acelerado? Uma música calma vinda da sala de estar e um cheiro de bolo de chocolate recém- assado faziam com que eu sentisse borboletas em meu estômago.
Tomei um banho demorado, mas caprichado, e me enchi de perfume. Peguei um vestido não muito chamativo, porém glamoroso, ele ia até meus joelhos, era azul e realçava as curvas de minha cintura com sutilidade. Era, certamente, um dos meus favoritos. Calcei um salto prateado e peguei uma bolsinha de seda para combinar.
Depois escovei meu cabelo e escovei os dentes, passando uma maquiagem não muito pesada e um gloss sabor cereja. O relógio do meu quarto marcava dez para seis.
Preferi esperá-lo lá fora para adiantar as coisas. Minha mãe dançava e cantarolava na cozinha, colocando uma calda fumegante por cima de um bolo com massa escura. Ela sorriu ao me ver.
- Posso saber quem é meu genro?
- Muito engraçado. Ele é só um amigo. E, hum, pra quem é esse bolinho aí?
- Pode ir tirando o olho, gracinha. Está de castigo, uma semana sem chocolate.
- O quê!? - o interfone me interrompeu. Franzi o cenho e olhei para a porta - Salva pelo gongo.
Desci as escadas correndo, sem poder evitar o sorriso. Escancarei a porta e pulei em Nate, com os meus braços ao redor de seu pescoço. Um ruído rouco saiu de sua garganta, talvez ele estivesse sufocando, mas eu estava feliz demais para soltá-lo. Seus cabelos castanhos estavam molhados, o aroma doce e masculino de seu perfume tinha um cheiro agradável.
Entramos em seu carro, sempre rindo das palhaçadas um do outro. Demorou cerca de vinte minutos para chegar ao Javi. Fiquei de boca aberta quando entrei lá: era muito mais sofisticado do que eu pensava. Duas colunas gregas se estendiam do chão de mármore até o teto na entrada. Havia um balcão de madeira em um modelo mais rústico que se estendia em um comprimento de, se não me engano, mais ou menos cem metros, com tipos variados de bebidas, seja de jarros de água gelada até o mais caro dos champanhes e vinhos. Várias moças com uniformes limpos e redinhas nos cabelos serviam os senhores debruçados no balcão com um líquido escuro em copinhos de vidro. Tinha várias mesas de vidro espalhadas pelo recinto, com uma área de lazer enorme do outro lado com fliperama, sofás, televisões, computadores e outros tipos de jogos, além de uma escada comprida com um corrimão brilhante que levava a um segundo andar, com certeza, ainda melhor do que o primeiro. Um candelabro de cristal enorme estava pendurado no teto sobre nossas cabeças.
Nate puxou uma cadeira para mim e eu me sentei, os olhos fixos nas mulheres refinadas ao nosso redor. Cutuquei o braço dele.
- Puxa, isso é tão... Tão... Nossa! Olha, é muito romântico ter me chamado aqui, mas não posso deixar que você pague tudo isso! Quer dizer, é um sonho, mas parece ser tudo tão caro, e...
- Não! Não esquenta com isso, o.k.? Quero que o dia hoje seja ótimo pra você. Por favor, peça o que quiser. Por mim.
Respirei fundo e ele sorriu.
- Tudo bem. Mas que fique bem claro que da próxima vez eu não vou deixar mesmo!
Um rapaz alto e esguio veio nos servir. Depois de um tempo, entregamos nossos cardápios a ele e fizemos nossos pedidos. A comida demorou um pouco a chegar, o que foi bom, porque todo o tempo possível que eu conseguisse passar com Nate era maravilhoso. Quero dizer, eu me sentia perfeita quando estava em sua companhia. Ele fazia-me esquecer de todos os problemas e rir até minha barriga doer.
A comida do Javi era a mesma coisa de estar comendo um manjar dos deuses. Era uma das coisas mais perfeitas que eu já tinha experimentado, e eu fazia questão de degustar de cada pedacinho. Porém, o dia passou rápido até demais. Quando eu vi, o céu lá fora já estava escuro e nós dois já estávamos saindo do Javi.
- Então eu empurrei a Elizabeth. E aquele namorado dela, o Dan, disse que eu ia pagar bem caro por isso. Mas não acredito que ele vá cumprir essa promessa, sabe. - ele se apoiou no carro e meu sorriso desapareceu na mesma hora.
- Espera, você o quê?
- Empurrei Elizabeth.
- Nate, você ficou louco? Você sabe o que ela pode te fazer?- ele abriu a boca para responder, mas eu interrompi- Não, você com certeza não sabe. Caramba, ela é a Elizabeth.
- Não fica nervosa com isso, Briza. - ele se aproximou, porém eu dei um passo para trás.
- Fico, sim! E pare com esse sorrisinho aí. Fica todo romântico comigo de repente, mas se esqueceu que de manhã nem deu bola pra mim, ficou o tempo todo com a Nick!- minhas palavras saíram um pouco mais carregadas do que eu gostaria.
- Mas eu não...
- E eu já devia estar em casa à uma hora dessas. Da próxima vez pede pra Nick sair com você, seu...- minhas narinas inflaram. -E pare com essa melação pra cima de mim.
- Brianna, você está com ciúmes?- ele riu.
Meus olhos transbordavam raiva, e eu pensei que ia explodir, pois ele não parava de rir. Virei-me e comecei a andar em direção à praça, mas ele agarrou meu braço.
- Ei, espera!
- Não! Pare de rir de mim!
- Não estou rindo de você. Estou rindo do seu drama. - ele sorriu e balançou a cabeça- Quero dizer, isso é inútil! É desnecessário você ter ciúmes de mim.
- E por que você acha isso?
Ele ficou sério e me olhou nos olhos. Sua mão ainda apertava meu braço. Prendi a respiração quando ele se inclinou para frente, afastou uma mecha de cabelo dos meus olhos e colocou a mão no meu quadril. Primeiro, seus lábios roçaram delicadamente nos meus. Depois ele os pressionou contra os meus, apertando meu corpo contra o dele.
Como explicar algo tão inexplicável? Aquele beijo foi mais do que perfeito. Começou suave, e depois se tornou intenso. Aos poucos, o calor percorreu toda a minha espinha, foi como se meu corpo todo derretesse. Foi apenas poucos minutos, mas parece que foi uma eternidade; uma eternidade no paraíso.
Depois nos afastamos aos poucos, eu abri os olhos lentamente. Eu o encarei por um tempo, as palavras se perdendo. Ele, porém, sorriu e me deu um beijo caloroso na bochecha, e me senti corar.
- Eu te amo! Muito, mesmo. - nós dois sorrimos e ele ergueu minha mão e a beijou com sutileza.
- Bom... Eu também.
Nate abriu a porta do carro pra mim e depois me levou até a minha casa. No início, um silêncio um pouco constrangedor pairava sobre nós. Mas depois, começamos a contar piadas e foi como se nada tivesse acontecido. Mas eu sabia que tinha acontecido. Minhas mãos formigavam. Mas não era algo ruim, ao contrário: era a melhor coisa da minha vida.
Ao chegarmos, ele me ajudou a sair do carro com um sorriso, que depois desapareceu. Nate uniu as sobrancelhas.
- Ai! O que é isso?
Um trovão ribombou no céu, fazendo meus joelhos fraquejarem. Logo, pingos pesados de água começavam a cair e a nos molhar.
- Ah, não!- passei a mão pelo meu vestido e lancei um olhar para Nate, que me encarava. - O que foi?
Ele correu em minha direção e me pegou no colo, rindo. Ele foi correndo comigo até a porta da minha casa, e me pôs no chão. Continuamos a rir, mas paramos quando nossos olhos se encontraram. Senti meu rosto esquentar.
Nate se aproximou e mordeu meu lábio. Pude sentir seu sorriso.
As gotas geladas de chuva que batiam com força sobre minha pele, agora, não me importavam. O que me importava, agora, era que eu meu coração batia na maior velocidade possível, pois eu estava aquecida e segura, nos braços de quem eu amava. E o que era ainda mais importante do que isso?
O meu amor era correspondido.


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