Semana escura

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"Te vivo...
Viajo no meu mundo
Sempre a sua procura
Com o sonho de ti encontrar"

Acordei com esses versos vagando pela minha mente, assim que o som do trovão invadiu o vazio em minha mente, Tiago estava me abraçando enquanto eu descansava minha cabeça em seu peito, as meninas foram para suas casas passar o final do ano com suas famílias, seus cursos haviam liberando-as mais cedo do que o meu, eu só poderia voltar para casa no próximo sábado, faltava uma semana para finalmente largar isso tudo.

Havia desistido de caminhar quando o carro parou, ele desceu do automóvel alto, caminhou até mim, percebendo que era sério se sentou ao meu lado, depois me colocou em seu colo me apertando o mais forte que podia sem me machucar, tudo que eu podia fazer era chorar, e deixar com que aquela água que caia sobre minha cabeça me lavasse de tudo que havia acontecido. Eu não chorava somente por ter que dizer "não" ao garoto mais perfeito que havia conhecido, por nunca ter podido ama-lo, e como eu queria ter conseguido, porém também chorava por estar longe de casa, por sentir falta das minhas amigas, por estar crescendo, e não ser aquilo que imaginei ser, não sei se a minha "eu" mais nova gostaria de mim caso me visse, eu tinha me afastado de alguns princípios básicos, que antes eram a base de quem eu era. Não sou mais uma criança, agora sou adulta.

Quando meu choro sessou, Tiago me levantou e me carregou até o seu carro, passamos todo trajeto até minha casa em silencio, e quando chegamos lá ele não resistiu ao instinto de continuar cuidado de mim, me levou até a porta do banheiro, depois me trouxe roupas limpas, quando já estava em meu quarto sentada sobre um baú que tinha posto propositalmente abaixo da janela, agora úmida por causa da chuva que descia sobre seu vidro, ele se sentou de frente para mim com um rosto cansado.

- O que houve? – Eu respirei fundo antes de expressar qualquer som.

- Acabou. – Falei baixinho sentindo minhas lagrimas – Eu estraguei minha chance de ser feliz, por ainda amar um idiota a mais de dois anos, eu achei que conseguia.

- Preta, eu entendo. – Ele se aproximou de mim, se sentando no chão e me puxando para ficar ao seu lado.

- Eu queria muito que desse certo, eu tentei, mas eu estava no meu limite, eu não podia fazer isso comigo, muito menos com ele, eu não o amo – Novamente as lágrimas correram.

- Vai ficar tudo bem, eu estou aqui.

Quando menos esperava o cansaço me venceu, só pude perceber o quanto tinha dormido ao olhar para o televisor do meu celular, depois de levar um susto com o barulho do trovão do lado de fora, já era quase de manhã, porém por causa da chuva ainda parecia ser noite. Me soltei dos braços do meu amigo, e usei meu tom mais calmo para lhe mandar deitar em minha cama.

Segui me arrastando pelo caminho até o chuveiro, pressentindo que terei uma semana péssima, acho que gosto mais da ideia de estar sentindo algo, lembro que quando as coisas tiveram fim entre mim e o menino que me prendeu em seu olhar desde a primeira vez que elevei meus olhos até ele, tudo que eu sentia era um vazio, parte de mim arrancada, eu simplesmente não conseguia expressar nenhuma emoção, agora era diferente, eu sinto.

Quando cheguei da faculdade havia um bilhete fixado com imas sobre a parte externa da geladeira:

"Tive que resolver algumas coisas, volto mais tarde com comida para vermos sua serie favorita."

Aquilo me fez sorrir, normalmente quando dizia "sua serie favorita", se referia não a minha, porém a sua serie predileta, a qual eu também seguia, dificilmente encontrava uma serie que não gostava, sempre gostava de todas que me mostravam, isso as vezes se torna um problema, pois nunca consigo acompanhar todas que tenho vontade.

Lá para as oito horas da noite ele já estava entrando pela minha porta fazendo barulho de diversas oitavas diferentes, também tinha trazido seu violão, estava começando a achar que aquilo era jogo sujo, pois também achei chocolate em suas sacolas do supermercado, estava difícil continuar triste perto dele, segundo ele, esse era o intuito, tinha até programado passeios durante a semana e me dado a maravilhosa notícia de que viajaria junto comigo se permanecesse em São Paulo mais dois dias depois que entrasse oficialmente no período de férias, havia concordado, afinal dois dias não era nada se comparados a todos os outros que passei contabilizando para a chega das férias.

Dormi logo no primeiro episódio que começamos a assistir, estava muito confortável deitada no sofá para não permitir que o sonho começasse.

******

Estava com a minha única mala pronta quando Tiago chegou, desta vez ele nem precisou me apressar ou adiantar os meus relógios, a semana tinha se arrastado, parecia que séculos tinham se passado no período de sete dias, no final posso defini-la como uma semana escura, durante todos os dias a chuva se dispôs a aparecer, precedida de um frio incomum. Mas finalmente tínhamos chegado neste momento, eu estava precisando de um tempo longe de tudo isso, me torturei quando vi o rosto abatido do Tarso, ou todas as vezes que recusei suas ligações. Sempre soube o que aconteceria caso decidisse fazer o certo, agora tenho que arcar com as consequências, tive apenas dois dias para chorar e me lamentar, ao final do segundo me levantei e continuei com minha vida, e de certa forma eu estava bem comigo mesmo, estava mais leve, existem pessoas que decidem carregar um fardo sobre suas costas apenas por conveniência, por ter aprendido que sentir seu ombro pesar é melhor do que não sentir nada. Eu não quero ser esse tipo de pessoa.

Quando cheguei a minha casa, conversei um pouco com meus pais, e depois fui para meu quarto tomar um banho, para que estivesse em um estado agradável para me sentar à mesa com todos.

Em cima da minhaescrivaninha estava uma pequena caixa, que nem me lembrava mais que a possuía,dentro dela estava o anel que havia ganhado de Isaac a muito tempo atrás. Entãoentendi os versos que havia sonhado na semana passada: meu coração jamais vaideixar de procura-lo, mesmo que minha mente o obrigue a fazer o contrário, meusubconsciente sempre criará uma realidade que existirá apenas em meus sonhospara confortar o meu incessante desejo insano de o tê-lo novamente. Negar queesse sentimento é real, me consumirá cada dia mais me fazendo vive-lo, poisestou sedenta por uma forma de destruir o que tenho vontade, o melhor é aceitare esperar que o tempo novamente faça seu trabalho. 

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