capitulo 17 - Sobreviver

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            Acordei às onze da manhã, e vinte minutos depois acordou a minha mãe. Ficámos a conversar durante o resto da viagem. Às duas da tarde, chegámos ao aeroporto de Faro e, para meu espanto, tínhamos a família toda à nossa espera. Mal nos viram vieram todos abraçar-me, deviam estar muito preocupados comigo. Então, pela primeira vez, senti-me culpada por toda a aflição que os fizera passar, e enquanto os abraçava, apercebi-me do quão egoísta tinha sido nos últimos dias. Apenas tinha pensado na minha dor, e nunca tinha parado um segundo que fosse para pensar no quanto as minhas acções os podiam afectar, porque afinal de contas eles eram a minha família, e de certeza que, se eu morresse, eles sentiriam uma dor parecida à que eu sentia por ter perdido Taylor, e eu não queria isso para eles, nem para ninguém.

            Na viagem até casa, voltei a pensar na alucinação e no sonho. Na alucinação Tay parecia querer dar-me uma pista sobre alguma coisa que eu tinha de procurar, alguma coisa chamada “Para Sempre”, uma coisa que eu não fazia ideia do que era. E o sonho parecia ser uma pista para completar a alucinação: no sonho estávamos nos baloiços em frente às roseiras enquanto falávamos sobre os preparativos para os concertos, depois apareciam os cães e molhavam-nos, a seguir íamos lanchar e falávamos sobre a minha prenda de aniversário. Tudo me parecia facílimo de resolver, e talvez fosse por isso que não conseguia chegar à solução, porque era demasiado óbvia, mas, tinha de admitir, que naquele momento o meu cérebro não estava em condições de resolver o que quer que fosse, ainda estava a recuperar dos incidentes dos últimos tempos e não estava a trabalhar a 100%, e se não o deixasse descansar, então nunca mais voltaria ao normal, por isso decidi que não voltaria a pensar naquilo até que me sentisse novamente eu própria, mais inteligente, atenta e perspicaz. Depois de quarenta minutos de viagem, chegámos a casa e fomos almoçar. Fiquei satisfeita por, finalmente, poder comer em casa, onde a comida sabia bem.

            Quando acabei, os meus pais ficaram a conversar com os meus avós e eu desci e acendi a televisão. Procurei em todos os canais um programa que fosse menos deprimente para mim, mas em todos os canais falavam sobre Taylor, sobre a sua morte e sobre o seu funeral, e isso era a última coisa que eu escolheria ver. Acabei por desistir, quando vi que eu também aparecia na televisão anunciando a morte de Taylor. Esse era outro problema que ia ter de enfrentar, a minha popularidade. Durante o tempo que passara com Taylor, ele e Alice fizeram tudo o que estava ao seu alcance para me esconder dos jornalistas e paparazzi, porque queriam que eu mantivesse a minha privacidade. Ele nunca gostou de como os paparazzi tinham a capacidade de pegar em algo bom e maravilhoso e torná-lo triste e horrível, sempre sofreu muito com isso e não queria que me acontecesse o mesmo, por isso nunca revelou a minha identidade ou nacionalidade a ninguém. Por exemplo, nunca tinha falado em português em frente à televisão e ele nunca dizia o meu nome completo. E até àquele momento tinha funcionado, mas de alguma maneira eles tinham descoberto tudo sobre mim, pois no cimo da notícia aparecia “ Inês, a namorada do cantor foi finalmente descoberta.” Ao ver aquilo apercebi-me de que não iam ficar por ali, de certeza que os media iam querer mais informação sobre mim e sobre a vida privada do Taylor, e claro viriam direitos à origem da informação. Estava quase segura de que naquele momento já deviam estar no avião, a caminho de Portugal, preparando-se para tentar destruir a minha vida tal como tinham tentado fazer com a de Taylor, mas se Taylor tivera força suficiente para suportá-los eu teria também, aliás, a única diferença entre nós os dois é que ele tivera o meu apoio quando os media começaram a atormentá-lo. Nesses momentos, mais que nunca eu era o seu porto seguro, enquanto que eu não o tinha para me apoiar. Mas teria de aprender a viver com isso, pois não tinha muitas outras opções.

            Só depois do jantar é que fomos para nossa casa. Mal cheguei fui para o quarto, o meu pai levou-me as malas até lá e depois foi-se embora. A primeira coisa que fiz foi desfazer as malas, arrumar o que tinha de ser arrumado, e pôr para lavar o que estava sujo. A seguir fui desejar boa noite a todos, voltei para o quarto e sentei-me no chão, li um bocado e a seguir deitei-me e adormeci. Voltei a ter o mesmo sonho, o que na realidade não me incomodava, não queria saber se no dia seguinte acordaria cheia de dúvidas sobre porque tinha sonhado com aquilo, ou se acordaria a chorar, não queria saber de nada, porque por muito triste ou confusa que estivesse quando acordasse valia a pena sonhar com aquilo, porque não era como nos outros sonhos em que nos limitamos a observar o que sonhamos, naquele sonho era como se eu voltasse atrás no tempo e voltasse a viver aquele momento outra vez, e só pelo facto de poder ver Taylor a sorrir outra vez valia a pena aguentar tudo o que me esperasse ao acordar.

            Como já tinha previsto, acordei a chorar. Estava dividida em duas partes: a que se sentia abençoada por poder estar com Taylor, pelo menos, nos sonhos, e a que se sentia infeliz por ser só um sonho. De qualquer das maneiras, sentia-me desgraçada por o sonho ter acabado. Depois de acordar sentei-me no chão outra vez a ler, até à hora de almoço. Almocei sozinha porque os meus pais estavam no trabalho e o meu irmão estava na casa da minha avó. Depois voltei para o quarto e ouvi música até aos meus pais chegarem do trabalho, às sete e meia da noite, nesse momento fui para a sala e vi televisão, meia hora depois de os meus pais chegarem chegou o meu irmão, ajudei a minha mãe a preparar o jantar, a seguir jantámos e quando acabei fui outra vez para o quarto, deitei-me e fiquei a olhar para o tecto, de luz apagada, até adormecer. No dia seguinte voltei a fazer exactamente o mesmo, e no outro dia a seguir também, tal como nos outros que se seguiram. Todas as noites sonhava com o mesmo, todas as manhãs sentia o mesmo e todos os dias fazia o mesmo, as únicas excepções aconteciam aos fins-de-semana, quando ia almoçar à casa da minha avó.

            Ao contrário da maioria das pessoas que vivem um dia de cada vez, eu vivia uma hora de cada vez. As horas pareciam dias, os dias pareciam semanas e as semanas meses. Resumindo o tempo para mim custava a passar, talvez porque passava o dia inteiro à espera que chegasse a noite, pois os sonhos com Taylor eram os únicos momentos de felicidade que tinha.

            A minha vida limitava-se a isso, a suportar o decorrer das horas. Não tentava ser feliz, nem fazer outras coisas sem ser ler e ouvir música, nem sequer me dava ao trabalho de sair de casa, não me esforçava por melhorar, mas também não me deixava ir abaixo. Levantava-me de manhã disposta a viver mais um dia, tentava sorrir quando estava com pessoas e tinha uma alimentação saudável, já que isso deixava a minha mãe mais descansada. Resumindo não melhorava, mas também não piorava, mantinha-me estável, limitava-me a aguentar, a sobreviver. 

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