Louis

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Eu só queria uma vida normal. Sem drogas, sem pílulas. Só queria ser um homem de 22 anos normal. É pedir demais? Lembro-me quando me internaram numa clínica psiquiátrica por tentar cometer suicídio. Eu fiquei preso lá por 72 horas. Me trancaram num quarto acolchoado e me puseram uma camisa de força. Nunca me senti tão preso em toda a minha vida. A cicatriz que eu era forçado a ver todos os dias ainda doía no meu pulso.
Mas lógico isso não era visível na frente das câmeras de Jordan Tomlinson, meu padrasto. Ele é um rico homem, dono de uma empresa que vende ações, a empresa Tomlinson. Minha família inteira está encarregará de progredir com essa porcaria. Preferia pedir esmolas num sinal do que sentar na cadeira nojenta de Jordan.
Todos os dias eu penso nele. Não consigo não pensar. Era como se eu revivesse todos os nossos momentos todos os dias. Sonhava com o sorriso dele. Com os nossos beijos. Eu aceito o fato das pessoas errarem, afinal, o erro é inevitável. Aceito que elas sejam intensas e cheias de marra, mas eu não aceito que elas sejam filhas da puta como ele foi. Ou eu fui o filho da puta. Fico procurando o que eu fiz de errado. Se foi eu, se foi minha teimosia, meus vícios... Nunca me conformei com a deixa sem porquê dele. Nunca.
Até Harry chegar. Aquele desajeitado gigante de cabelos encaracolados e olhos verdes, que pareciam brilhar no inverno. Ele foi a primeira pessoa que apareceu nessa casa que pareceu se importar de verdade comigo. Me fez pensar em mim.
Fui dormir, pensei demais e acabei chorando, não consegui parar. Acordei sem rumo, sem horas, sem lágrimas. Não cheguei a lembrar o que tinha me feito chorar de tal forma, tudo aconteceu em um piscar de olhos, sem perceber eu já estava chorando e meus sentimentos se acenderam, foi como uma bola de neve que só crescia mas não parava e tudo isso foi me corroendo e deixando-me cada vez mais sem ações. Pensava que tudo isso era um pesadelo mas não, a vida tentava me mostrar o que eu já deveria ter percebido. Eu não precisava de ninguém. Não precisava de mais gente que fugisse. Que ia embora. Que simplesmente me abandonavam sem ao menos dizer... Tchau. Eu precisava me amar, nunca fui muito de ter autoestima mas chega uma hora que ela move você e viver de tristeza não é lá muito bom. Harry me fazia pensar nisso. Me fazia pensar nas minhas ideias suicidas.
Eu ainda consigo me lembrar daquela noite. Me lembro que eu nunca me senti tão sozinho, tão impotente diante ao mundo inteiro. Não o via fazia meses, apenas o canto da parede do meu quarto me confortava. Sentia a falta do abraço do meu pai, da atenção real da minha mãe. Eu sentia falta do amor. Fiquei com tanta raiva de mim, por ser um erro. Que problema eu tinha? Todo mundo conseguia ser amado, então qual era o meu problema? Quebrei meu teclado, quebrei meus quadros e puxei meu espelho encostado na parede contra o chão. Escorreguei as costas na parede e observei meu reflexo nos pedaços do espelho no chão. Agarrei um pedaço nas minhas mãos e desci um corte reto no meu pulso, querendo acabar logo com isso. E sabe o que eu vi? Não vi uma luz no fim do túnel. Não vi o vovô e nem a vovó. Não vi um jardim com borboletas e o caralho à quatro. Eu vi um monte de nada. O vazio. A escuridão.
Talvez, se a minha mãe não tivesse aparecido naquele momento, eu não estava vivo. Talvez, se eu tivesse demorado mais uns minutos para chegar no hospital, não estava vivo. A ideia de me ver deitado num caixão com a escuridão, não era tão assustador para mim.
Eu vi uma linha escura costurando meu pulso novamente. Vi meus pulsos enrolados num esparadrapo. Vi um monte de parentes que eu nem lembrava mais da existência irem me visitar no hospital, como se fôssemos muito íntimos. Mas a pessoa que eu mais esperava, não apareceu. Ele não se importava mais. Psicológicos conversaram comigo. Meu nome era mantido em segredo lá, já que meus responsáveis não queriam que a mídia soubesse desse acontecimento na família perfeita dos Tomlinson.
Uns meses depois, eu tentei me matar de novo. Minha mãe me "salvou" de novo. Um saco plástico não foi bom o bastante contra as unhas da senhora Johannah. Foi nesse dia que me internaram. Lembro-me da janelinha do quarto onde eu podia ver minha mãe indo me visitar todos os dias.
Pensei em tudo. Pensei nele. Era provável que um dia ele negue que tudo isso aconteceu, negue que foi bom ter acontecido, negue que foi importante, negue que algo mudou dentro da gente. Das nossas conversas no terraço da minha casa. Das transas... Não vou falar transas, foi mais que isso, foi amor. Eu estava lembrando de tudo isso, e que sei ele também estava, aonde estiver. Com quem estiver. Mas não importa mais. Algumas pessoas apenas não nascem para ficar juntas, digo juntas-juntas, embora seus encontros físicos sejam bem românticos e inesquecíveis. Era essa a minha "conformação".
Quando voltei para casa, se meu quarto pudesse ser todo de borracha e o mais seguro possível, minha mãe tinha feito isso. Ela consertou o espelho, mas o pregou na parede. Ela consertou todas as molduras. Ela consertou o meu teclado, que foi a única coisa que eu realmente me arrependia por ter quebrado.
A única pessoa que não disfarçou ter ficado com pena de mim, foi Jordan. Eu nunca gostei dele. Nunca conversamos, nunca tínhamos trocado um bom dia. Eu só queria distância. Ele começou a me olhar torto depois que eu ter trazido um namorado e não uma namorada para casa. Jordan nem sequer respeitava a minha mãe, não fazia ideia porquê ela está com ele.
A minha mãe fez um tratamento psicológico também. Ela se curou pela jardinagem e com a volta de seu trabalho. Eu gostava de ver o que Johannah plantava. Ela já plantou de tudo, tomateiros, rosas, margaridas, princesas-da-noite... Johannah sempre plantava cada semente em choros, e isso era quase o rego de cada uma das sementes. Observava tudo pela janela do meu quarto em silêncio. Observava o inverno chegar e destruir tudo o que ela tinha dado duro para construir.
Eu me lembrava de meu pai sempre que eu olhava minha mãe nos olhos. Eles sempre tiveram olhos iguais. Azuis e melancólicos. A última coisa que fiz com o meu pai foi brigar. Se quer saber, eu nem me lembro mais o motivo. Eu estava com ele no carro e nós dois começamos a gritar um com o outro, até ele olhar para trás e o carro capotar. Ele estava sem cinto. Não tive chance de me desculpar, meu pai morreu naquele segundo. Me lembro da sirene da ambulância e quando a minha mãe chegou no local. A cabeça de meu pai estava deitada no colo dela, e ela encostava a testa na dele, chorando sem parar. Consegui virar a cabeça na maca e observar toda a cena, chorando em silêncio. Foi minha culpa. Eu tinha matado o meu pai.
Meses de tratamento depois, eu voltei para a faculdade. E lá na verdade conheci Harry. Um inútil em história, não fazia ideia porquê ele ainda estava lá. Harry me proporcionou bons momentos, como o planetário. Foi... Incrível. Eu arrisco dizer que... Eu estava começando a me apaixonar pelo gigante desajeitado. Eu estava começando a me apaixonar pela comida dele, pelos doces, pelas covinhas fundas, pelas suas mãos tocando na minha, pelas mordidas no lábio inferior, pelas piadas sem graça. Estranho seria se eu não me apaixonasse por ele. Mas eu tentava tirar essa ideia da cabeça. Uma hora, Harry iria embora assim como todos. Harry iria me deixar. Uma hora, eu me veria sozinho, até chegar outro Harry, e outro, e outro. O ciclo nunca acaba. Mas eu sei como termina.

Strong >> l.sOnde histórias criam vida. Descubra agora