Chapter 11

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Dave era o primeiro cão, o volante, ou o cão do trenó. À sua frente ia Buck e, a seguir, Sol-leks. Então, a fila prosseguia, com o resto da equipe encabeça por Spitz, o líder.
Buck fora colocado de propósito entre Dave e Sol-leks para receber instrução. Era um aluno muito bom, mas tinha bastante a aprender. Seus mestres nunca o deixavam permanecer no erro por muito tempo. Reforçavam suas lições com seus dentes afiados. Dave era justo e sábio. Nunca mordeu Buck sem motivo -e também nunca deixou de mordê-lo quando necessário.
Buck havia decidido que era mais fácil obedecer ao chicote de François castigando seu lombo do que rebelar-se. Certa vez, durante uma parada, quando ficou emaranhado nos arreios e atrasou a partida, Dave e Sol-leks voaram para cima dele e aplicaram-lhe uma surra. Como resultado, a confusão aumentou ainda mais, porém Buck passou a ter mais cuidado com os arreios, dali para a frente. Antes do final do dia, tinha se portado tão bem no serviço que seus companheiros o deixaram em paz. O chicote de François já vibrava com menos frequência e chegou a ser homenageado por Perrault, que pessoalmente veio examinar o estado de suas patas uma a uma, cuidadosamente.
Já era tarde da noite quando chegaram ao enorme acampamento na cabeceira do lago Benett, onde milhares de garimpeiros construíam seus barcos, precavendo-se contra a quebra do gelo na primavera. Buck cavou seu buraco na neve e dormiu o sono dos justos e dos exaustos. Muito cedo, quando ainda estava escuro e gélido, foi despertado, juntamente com seus companheiros, e atrelado ao trenó.
Foi um dia de trabalho duro. Percorreram aproximadamente 70 quilômetros, facilitados pela neve da trilha, que era bem prensada. Entretanto, no dia seguinte e por muitos dias à frente, não conseguiram manter o recorde. Mesmo empenhando-se mais ainda, avançaram menos. Em geral, Perrault precedia o trenó, prensando a neve com seus esquis, para facilitar o caminho. François mantinha-se na barra do veículo e raramente trocava de lugar com seu companheiro. Perrault estava com pressa e orgulhava-se de conhecer as manhas do gelo -conhecimento indispensável, já que em alguns lugares, a camada de gelo estava muito fina e, em outros, onde a água corria mais veloz, não havia nem sequer se solidificado completamente.
Paravam sempre ao escurecer, comiam suas iscas de peixe e preparavam-se para dormir na neve. Buck estava sempre faminto. O quilo e meio de salmão seco que lhe davam como ração diária parecia evaporar-se. Nunca era o suficiente para aplacar sua fome cruciante e permanente. Já os outros cães, com menos peso e nascidos para essa vida, recebiam apenas meio quilo de peixe e mantinham-se em boas condições.
Dia após dia, numa sequência interminável, Buck seguia atrelado ao trenó. Perdeu rapidamente os melindres que caracterizavam sua vida antiga. Costumava fazer suas refeições sem pressa, até perceber que seus companheiros, menos refinados, terminavam mais rapidamente e vinham roubar o que ele ainda não havia comido. Buck não tinha como se defender. Enquanto lutava contra dois ou três deles, sua ração ia desaparecendo goela abaixo dos outros. Para remediar a situação, passou a comer tão depressa quanto os demais. No entanto, mesmo quando oprimido pela fome, jamais avançou sobre o que não lhe pertencia.

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