2 - 20 de março de 2016 - parte I

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Eu quero morrer.

Não. Na verdade, eu quero matar Liam.

E Seth.

E Tricia.

E o passarinho que bateu desgovernado no vidro do carro e me acordou.

Eu quero matar tudo e todos que resolveram atrapalhar meu sono essa manhã fatídica em que fui obrigada a acordar às 4:30hrs da manhã. Esse é o horário que normalmente eu acordo quando estou em época de provas, não quando estou de férias.

Ainda falta mais da metade do caminho e parece que estamos no mesmo lugar da estrada há uns dois dias.

Em algum universo que não consigo entender, Liam, Seth e Tricia estão rindo. E não é que eu não queira me divertir com eles, mas estou tão irritada com tudo que não consigo. É isso que acontece quando querem me privar das minhas noite de sono. Minha amígdala, responsável pelas minhas emoções, não conversa mais com meu córtex, que regula meus sentimentos, e fico assim, um poço de mau-humor.

Para me distrair, crio mais uma lista. Dessa vez, das coisas que quero fazer quando chegarmos:

1. Delimitar bem meu espaço para evitar que Tricia o invada, já que vamos dividir um dos quartos da barraca;
2. Planejar minha rota de fuga caso um urso resolva aparecer;
3. Esticar algo no chão enquanto tiver sol e aproveitar os benefícios da vitamina D até ele se pôr.


E acho que é só. Eu não posso mesmo ter muita pretensão quando sei que estou me embrenhando numa floresta.

Aliás, eu não estou nem um pouco animada com essa história toda. Se pudesse voltar no tempo, nunca teria aceitado vir. Eu poderia ter engolido o orgulho e pedido uma passagem para Califórnia para o meu pai. Ele não teria negado e eu estaria indo para praias de verdade para aproveitar a mesma vitamina D que pretendo absorver em um lugar que não quero realmente estar.

- Tiiiinaaaa, por que você está tão emburraaaada? – Tricia canta no ritmo da música.

- É Tina! Vamos nos divertir!

Seth então me estende uma garrafa de vodka.

- Dá uma chance, Tina! – Liam entra no coro.

Eu sei que não devo. O álcool reduz a concentração e altera a formação de memórias. E eu pretendo me lembrar dessa tortura de viagem nos mínimos detalhes para não cometer a mesma burrada uma segunda vez.

Mesmo assim, aceito a garrafa de Seth e tomo três goles seguidos. Eu preciso parar de ser chata e tentar aproveitar. Afinal, se a vida te deu limões, faça uma limonada. O ditado é esse, não é mesmo? Vou tentar fazer minha limonada. Na pior das hipóteses, hipoteticamente posso me beneficiar das vitaminas e minerais do limão.

O líquido desce queimando em minha garganta e eu tenho necessidade de tossir. Meus olhos estão cheios d'água.

No banco de trás, Tricia toma a garrafa das minhas mãos e vira um grande gole.

- Olha, acho bom vocês pegarem leve. – Liam fala, mas ele está rindo. – Nós temos algum tempo de caminhada e não quero ter que carregar ninguém pela trilha, hein!

Ele pode ter falado de brincadeira, mas está certo. Não acho que uma trilha de não sei quantas horas combina com Seth e Tricia embriagados. Mas não falo nada com eles porque não quero bancar a estraga prazeres.

- Você tá odiando tanto assim de verdade? – Liam pergunta algum tempo depois que a vodka já desanuviou meus pensamentos.

- Sim. – Respondo de imediato, mas então alivio um pouco. – Não, só estou com sono e essa história toda de bicho, mato e planta não me agrada muito. Eu não sou a louca da tecnologia e da cidade, mas gosto de saber que posso acessar o que e quando quiser. E me preocupa um pouco ficar longe de Lena por tantos dias. Você sabe que minha mãe é louca, sei lá se ela vai aparecer e surtar na casa de Paige.

A Lenda de Noah [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora