XX - Will

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A manhã seguinte chega como um inferno, estou jogado no sofá ainda vestido da noite anterior. Vou para o chuveiro e me obrigo a pensar somente nas simples ações que realizo – pegar xampu, esfregar cabeça, desligar o chuveiro,.... – deixo a água quente lavar todos meus pecados.

O Vapor deixa o espelho embaçado, passo a toalha pelo vidro e as marcas no meu corpo deixam ainda mais evidente o erro que cometi – Spencer!

Assim como no passado eu me deixei levar, deixei meus instintos me guiarem apesar de saber que isso só me traria dor, e aqui estou eu. Metade de mim se sente "orgulhoso" por ter parado antes que as coisas tivessem ido para uma outra magnitude, a outra metade quer me estrangular, pelo fato de ter agido como um covarde e me refugiado nas montanhas.

Desde aquela noite na boate – antes mesmo de saber que era a mesma garota – eu sabia que Spencer mexia comigo, é como se houvesse um sincronismo natural, um encaixe perfeito, física, química e literalmente. Depois de ontem a noite não tem como continuar vendo Spencer todos os dias sem sucumbir a tentação, preciso frear isso, antes que seja tarde demais.

De alguma forma, sinto que assim como eu ela tem suas limitações, logo é melhor cortar o mau pela raiz agora, do que deixa que esta arvore crie raízes profundas. Pego o telefone e fico olhando para as teclas enquanto decido colocar um ponto final nessa história – ela com certeza já deve me odiar.

Tentei ligar 2 vezes para o professor Kevin, mas não consegui nada além de caixa postal deixei alguns recados e comecei a finalizar a pesquisa.

Eu sabia que estava sendo um babaca, mas por outro lado, eu também sabia que conversar amigavelmente com Spencer sobre fingirmos que nada ocorreu e continuarmos sendo colegas de pesquisa seria a maior balela do mundo. Primeiro porque ela ficaria muito puta comigo e não admitiria; segundo porque ficaríamos nos imaginando sem roupas – pelo menos eu iria imagina-la – e terceiro porque eu queria aniquilar com qualquer experiência/encontro posterior com ela de uma vez por todas. Afinal, foi assim que consegui me curar da ultima vez.

Com a pesquisa pronta, peguei a chave da moto e fui pra universidade. Encontrei o professor Kevin no estacionamento.

- Ora, ora, Sr. Campbell, ouvi seus recados ainda a pouco, o que tem de tão importante que não pode esperar até amanha?

- Bom professor, será que podemos ir até seu escritório ou laboratório? – perguntei o mais gentil possível.

- Estou vendo que não tenho escolha, vamos logo.

Fomos caminhando a passos longos, sendo interrompidos apenas pela coordenadora geral do programa de estágios.

- Diga o que deseja Will – disse enquanto colocava sua pasta na mesa e se sentava.

- Professor, aqui está à pesquisa. Finalizei-a ainda a pouco. – disse colocando-a em cima da mesa.

- Caramba você e a Srta. Reed estão bem adiantados, vejo que foi uma excelente escolha colocar vocês dois para trabalharem juntos, mas devo perguntar isso que está em minhas mãos, o quanto você fez sozinho? – perguntou sua cara não era das melhores, ele desconfiava de algo.

- Não é nada disso que está pensando, a maior parte do trabalho feito ai foi dela, toda a pesquisa de base, ela levantou os dados e discutiu com base nos fatos, apenas finalizei levando pro objetivo final do projeto. – não sei por que, mas o fato do professor desconfiar da competência dela me incomoda.

- Sendo assim, fico feliz. Vou dedicar uma atenção especial a esse trabalho e como estão adiantados já vou liberá-los para a próxima fase, pode, por favor, pegar esta pasta arquivo atrás de você? – ele diz apontando para uma pasta verde.

- Era exatamente sobre isso que queria conversar com o Sr. Eu tive um desentendimento sério com a Srta. Reed nos últimos dias e gostaria de continuar sozinho. O Sr. poderia coloca-la em uma outra pesquisa ou até mesmo inventar uma desculpa e inscreve-la no projeto do próximo ano. – minha voz saia em tom de suplica.

- Olhe Will o que você me pede não é algo ético, trabalhamos juntos há muito tempo e eu não faço isso. Não li o trabalho ainda, mas com a descrição que você me deu, não tenho motivos para fazer o que me pede. Você ao menos a consultou sobre essa decisão? – seus olhos me questionavam com um olhar inquisidor.

- Não tem o que ser falado, a questão é que eu não posso continuar trabalhando com ela, - digo, exasperado - se não é possível que ela seja "transferida" do projeto, então eu saio. Não deve ser difícil encontrar outro tema que se encaixe. – dizer em voz alta que a razão de todo o problema sou eu, faz com que o fardo se torne ainda maior.

- Preciso de alguns dias pra pensar o que vou fazer a respeito peço que nesse tempo tente encontrar uma solução amigável entre vocês, qualquer coisa entre em contato comigo. Nesse meio tempo tire uma folga; vou ler a pesquisa de vocês e ouvir a versão dos fatos dela, assim que tiver uma resposta entro em contato com você. É só isso? – pergunta.

- Sim, só isso. Obrigado pelo seu tempo professor – fecho a porta do escritório e saio a passos largos daquele lugar.

Tomo um caminho não habitual no retorno para casa e paro no parque que costumava vir com April. Sento em um dos bancos e ligo o celular, o céu de fim de tarde está uma mistura perfeita entre a beleza dos últimos raios de sol e a escuridão que se aproxima – melancólico.

Tenho algumas mensagens de voz, uma delas é de ontem a noite, da Spencer. Quando termino de ouvir a mensagem pela segunda vez, fecho o celular e segurando-o junto a testa consigo imaginar o quão confusa ela deve ter ficado naquele quarto, quando sumi – Deus do céu, sou mesmo um babaca.

A noite chega e não tenho mais tempo para continuar adiando minha decisão; ela já deve ter lido o e-mail – mais ridículo que já escrevi – e provavelmente procurou o professor. Abro o aplicativo no celular e escrevo outro e-mail:

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De: Will Campbell

Assunto:

Data: 17 de setembro de 2016 18:00

Para: Spencer Reed

Recebi suas mensagens, mas não tive tempo de retorna-las. A respeito da noite passada, acredito que tudo não passou de um erro, talvez devêssemos continuar da forma que estava. Apenas, fingindo ser estranhos.

Desculpe por tudo, não irei mais incomoda-la.

Will.

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Aperto a enviar e sei que não tem mais volta. Esse e-mail era o que faltava para enterrar de vez, a única coisa que tinha feito eu me sentir vivo em meses, mas se essa vida fosse algo que remontasse meu passado, então eu estava fora.

Até hoje eu tinha 5 versões: Will adolescente nerd; Will popular; Will comprometido; Will pegador e finalmente minha versão atual Só Will.

Definindo rapidamente: eu tinha poucos amigos e me dedicava a vídeo game e estudos, depois comecei a jogar um pouco de basquete e fiz algumas amizades importantes, entre elas a líder de torcida April, única namorada e noiva, a qual me traiu com meu padrinho de casamento semanas antes, Will pegador – minha melhor fase, diga-se de passagem – foi o momento onde decidi que a vida é injusta e que devemos aproveitar os míseros prazeres que ela nos dá – essa fase só durou alguns meses – e então a fase Só Will começou quando Vi April grávida, andando de mãos dadas com aquele idiota no shopping.

Com apenas 23 anos, eu decidi me focar nos estudos mais uma vez, cultivei um circulo pequeno de amizades, comprei versões modernas dos antigos vídeo games e assinei Netflix, desde então tudo estava indo perfeitamente bem. Meus amigos me arrastavam para o que eles chamavam de convenção "Apresentar o mundo ao Will" de tempos em tempos até que a ruiva apareceu. Eu podia ter dado o pior fora da história nela, mas com certeza que estava fodido era eu, no fundo no fundo eu sabia uma 6ª versão estava por vir: Will pós Spencer.

Metamorphosis - Em revisãoOnde histórias criam vida. Descubra agora