Capítulo 66

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Já não vejo mais a luz, não vejo mais esperanças.

A bruxa me disse que surpreendi ela, pois se passaram dois anos e ainda estou viva, mas o que me mantinha viva mesmo era a esperança, que se foi com a notícia que estou aqui a dois longos e sofridos anos.

Sabendo disso me desapeguei de tudo. De Faruk. De papai. De Rocca. De Uga. De Tessa. De Louise. De Tales...

Creio que minha vida está chegando ao final, creio que logo estarei livre de tanto sofrimento.

Creio que tudo acabará em breve, e aceito feliz o meu destino. Aceito que lutei enquanto podia, mas estou sem forças.

Fazem três dias que não me levanto do chão frio. Fazem três dias que não me movo do lugar.

Respiro com dificuldade e tremo constantemente. O frio se apossou do meu corpo e o calor que eu sentia em minhas asas também foi embora.

Sinto que jamais poderei rever Faruk e que ele jamais sairá do seu eterno pesadelo.

No fim, restou para mim uma morte sofrida e infeliz e para Faruk restou uma eternidade de sofrimento, irá viver e perder pessoas para sempre sem poder jamais morrer em paz.

Terá que enterrar todos a sua volta sem jamais ser enterrado e ter a paz. Para mim ainda restou a morte triste, mas vagarei pela eternidade por essa floresta escura e sem vida, fria e solitária.

Viverei apenas no sopro de vida, e poderei compartilhar talvez do sofrimento de viver eternamente, assim como Faruk.

Muito provavelmente não serei lembrada por ninguém daqui alguns anos, mas viverei sempre guardada no coração de Faruk e isso me basta. Isso me consola.

Sei que jamais terei sossego, mas prefiro ir agora e pelo menos viver livre das dores físicas que tomam meu corpo.

Poderia eu dizer "Adeus mundo cruel! Mas seria muito clichê!"

Poderia apenas dizer " Finalmente terei paz! Mas sei que isso está longe da verdade!"

Poderia imaginar inúmeros jeitos de acabar de modo mais digno, mas sei também que toda minha dignidade está perdida junto com a esperança de viver alegre.

Me arrependo de ter deixado papai, me arrependo de ter deixado Tessa, cujos rostos nunca se apagarão de minha fraca memória.

Lamento não ter salvo dona coruja e ela ter ido tão tristemente. Lamento não ter tirado Faruk de sua escuridão...

Lamento nem ao menos ter dito: Adeus!

Acredito que ele me procurou, que ele me amou e que tentou acreditar que eu estava viva, mesmo que tudo provasse que não.

Mesmo que meu grito tenha ficado pairando pela floresta vazia enquanto ele me procurava. Talvez ele tenha tirado a própria vida e nos encontremos em um lugar diferente.

Talvez melhor
Talvez pior.

Não será fácil apagar um sentimento tão forte.

Eu finalmente entendo agora...
Amo Faruk
E me casaria com ele, seria feliz, mas tudo que me restou foi a dor de ter tudo arrancado de mim.

Ouço uma voz ao longe me chamar e acredito que seja o fim, pois a voz se parece com a de um anjo.

O som ecoa em minha cabeça, a voz doce me busca com vigor, sinto meu corpo todo dormente e por um instante sinto que está tudo bem.

A voz me chama mais e mais, é como música para meus ouvidos. Fecho os olhos e sorrio fracamente.

Sei que estou pronta para dizer adeus, sei que estou pronta para abandonar tudo.

Sei que estou pronta para ir...

A voz que me chama é aveludada, grossa e rouca.

Me lembra a voz de Faruk. Isso faz uma lágrima milagrosamente cair do meus olhos fracos  e embaçados.

Abro os olhos e volto a ver o chão frio, escuto tudo ao longe, vejo passos em minha direção e sei que devo ir.

Ouço mais uma vez a voz me chamar e fecho os olhos novamente. Sinto a voz ecoar e sair mais alta dos meus ouvidos.

Sinto como se tudo fosse apenas poeira ao vento. Sinto como se tudo fosse apenas lembranças pequenas e desfocadas.

Sinto o ar de meus pulmões se tornando escassos.

Sinto uma imensa tranquilidade e sei que devo parar de pensar.

Sei que ninguém se importa realmente com o que está acontecendo comigo agora, pois ninguém ao menos sabe o que está acontecendo.

Me sinto sozinha
Desamparada e fraca.

Ouço mais uma vez a voz me chamar e decido deixar o choro correr solto. Sinto meu corpo ficar leve e é como se eu flutuasse e não estivesse mais no chão.

Abro os olhos pela última, creio que seja a última vez...

E vejo a escuridão se transformar em uma luz fraca, ouço meu nome, mas ignoro dessa vez.

- Te amo Faruk - digo antes da luz desaparecer e fechar meus olhos.









( Gente sou muito insensível né? Não chorei ao escrever esse capítulo, talvez por que eu sinta a mesma dor que Ada ao fazer essa despedida.

Também me sinto fraca e sem capacidade para continuar, realmente estou me sentindo como Ada.

A representação de Ada)

Faruk - Amando o Inimigo (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora