Naquela noite não consegui dormir muito bem. Fiquei pensando o tempo todo na minha família e no quanto ficariam preocupados. E também em como contaria isso para Carla e Daniel. Quando digo "isso", me refiro ao fato de estarmos presos nessa cidade.
Todos os humanos conhecem os mitos sobre Fantasy, mas nenhum nunca voltou para contar a história. Na verdade, só um único humano voltou, mas, após escrever um livro chamado Memórias de Fantasy, contando tudo sobre o reino sobrenatural, acabou ficando louco e foi internado em um hospício.
O lugar era realmente encantador, mas tinha seu toque de terror. Nunca estivemos aqui antes e isso era pavoroso. Quero dizer, íamos ter que viver aqui para sempre (isso se sobrevivêssemos) e não conhecíamos quase nada sobre o lugar e seus habitantes. Tudo o que sabia era o que diziam os primeiros capítulos do livro de um humano tido como louco. Só consegui ler dois capítulos, porque meus pais encontraram o livro e o jogaram fora. Diziam que precisava ler coisas reais e não ficar vivendo de fantasias. E o que poderia fazer? Tentei argumentar, mas não adiantou. Quando se tem dezesseis anos, nenhum adulto te leva a sério.
Levantei da cama com uma dor de cabeça bem forte, mas ignorei e fui tomar um banho. Ao sair encontrei em minha cama um vestido de cor púrpura, mangas longas, decote redondo e comprimento longo e ao seu lado um cinto grosso e dourado. No chão, ao lado da cama, estava um par de botas de cano curto, bico fino e cor preta. Ao tirar o vestido da cama percebi que tinha um capuz, o que seria útil para nos escondermos e passarmos despercebidos.
Vesti-me e saí do quarto. Decidi contar a Daniel primeiro, pois era mais cabeça do que Carla, apesar de ser bem apegado à família. Achei que seria mais fácil lhe contar do que à Carla, porque provavelmente iria começar a chorar e negar dizendo que não ficaríamos presos aqui de jeito nenhum. A reação dos dois me surpreendeu.
Quando bati no quarto de Daniel ninguém respondeu, então abri a porta e vi que não havia mesmo ninguém no quarto. Segui para o de Carla, bati à porta e nada. Abri e ela também não estava lá. Senti meu coração batendo forte contra o peito com medo de que algo tivesse acontecido com meus amigos, mas, ao entrar de novo na "parte bar" da estalagem, vi meus amigos sentados a uma mesa conversando com uma criatura de orelhas pontudas e pele um pouco esverdeada (só percebia que era esverdeada se olhasse bem de perto).
— Oi gente. Como vocês estão? — me aproximei da mesa.
— Nossa! Que vestido lindo! — Carla não conseguia ser muito discreta...
— Ficou muito bom em você. — Daniel sorriu e me olhou de cima a baixo.
— Ah... Obrigada. — sorri um pouco sem graça e sentei ao lado da criatura de orelhas pontudas.
— Olá. Como se chama a senhorita? — a criatura me observava com olhar curioso.
— Meu nome é Alessia e o seu? — tentei ser educada e não o encarei muito.
— O nome dele é Aron! — Carla respondeu por ele.
— Certamente. — Aron sorriu.
— Aron é um elfo da floresta! — Daniel parecia animado.
— Elfo da floresta? — encarei-o, confusa.
— Sim, Senhorita Alessia, sou um elfo da floresta. Por isso minhas roupas são em tons que se camuflam com as árvores e minha pele é esverdeada.
— Ah. Claro. Como pude esquecer?! — forcei um sorriso.
— Não precisa fingir. Sou amigo de Ária e vou ajudá-los também. — disse em tom conspiratório.
— Você sabe que somos H-U-M-A-N-O-S? — fitei-o e usei seu mesmo tom de voz.
— Sim. — e riu de leve.
— Como pretende nos ajudar? — continuei o encarando.
— Vou emprestar meu DNA para que Ária transforme seu amigo em elfo. — Olhei para Daniel surpresa, que sorriu feliz.
— Vo-você vai ser um elfo? — não consegui disfarçar a perplexidade.
— Sim. Vou ser um elfo, mas não sabemos de que tipo ainda. — e sorriu ainda mais.
— E você, Carla?
— Ária disse que vai procurar uma amiga dela. Acho que se chama Rose e vai me emprestar seu DNA também. — também parecia feliz.
— Ma-mas... Ária já lhes disse que...
— Já contei sobre a magia de Fantasy. Eles sabem que estão presos aqui. — Ária se aproximou de nós também. Olhei para meus amigos, confusa.
— Vou sentir falta da minha mãe e da minha avó, mas sei que assim que passar o luto por minha "morte", ficarão bem. — Daniel disse devagar.
— E não me importo com meus pais, porque não se importavam comigo. Sei que nem vão reparar que sumi, mas meu namorado vai sofrer... — ouvi sua voz embargar.
— Jonathan vai ficar bem. Não se preocupe, Carla. — Daniel abraçou-a pelos ombros.
— Ahn... certo... vocês já sabem no que serão "transformados", mas e eu?
— Você terá o meu DNA. — Ária sorria e a olhei incrédula.
— Vai mesmo deixar me transformar em...? Ahn...? — não sabia exatamente o que Ária era.
— Em feiticeira? — Riu. — Sim, é claro. Por que não?
— Deixa... — sorri sem graça, me sentindo boba. — Quando vamos fazer a transformação?
— Bem... não é exatamente uma transformação, mas uma camuflagem. — explicou.
— Camuflagem? — senti-me cada vez mais perdida.
— Ária pode fazer com que se pareçam com essas criaturas e tenham alguns de seus dons, mas terão coisas que vocês não serão capazes de fazer. — Aron completou a explicação.
— Ah! — falamos os três amigos, em uníssono.
— Vamos logo fazer a camuflagem! — Ária disse animada e a seguimos pela estalagem até o canto esquerdo do balcão onde havia outra porta. Essa porta levava a um pequeno corredor com três portas. Entramos na última, que era a única da direita. Lá dentro era como uma caverna de bruxa, mas bem arrumado. Também era cheio de coisas estranhas.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Fantasy
FantasyFantasy foi publicado pela Editora PenDragon. SINOPSE: O que você faria se acabasse ficando preso em uma cidade do tamanho de um Reino; lar de criaturas sobrenaturais com costumes completamente diferentes dos seus? O que você faria se tivesse que pa...