22. Ruptura

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Que estava sendo acusada de um crime, eu já sabia. Só achei um grande exagero ter um policial ao lado de fora me vigiando.

Isolaram-me na sala de reuniões enquanto tentavam contatar meus pais. Certamente estavam fracassando, pois o destino dos meus pais após me deixarem na escola mais cedo foi o aeroporto.

De acordo com os meus cálculos, eles só teriam sinal de celular lá pelas onze da manhã, quando o avião pousaria. Tentariam pegar um avião de volta e, quando conseguissem, levariam mais quatro horas para chegar aqui. Pelo que escutei da conversa deles no carro, aquela viagem era muito importante.

Significa dizer que eu estava na maior encrenca da minha vida. Mas eu não estava preocupada. Afinal, meus pais acreditariam quando eu dissesse que não fui eu quem fez aquela estupidez.

A única coisa que eu queria saber agora era como alguém colocou as latas de spray dentro do meu armário. Ninguém sabia minha senha, exceto Laurinha (nossos armários eram vizinhos então enquanto conversávamos acabávamos vendo a senha uma da outra).

Mas Laura era a última pessoa de quem eu suspeitaria. Ela podia até ser ladra de namorado, mas armar uma coisa dessas não era a cara dela.

Ainda assim, tinha uma voz bem no fundo do meu inconsciente questionando se havia chances de Laura ter se unido a Gustavo para fazer aquilo comigo.

A parte engraçada é como a coordenação encontrou as latas de spray no meu armário: denúncia anônima. Era bom que continuasse anônima mesmo, para a saúde dentaria de quem denunciou.

O policial designado a me vigiar foi quem pagou a pato. Pedi água de trinta em trinta minutos e depois, claro, ele teve que me acompanhar até o banheiro umas mil vezes.

— Já conseguiram falar com os meus pais? — Perguntei ao policial, pela fresta da porta.

— Você perguntou isso há cinco minutos — ele segurou a maçaneta e fechou a minha fresta.

Dalí alguns minutos eu estava na brecha novamente:

— Eu estou com cede. Acho que estou desidratando — falei dramaticamente.

Ele foi pegar a água.

— Eu quero ir ao banheiro — falei ao terminar de beber, encaixando o centésimo copo descartável na pilha que se formou sobre a mesa ao lado da porta.

A postura dele era impressionante. Não fez cara feia e nem perdeu a pose sequer uma vez. Não que eu estivesse me esforçando para tirá-lo do sério, nada disso.

Por volta de meio dia eu vi, pela parte de vidro da porta, o coordenador pedagógico conversando com o policial. Aproximei-me depressa, mas não rápido o suficiente, pois o cebolão saiu.

Abri uma fresta para espiar.

— Era sobre os meus pais?

O policial continuou olhando para frente, de braços cruzados. Parecia um pombo com os peitos estufados.

— O voo de volta sairá às duas — informou friamente.

— Duas?! Mas daí eu vou ter que ficar aqui até seis horas! — abri mais a porta. — E o senhor também, seu policial.

O homem parecia uma estátua. Aposto que o sonho dele era ser um Guarda Real da monarquia britânica, aqueles homens de perucão que não podem se mexer.

— Qual é o seu nome? — perguntei. Já que íamos passar o dia juntos nada mais justo que eu saber como chamá-lo.

Ele permaneceu com os olhos fixos para o corredor, disposto a me ignorar.

Em posição de oposiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora