5.0 Sara

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— Você disse que estaria vazio, merda. – dou um rápido soco no braço de um barbudo tarado que acabou de passar a mão na minha bunda. O mesmo sai de perto e volta pra junto dos amigos, todos com um sorriso nojento no rosto.

Nem acredito que estou reclamando de um bar lotado, mas é que passar por todas essas pessoas abarrotadas e espremidas no P.J. Clark's é pior que fila de banheiro químico.

— Deve estar tendo alguma coisa pelas redondezas, domingo não é dia de lotar assim. – Frank abre espaço na minha frente em direção ao palco.

— Eu preciso de uma bebida. – Declan, atrás de mim, reclama impaciente.

— Acabamos de nos afastar do balcão do bar, alcoólatra. Me admira você não precisar de uma boceta também... – Ouço a voz do outro gêmeo vir de algum lugar às minhas costas.

Declan ri alto:

— Isso eu não preciso nem dizer né.

Enfim conseguimos alcançar as escadas ao lado do palco. Com os instrumentos prontos e o som já passado, eu abro a apresentação cumprimentando os bêbados tarados e mal encarados do bar.

Essa calça de couro foi uma péssima ideia...

Eu começo de forma lenta os primeiros versos de Fever da Peggy Lee, dona de uma das vozes mais quentes que já ouvi. A música é sensual e como sempre acontece quando eu subo no palco, eu entro de cabeça e faço daquilo o meu momento. Algumas pessoas me encaram com olhos gordos, isso já foi motivo de problema no início, mas já não me incomoda mais. Depois de tanto tempo cantando em lugares lotados assim eu já tinha me acostumado.

Balanço meus quadris vagarosamente enquanto deixo minha voz rouca e cadenciada fluir pelo ambiente. Eu sei o efeito que ela tem, eu trabalhei duro pra isso, e ver o resultado positivo vindo da plateia é o melhor combustível que eu poderia querer.

Como nossa banda é conhecida por não seguir um ritmo de estilos e sim agradar a todos os gostos, canto em seguida It's a Man's World na versão da Etta James, Iron Man do Black Sabbath, Down on The Street do The Stooges, Green River do Creedence Clearwater Revival e logo depois Highway to Hell e Back In Black do AC/DC.

Quando começo os primeiros versos dessa última canção, sinto meu corpo vibrar de excitação. Eu sou o tipo de pessoa que não fica parada num único lugar em cima do palco, eu uso todo o espaço disponível ali, eu reconheço e interajo com todo o ambiente, só assim eu posso sentir a música fluindo dentro de mim. O suor que salpica meu corpo devido ao esforço no palco parece se aquecer e me esquentar ainda mais, e é com esse estímulo que eu me perco na letra da música e canto como se a minha alma dependesse disso, como se fosse ela gritando à plenos pulmões tudo aquilo que eu sempre senti.

Desde pequena, essa música sempre mexeu comigo de uma forma que eu nunca soube explicar. Eu me identificava com ela, me sentia forte, poderosa e invencível o suficiente pra acreditar que um dia eu seria feliz e sairia do inferno onde eu estava vivendo. Eu me deitava na cama a noite e pensava em como eu sempre fui uma pessoa que nunca pertenceu a lugar nenhum, pensava em como viver naquela casa com aquelas pessoas estava me sufocando e tirando a vida do meu corpo cada vez mais como se eu realmente estivesse pendurada por um corda enrolada no pescoço. Agora que eu estou longe do lixo que foi o meu passado e a minha infância, agora que eu posso parar de me censurar e limitar, e enfim, ser quem eu realmente sempre quis, eu canto essa música como um hino, uma lembrança e uma prova do que eu sou capaz.

"De volta do luto, eu caí na cama.

Estive longe por muito tempo, estou contente por estar de volta.

Meu Caos Nos Seus Olhos - Livro DoisOnde histórias criam vida. Descubra agora