Começo
O cabo da última flor é amarrado na coroa, as cores vislumbres das rosas vermelhas se destacam na manhã gris e sem vida do início de outono. Meus dedos dançavam como se estivessem tocando uma harpa, mas a única música ouvida era o vento que soprava simultaneamente aos meus movimentos.
Estendo meus braços e afasto a coroa de flores tendo uma melhor visão delas. Noto que uma das flores não tem o aspecto aprumado e receptivo como das outras, ela está curvada, dando a impressão de desistência. Essas rosas parecem testar minha paciência, pois nunca ficam bem postas sobre o túmulo de descanso eterno da minha querida ama, a qual fora brutamente assassinada e deixada como um velho objeto no fundo de um armário.
Meus pais aceitaram meu pedido para que Rosa fosse sepultada numa parte de nossos próprios jardins, os jardins de Skyblower são considerados um dos lugares mais bonitos do reino do Norte e seria mais que justo se Rosa recebesse tal honra.
Um suspiro de desagrado escapa entre meus lábios ao observar as flores outra vez, não saberia responder se elas não se ajeitam ali por alguma fixação minha de desejar a perfeição ou se seria a culpa pelo que lhe aconteceu que ainda toma grande espaço no meu peito, degolada e jogada num fundo de armário apenas por ter feito parte de minha vida.
Um vento sopra provocando que a mesma flor, de aspecto duvidoso, se solte da coroa e tente escapar pela corrente de ventania, eu a apanho antes que fuja e bufo aborrecida, nem mesmo a natureza estava ao meu favor.
- Acho que não importa o quanto tente - resmungo. - Nunca farei arranjos de flores tão bonitos quanto aos que você merece, minha querida ama - prendo a fugitiva e termino minha coroa de flores.
Rosa me ensinara a fazer coroas de flores quando eu era pequena e ainda lembro de brigas bobas que enfrentava com minha rainha por teimar em usá-las durante cerimônias reais, afinal elas eram bem mais leves e ao meu ponto de vista, bem mais charmosas que as coroas reais.
Pelo canto do olho avisto as flores rasgadas e amassadas em cima do gramado, elas haviam sido postas pela rainha e haviam sido destruídas por mim.
- Odeio essas flores que a rainha insiste em encher aqui, elas têm um cheio enjoativo e suas cores são horrendas! Sei que as odiaria tanto quanto eu - dou um pequeno sorriso outra vez, agacho-me e limpo os rastros de terra que voaram na lápide que leva o nome de Rosa Stuart.- Agora está um pouco melhor - afirmo admirando o resto de meu trabalho.
Abaixo o olhar sentindo meu peito apertar, uma única lágrima atreve-se escorrer de meu olho deslizando por minha bochecha e rapidamente caindo em cima de uma das rosas de meu arranjo, fungo e solto um sorriso motivador.
- Agora preciso arrumar minha pequena bagunça - lanço um olhar para a flores vandalizadas ao meu lado, apanho a cesta de vime e organizo a bagunça que fiz.
As pontas de meus dedos já estavam geladas após o longo período de reforma que eu mesma promovi, o silêncio do jardim não era cômodo, talvez um pouco solitário, mas um mês havia passado como um flash por meus olhos, minha fase de luto era incompatível com a realidade. O sentimento de vitória fora temporário e a segurança me resultou a perca de uma das pessoas mais importantes de toda minha vida. Ter perdido Rosa de tal maneira era simplesmente surreal e doloroso, talvez por isso eu ainda acreditava que trombaria com ela por algum dos corredores do castelo.
Limpando a bagunça, levanto-me pensando onde eu me livraria dessas flores arruinadas, antes que saia em busca de um bom esconderijo eu olho novamente para a lápide e meu olhar alcança meu arranjo, vejo uma pétala morta ainda pendurada na sépala de uma das rosas, franzo o cenho questionando como eu não a notara antes?
Me aproximo inclinando perto do túmulo e a arrancando, jogo a pétala seca dentro da cesta e verifico as outras rosas, agora sim está quase perfeito. Eu me levanto novamente e alguns passos à frente, lanço um olhar duvidoso sobre onde eu esconderia essas flores e algo chama minha atenção, fazendo com que eu olhe outra vez para o interior da cesta.
Olho para a pétala seca que arrancara da rosa, pela morte repentina ela carregava uma cor amarronzada como de uma folha seca quando a apanhei, contudo sua cor nesse momento era negra.
Semicerro os olhos para me certificar se vejo direito, com um olhar incrédulo eu me aproximo e observo a folha enigmática. Sinto um frio percorrer por minha barriga quando vejo que a pétala traz a morte para as outras flores próximas dela na cesta, como se sugasse a vida de todas que a rodeiam.
E em questão de segundos, diante de meus olhos, todas as flores amassadas dentro da cesta tornam-se como em um rigoroso inverno, mortas.
Pelo susto largo a cesta fazendo com que ela tombe sobre a grama, seus restos mortais entram em contato com o solo e eu vejo a grama que me rodeava se tornando seca e sem vida tirando toda a vida de verde do lugar.
Automaticamente, aterrorizada lanço um olhar por cima do ombro para avistar o túmulo e no mesmo instante meu queixo caí, como numa viagem no tempo, as flores da coroa envelhecem em fração de segundos, morrendo.
Cambaleio até lá suplicando que isso não seja verdade.
Uma ventania começa a soprar vinda do noroeste e se aproxima de forma violenta, ela me faz procurar um forte apoio de minhas pernas para que eu consiga me manter firme em pé recebendo chibatadas da correntes de vento, a luz do dia nublado se esvaí transformando o céu escuro como numa noite fria, escura e solitária. Eu olho à minha volta apavorada e antes que eu corra de volta para o castelo a procura de um refúgio, um ruído soa.
Um grito estremecido de dor, como se pedisse socorro, invade o ar entrando no meu subconsciente, ele atordoa implorando por ajuda e eu sinto meu coração quebrar em pedaços. Meus olhos se enchem de lágrimas e eu imploro em gritos em meio ao barulho que eu me diga como posso ajudá-la.
Porém, eu não pude salvá-la porque Rosa já estava morta.
Dedico esse começo a todos meus leitores que acompanham a trama, vocês estão no meu coração <3 Estaremos esperando juntos até março! Boas festas à todos vocês!
VOCÊ ESTÁ LENDO
Ceres - Agora o Inimigo é Outro [LIVRO 2 - COMPLETO]
Mystery / ThrillerSEGUNDO LIVRO DA SÉRIE AS ADAGAS DE CERES Os muros cinzentos que cercavam o castelo retinham a cruel realidade fora de suas barreiras, e mesmo com a quantidade de problemas que a rodeavam, Mia pensava que aquele castelo era uma falsa miniatura de um...