capitulo 11 - O caminho até ao objetivo

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Quando voltei a acordar, apenas psicologicamente, o chão duro tinha sido substituído por algo mole e confortável, havia algo a tentar obrigar-me a respirar, mas a minha resistência era incrível, cheirava-me a desinfectante e a produtos esterilizados, e conseguia ouvir, além de pessoas a andar de um lado para o outro apressadas, um som que parecia vir de algo que estava ao meu lado. Não queria esforçar muito o cérebro com medo que, devido ao esforço, voltasse a trabalhar normalmente, por isso fui lenta a descobrir onde estava, mas era bastante fácil, estava no hospital. As pessoas que eu ouvia eram médicos atarefados e aquele som que eu ouvia, o “bip, bip, bip…”, devia ser a máquina à qual estava ligada a mostrar o meu ritmo cardíaco. Fiquei satisfeita ao ouvir os bips porque, podia não ter parado, mas o meu coração estava fraco e lento e isso era bom, não devia faltar muito para chegar ao objectivo.

            Ouvi alguém a entrar apressadamente e a dirigir-se a alguém que estava ao meu lado.

            - Então, como é que ela está? – perguntou uma voz masculina, reconheci-a, era a voz do médico que tinha atendido Taylor. Isso era bom, se ele demonstrasse ser tão inútil comigo como tinha sido com Tay, eu ia, decididamente, morrer.

            - Está péssima doutor, apenas 20% de possibilidades de sobrevivência. – disse uma voz feminina, uma enfermeira talvez.

            20% de possibilidades de sobrevivência, isso era óptimo, eu estava a conseguir. Que poderia fazer 20% de vida contra 80% de morte?

            Mesmo assim, não fiquei completamente descansada, 20% era pouco mas era alguma coisa e eu não ia deixar que nada arruinasse o meu plano, destruiria até a mais pequena das possibilidades.

            Concentrei-me nos bips e fiquei satisfeita, pois cada vez eram mais lentos e frágeis. Eu estava a conseguir, estava tudo a correr bem, dentro de pouco tempo estaria com Taylor outra vez. Este pensamento fez com que o meu coração abrandasse ainda mais, o que me fez sorrir. “Obrigado”, pensei.

            O médico voltou, o que me deixou espantada, pois nem sequer me tinha apercebido de que chegara a sair.

            - E então, novidades? – perguntou, com a voz tensa.

            - Sim, mas não são das boas. Ela está a piorar, continua a rejeitar qualquer tipo de ajuda das máquinas e, não vai acreditar, há pouco o coração dela, de repente, piorou muito e, nessa altura, acho que a vi sorrir. – disse ela, com uma voz escandalizada. – Se continua assim, receio que não possamos fazer grande coisa.

            - Claro que ela sorriu, está a conseguir o que quer. – disse, e depois, talvez por causa da expressão da enfermeira, começou a explicar. – Isto não foi nenhum acidente, é um suicídio, é o desespero a ganhar perante a esperança. Eu já receava que ela tentasse algo assim. Talvez deixá-la morrer vá contra os meus ideais de médico, mas olho para esta rapariga e consigo sentir o esforço que está a fazer para acabar com a própria vida e, sinceramente, chego a desejar que consiga o que quer, só assim será feliz. – o médico manteve um tom compassivo enquanto falava, ele percebia-me.

            - Quer dizer então…? – começou a enfermeira.

            - Quer dizer que se o coração dela parar, não quero que tentem reanimá-la. Deixem a pobre rapariga conseguir o seu objectivo, ela já sofreu tanto, deixem-na ter o seu descanso ao lado da pessoa que ama. – disse ele, parecendo comovido.

            Naquele momento, desejei poder falar para lhe agradecer mas, como não conseguia, limitei-me a tentar sorrir.

            - De nada. – disse ele, dirigindo-se a mim; pelos vistos tinha reparado no meu sorriso.

            Ouvi-os a sair do quarto, deixando-me sozinha com aquele reconfortante som, que revelava que a minha existência estava a chegar ao fim. Deixei-me ficar assim, confortável, até que comecei a senti-lo, estava a chegar a hora. O meu coração era quase inaudível, já não conseguia raciocinar e todos os sentidos estavam a desaparecer. Tocou o alarme e, pouco depois, muitas pessoas entraram, deviam ser os médicos e as enfermeiras, e começaram a andar, quase a correr, pelo quarto. Não sabia o que estavam a fazer. Nesse momento, entrou outra pessoa.

            - Parem imediatamente! - disse a voz do único médico que eu reconheceria. – Não vamos tentar reanimá-la. Deixem-na em paz! – ordenou-lhes.

            - Doutor, vai deixá-la morrer? – perguntou alguém admirado.

            “Claro que vai imbecil! Ele não é como vocês!”, pensei. Se conseguisse falar, tinha-lhe dito umas quantas coisas pouco delicadas, para o ensinar a não se meter onde não era chamado, a ele e a todos aqueles enfermeiros e médicos de segunda que não sabiam o que era o respeito pelas decisões dos outros.

            - Vou! Isto é o que ela quer, lutou muito para chegar a este ponto, por isso vamos respeitar a sua escolha. – disse ele, enquanto eu pensava “ É mesmo isso!” - Eu sei o porquê de tudo isto. A única coisa que esta criança quer é reencontrar quem perdeu. De certa forma, devo admitir, sinto-me culpado por levá-la a estes extremos. Isto não estaria a acontecer se eu o tivesse conseguido salvar. Acho que respeitar a sua escolha é a única coisa que posso fazer para remediar todo o mal que lhe fiz. – disse ele, e depois continuou, desta vez dirigindo-se a mim. – De certeza que ele está lá à sua espera. Por favor, alivie a minha consciência, e peça-lhe desculpa pela minha incompetência.

            Não era assim tão má pessoa como eu pensava, queria agradecer-lhe por me compreender e dizer-lhe que daria o seu recado, quis sorrir outra vez, mas naquela altura já nem isso conseguia, o que me agradou.

            - Agora só temos de esperar. Já está a acabar. – sussurrou.

            Sim, eu conseguia senti-lo, estava tudo a acabar. Fisicamente já estava tudo acabado, e psicologicamente estava quase. Já não conseguia ouvir, não conseguia pensar, não conseguia sentir e muito menos respirar. Mas conseguia sentir os segundos a passar e a acabarem. Comecei a contar mentalmente os segundos que faltavam para o fim, o fim de tudo, o fim da minha vida.         

            “Cinco, quatro, três, dois, um…” 

Para sempreOnde histórias criam vida. Descubra agora