24. Tensão

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— Isa, acorda.

— Hummm.

— Vamos, tá na hora.

— Nãããão.

— Levanta logo da minha cama, pirralha.

Senti ela abraçar minha cintura por trás.

— Quero dormir, Ian.

— Anda, Isa, levanta. Vai se atrasar.

Meus olhos estavam tão pesados que não tive forças para olhar para o lado em que a disputa acontecia. Ou coragem.

A tranquilidade pós sono fez as coisas parecerem mais claras em minha mente. O lado racional voltou a funcionar. E, bom, ele não ficou muito satisfeito ao me perceber toda descabelada na cama de Ian.

Esperei até ele conseguir tirar Isabella da cama e os dois saírem para finalmente abrir os olhos.

Minhas pálpebras piscaram com o incômodo da claridade. Raios solares atravessavam a janela, levando-me a concluir que o maldito Ian abriu as persianas. Sentei-me na cama, notando um edredom azul escuro sobre mim, que não estava ali antes de eu pegar no sono.

Eu sempre tive uma tremenda curiosidade em saber como seria o quarto de um garoto. O de Steven não contava, pois ele mal desfazia a mala.

E agora ali estava eu, no quarto de um garoto, onde eu tinha passado a noite. Não só de um garoto, mas de Ian.

Definitivamente, minha vida estava fora de órbita.

Eu já tinha visto Ian segurar um violão, então visualizá-lo tocando aquele violão preto, que estava sob um suporte, era bem normal. Mas imaginá-lo tocando aquela guitarra vermelha, ah, isso sim era uma cena marcante. Um Ian astro do rock desenhou-se em minha mente enquanto meus olhos percorriam o quarto rumo à estante lateral.

Havia muitos livros. Ian gostava de ler? Fiquei curiosa para saber os títulos, no entanto não me concentrei em lê-los, pois me senti invadindo a privacidade dele.

Em cima da estante, havia discos de vinil enfileirados, dava para ver os nomes dos que estavam na frente: The Smiths, Skank, Paralamas do Sucesso e Beatles.

Na mesa de computador havia três monitores e eu me perguntei para que ele queria tantas telas, então me lembrei de quando ele me falou que trabalhava com programação.

Guitarrista, leitor, programador e apreciador de música boa. Então esse era Ian para além do garoto que pegava todas as sebosas da escola.

Tratei de enrolar o cabelo, pois sabia que a minha aparência não devia estar das melhores. Mas isso era o de menos agora. Eu tinha que arrumar um lugar para ficar e estava sem nenhum centavo no bolso. Para a casa deles eu não voltaria.

Pensar neles trouxe todo aquele sentimento ruim novamente. As palavras dolorosas. A vontade de sumir. Deixei a cabeça cair de volta ao travesseiro e fiquei encarando o teto branco. Assim permaneci por alguns minutos até escutar a porta se abrindo. Passos se aproximaram e pararam ao lado da cama.

— E você? Vai ficar aí deitada?

Virei a cabeça para ele. Os cabelos estavam úmidos, dando a impressão de que ele tinha tomado banho. Sem contar no cheiro de shampoo.

— Gosto daqui — falei, sem me mover, e com a mínima intenção de fazê-lo.

De lá de fora veio o som de portas de carro batendo e a voz enérgica de Isabella. Ian foi para a janela de vidro e ficou olhando até o carro sair. Então se virou para mim.

— Vem — disse somente e seguiu para a porta.

Sem muita opção, levantei-me da cama, calcei minhas botas e peguei a minha mochila para ir atrás dele. Com uma alça no ombro, abri o zíper para ver o que estava causando todo aquele peso. Havia cadernos, canetas, revistas da Vogue, escova de dentes, creme dental, sabonete líquido (para a aula de educação física), um casaco, presilhas, batons e outras bugigangas: eram as coisas que ficavam no meu armário da escola. Ex-armário, pelo visto.

Em posição de oposiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora