O professor de história, em quem depositei todas as esperanças de que acabaria a aula mais cedo, liberou pontualmente às 16:30. Como eu não tinha forças para odiá-lo naquele momento, decidi guardar o ódio para a próxima. Ele que me aguardasse.
Se eu fosse até a cantina, me atrasaria para o castigo. Sem contar que perdi cerca de três minutos no banheiro, me escondendo de Débora e Laura. Eu não conseguiria lidar com o interrogatório delas agora.
Cheguei na detenção faltando um minuto para me atrasar e piorar ainda mais o minha situação.
— Jaqueline! — A diretora disse o meu nome como se eu acabasse de chegar na festa a qual ela era anfitriã e eu a convidada especial.
Todos os outros convidados me encararam. Pareciam com raiva de mim. Não entendi, mas se eu tivesse energia para esboçar qualquer reação, mostraria o dedo do meio para eles.
Continuaram encarando até quando me sentei.
— Se não pararem de olhar vão levar tanta porrada que vão esquecer seus nomes — ameacei, encarando de volta.
A diretora caminhou até sua mesa e parou de frente para nós.
— Meus queridos, como temos apenas duas situações aqui, não há necessidade de todos se levantarem — o rosto dela estava radiante de satisfação. — Vamos começar por vocês dois. Quero que apenas um fale — e apontou para Ian.
Para uma pessoa se divertir tanto com o desgosto de estudantes de ensino médio, sua vida devia ser um verdadeiro fracasso, tediosa e sem nada de empolgante.
Ian se levantou.
— Eu e Jaqueline prometemos nunca mais enganar a diretora e nunca mais fugir da escola — direto e rápido.
— Sente-se — ela assentiu com a cabeça, claramente apreciando a humilhação. — Agora manifeste-se um dos demais.
Imediatamente um garoto se levantou. Reconheci o corpo espichado e desengonçado. Era o varapau. Ele me deu uma atravessada de olhos antes de começar. Inclinei a cabeça para o lado, olhando-o de cima para baixo. Esse vara de arrancar mamão.
— Prometemos nunca mais deixar alguém fugir do castigo na ausência da diretora. — Agora tudo fazia sentido, eles estavam de castigo por minha causa.
Fiquei feliz pelo ritual vergonhoso ter acabado tão rápido. Mas os minutos seguintes simplesmente não passavam. À medida em que o relógio se arrastava, o vazio em meu interior ia me sugando para o abismo.
Quando meu celular vibrou, supus que seria notificação de bateria fraca, já que não consegui carregá-la o suficiente, e ninguém além de Laura e Deby tinha esse número.
Mesmo assim, o peguei. O número não estava salvo, mas uma sútil familiaridade com os últimos dígitos me fez ter uma ideia de quem seria.
Abri a mensagem:
"Vamos fugir. Deste lugar, baby"
"Não"
"É uma música"
Eu conhecia a música e também entendi o trocadilho.
"Sei disso. Conheço Skank"
"Essa vai ser a nossa música. Não acha que combina?"
"Deixa eu adivinhar. Pediu meu número pra Laura de novo"
"Acertou"
Exatamente como da outra vez, recebi uma mensagem surtada dela:
"ELE ME PEDIU SEU NÚMERO RESERVA. O QUE VC ANDA APRONTANDO, JAQUELINE????!"
Ian não fazia ideia do buraco em que estava me enterrando ao fazer isso.
Mandei para ele:
"Pra que queria meu número dessa vez?"
"Eu estava aqui sem fazer nada e por acaso pensei: por que não bater um papo com a patricinha mais bem-humorada dessa sala? Então agora que estamos nos falando, toda a minha vida faz sentido"
Essa história de patricinha já deu. Eu ia responder à altura. Quando comecei a digitar, porém, senti uma coisa estranha que me fez ver tudo escuro. Ao me recuperar, meus dedos estavam ligeiramente trêmulos.
"Não sou patricinha e não sou daquela forma que vc me descreveu. Vc não me conhece, então não pode falar do que não sabe"
Eu poderia fazer melhor que isso, mas o tremor nas mãos não ajudava.
"Já ouviu falar que o exterior reflete o interior?"
Ele estava me julgando pela forma como eu aparento? Sério? Afinal, como eu aparento para ele?
Olhei para mim mesma. A minissaia xadrez era Armani, talvez a única peça não simples, mas a blusa branca gola alta era completamente básica e por isso eu tinha o direito de usar o cardigã Versace rosa claro, meu favorito. As botas brancas Balenciaga eram simples. Ah, droga, tinha o cinto Gucci.
Pensando bem... não era um look tão simples assim. Mas o que importava? Isso não dizia nada sobre mim.
Meus dedos pararam no meio de uma frase, pois uma vertigem forte suprimiu a minha visão. Por um momento tive a impressão que ia cair da cadeira.
O celular vibrou em minhas mãos e eu abri os olhos.
"Sua cara tá horrível. Isso tudo é por causa do castigo? Ficar sem cartão de crédito não é o fim do mundo"
"Acho q n to bem n comi nda hj"
Foi a última coisa que tive forças para responder.
O instinto de pedir socorro me fez levantar para ir até a mesa da diretora. Assim que dei o primeiro passo, vi que o caminho era longo demais.
— Senhora Rosildine — minha voz saiu fraca, quase um sussurro, e isso mais parecia um déjà-vu.
Dei mais um passo cambaleante e coloquei a mão na testa. A vertigem me golpeou em cheio, me desequilibrei.
— Ah, ela acha que somos idiotas — era a voz da ruiva idiota que implicou comigo ontem.
— O que está fazendo, Jaqueline? Volte para o seu lugar — ordenou a diretora.
— Eu não...
Minhas pernas cederam ao peso do meu corpo, largando-me no chão com um baque choco.
— Inacreditável!
— Para com isso, sua idiota! Não vamos cair nessa outra vez!
— Levante-se, Jaqueline!
Com a sensação de ter mergulhado a cabeça em uma banheira cheia de água, os sons externos ficaram abafados. Meu coração mudou-se para os ouvidos, martelando os tímpanos com batidas violentas.
Então eu afundei no abismo e tudo desapareceu.
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Em posição de oposição
Teen FictionSincera, irreverente e uma verdadeira peste. Jaqueline (Jake para os mais íntimos) é esperta demais para saber que deveria manter distância do garoto que foi eleito o mais bonito de todos por uma listinha suja que circulou os corredores da escola. I...