09. Ódio fraterno

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Laura ocupava um posto exatamente oposto ao meu: melhor aluna. Ela gostava de cada uma das aulas e nunca faltava, um ser anômalo. Entretanto, hoje sua cadeira estava vazia. Era um fato de se estranhar, aliás, ela estava toda estranha ultimamente.

A parte boa era que, sem Laura, eu teria um pouco de paz. Quanto a Débora, estava focada em dar atenção para o namorado, já que era aniversário dele. Eu achava casais idiotas, mas eles eram a exceção. Combinavam tanto que eu quase não acreditava que namoravam há pouco tempo.

A parte mágica de tudo isso é que meu dia correu estranhamente quieto. Até consegui almoçar sozinha, meu grande sonho.

Já na detenção, todos os rostos eram novos, exceto pelo de Ian.

No ritual vergonhoso a diretora finalmente revelou a duração do meu castigo pela fuga da escola: três dias. Ao fim do ritual, a sala entrou no silêncio incômodo que se seguiria por duas horas.

Tentei ocupar a mente recordando o último filme que assisti com meus pais, exatamente um ano atrás. Mas nenhum pensamento conseguia prender minha atenção, culpa do insulto à moda nos pés da diretora. Aqueles saltos de madeira estavam incomodando os meus olhos.

Peguei o livro de regras e normas da escola, que estava sobre a mesa, e o coloquei de pé para bloquear minha visão dos pés dela. Depois disso, me afundei em tédio.

Vez ou outra meus olhos vagaram na direção de Ian, que parecia sempre estar trocando mensagem com alguém. Deu vontade de denunciar. Na verdade, quase fiz isso, mas mudei de ideia no último segundo, pois ao fazê-lo estaria ajudando a diretora. E eu não estava aqui para facilitar o trabalho dela, muito pelo contrário.

Mais cedo, no refeitório, vi a turma de degenerados do Terceiro C, mas Ian não estava lá. Com certeza passou o intervalo enfiando a língua na boca da Mel.

Decidi pensar em algo mais produtivo que a vida amorosa de Ian e mudei a rota dos pensamentos na direção de Laura. O que havia com ela? Semana passada, recusou fazer trabalho de grupo com o nosso grupo (Débora, Laura, Gustavo e eu). Disse que queria fazer sozinha para se sentir mais responsável e blá blá, não acreditei nem por um segundo. Ela estava se distanciando? E eu ia torcer aquele pescoço fino de galinha dela.

Mas primeiro eu tinha que descobrir o que estava acontecendo. Só não sabia por onde começar. Se bem que Ian a conhecia há mais tempo que eu. Talvez...

Não. Eu não precisava da ajuda dele. Ian era um idiota egocêntrico e... Droga, lá estava eu novamente desperdiçando meu tempo pensando em como ele era estúpido.

Comecei a ler o livro de normas pela milionésima vez no ano. Boa estratégia colocar aqueles livros nas mesas da detenção. Duas horas de ócio nos levava a buscar distração em qualquer coisa, inclusive em um livro tosco com regras desprovidas de lógica. Dos três centímetros de altura, eu já tinha lido um centímetro quando a sirene tocou, dando largada à corrida desesperada dos detentos. Até gente pulando por cima da mesa eu vi.

Entretanto, ninguém era páreo para mim na hora de sair do castigo, fui a primeira a atravessar a porta. Eu estava ansiosa para chegar em casa.

Aquela era a noite do cinema, que acontecia uma vez por ano em comemoração ao dia em que meus pais descobriram que eu estava dentro da barriga da minha mãe. Foi um dia marcante para eles, se tratava de uma gravidez inesperada e causou grande impacto em suas vidas corridas.

Chegando nas escadas, avistei o Mercedes executivo à minha espera. Mas ao abrir a porta, para meu completo horror, dei de cara com uma aberração.

— Oi, maninha.

Em posição de oposiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora