Capítulo 15 - Calmaria Parte II (Pequenos Infinitos)

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Mundo silencioso

O alto mar não se move

Parece o silêncio de um túmulo

Ninguém está acordado

O tempo passa lento

Calmaria total

No entanto, é nobre acreditar

Que as pessoas podem ter esperança

Eu vejo através da calma

Tudo o que leva pelos séculos

(...)

No entanto, é nobre acreditar

Que as pessoas podem ter esperança

Através das chamas eu vejo

Um barco escuro que devaneia de esperança

Uma chuva pela manhã

Causando calmas ondulações

(...)

Aquela que invade a calmaria

(Sigur Rós – Dauðalogn)

A chuva ainda caía fresca sobre minha cabeça enquanto a mantinha baixa, os olhos fechados, sentindo as gotas escorrerem na curva de meu nariz até o chão. A medida que as pessoas começaram a formar um grande círculo a nossa volta, percebi que o Sargento havia se comunicado a respeito do que presumi ser o fim da missão daquele grupo de fuzileiros. Ainda desnorteados, trocavam olhares entre si, inexpressivos por conta do ocorrido. Um silêncio – exceto pela chuva – foi rompido pela visão de Kiran chegando na minha frente no intuito de me consolar. Ergui o olhar para aquela criança, que também não mantinha expressão alguma na face, mas que muito corajosamente estava de pé, ali, em plena demonstração de força. Então, ele uniu as palmas e começou a aplaudir. Pouco a pouco, um a um foi aderindo ao gesto, e quando menos imaginamos, todos estavam nos aplaudindo.

Fiquei de pé, devagar, levando meu olhar a percorrer cada rosto; cada expressão sofrida, buscando identificar algo de diferente neles da nossa chegada até o presente momento: o vestígio de esperança que renascia em cada íris. Um arrepio percorreu minha espinha e, de repente, comecei a me acalmar. Talvez até me sentir mais forte. Era o que Guilherme tentava me mostrar o tempo todo, a razão pela qual estávamos ali, afinal: fazer o bem. Claro que havia alguns sacrifícios, sabíamos desde o começo que não sairíamos ilesos. Mas de alguma maneira, trouxemos um pouco de esperança para aquelas pessoas e isso não tinha preço.

Fui contagiado por essa energia de agradecimento e acabei aplaudindo também meus companheiros de jornada, e eles fizeram o mesmo. A nobreza do momento me fez refletir sobre todo o percurso de vida que me levou até ali. Se eu não tivesse ido, jamais teria conhecido Guilherme – e jamais me perdoaria por isso.

Adiantei alguns passos na direção de Kiran e o envolvi em um abraço mais intenso, daqueles que você guarda a sensação por um bom tempo. Era um abraço de adeus. E nós dois sabíamos disso.

Lágrimas se acumularam em meus olhos já cansados, ao passo que me abaixei novamente para equiparar-me a seu tamanho. Kiran também estava bastante emocionado, com os olhos marejados e aquela carinha de choro na face juvenil. Segurei em seus ombros e olhei no fundo de seus olhos para registrar aquele momento em nossas memórias pela eternidade.

"Obrigado Kiran", respirei fundo. "Eu nunca vou me esquecer de como você transformou a minha vida", o ar parecia ainda mais pesado do que nunca. Estava sendo difícil, mas continuei. "Eu preciso que você me prometa que vai se cuidar e nunca mais vai se afastar do grupo. As coisas vão melhorar, eu prometo. Só não desista nunca".

Por Trás da Farda (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora