A câmera ao lado da escadaria em formato de L voltou-se na posição inicial, ficando frente-à-frente com uma mulher jovem, magra e de cabelos negros caídos rente ao rosto. Era Barbara.
"...ele está cada vez com menos momentos lúcidos, e sinto dizer que agora a consciência de Billie está ficando completamente obliterada durante os acessos. Isso é novo e pareceria eliminar a histeria real..."
Barbara piscou, inspirou e encostou a porta de entrada da casa. A voz grave e profunda de Ethan ainda martelando em sua mente. Pendeu a testa na madeira gelada e fechou os olhos, profundamente cansada. A conversa com os médicos responsáveis pela saúde de seu filho havia sido longa e exaustiva. E tinha aquilo com a água benta também. Seus temores se confirmavam reais. Seu filho corria perigo de vida e não havia nada que ela pudesse fazer para salvá-lo, a não ser seguir o conselho dado por seu próprio irmão, que ela quis ignorar por hora, afastando-o de seus pensamentos.
"...parece sofrer de síndrome de um tipo de distúrbio que raramente se vê mais, exceto entre culturas primitivas. Nós a chamamos de possessão sonambuliforme. Para ser sincero, não sabemos muito sobre ela, apenas que começa com um conflito ou culpa que acaba levando o paciente à ilusão de que seu corpo foi invadido por uma inteligência externa; um espírito, podemos dizer. No passado, quando a crença no mal era relativamente forte, a entidade de possessão era geralmente um demônio. Mas, em casos mais modernos, é mais comum que seja o espírito de alguém morto, normalmente alguém que o paciente conhece ou já viu e que é capaz de imitar de forma inconsciente, na voz e nos trejeitos; até mesmo os traços do rosto, em casos mais raros..."
Vivian era a única pessoa que Billie conheceu e que faleceu enquanto a criança criava um certo senso de lógica em relação ao óbito. No entanto, não era possível que uma garota tão pura e cheia de vida como sua cunhada fizesse aquele tipo de atrocidade. Ela saberia reconhecer os traços de Vivs em meio àquele semblante demoníaco do filho. Barbara se recordava do que o psiquiatra havia dito, mas não aceitava que era apenas a consciência de Billie lhe obrigando a fazer aquilo. Havia algo de errado nele, algo que ninguém mais conseguia ver. Somente a mãe.
Quando o dr. Shepard, melancólico, saiu da casa, Barbara telefonou para seu gerente de loja e informou a ele, desanimada, que com certeza não conseguiria ir trabalhar na manhã seguinte. Depois, com um pesar no peito, telefonou para a residência de sua mãe; a ligação chamou e ninguém atendeu do outro lado da linha. Barbs desligou o telefone com um receio que só crescia no peito. Se seu irmão, Samuel, dispensou a hipótese de fazer um exorcismo em seu filho e os médicos não sabiam o que se tratava tudo aquilo, ela estava sozinha. Cogitou de modo desesperado que talvez estivesse sem nenhum amparo naquela batalha entre bem e o mal.
Levantou os olhos da porta e fitou o marido parado ao lado do colchão na sala, encarando o filho tristemente. Suas pálpebras pesadas; reprimiu um bocejo e entrou no banheiro ao lado do escritório, no térreo. Ficou ali dentro em silêncio por cerca de quase uma hora.
"...casos nos quais é mais fácil lidar com os espíritos dos mortos; não se vê a ira na maioria deles, nem a hiperatividade, nem a excitação motora. No entanto, no outro tipo principal de possessão sonambuliforme, a nova personalidade é sempre má, sempre hostil em relação à primeira. Seu principal objetivo na vida é prejudicar e, às vezes, até matá-lo..."
Barbara moveu-se para longe da porta, pegou Billie no colo e subiu as escadas em direção a sua suíte. Deu banho no garoto na banheira e o vestiu com o pijama de flanela azul. Abriu delicadamente a boca do filho enquanto o levava para o quarto, o deitou na cama e despejou em sua língua um pequeno comprimido de cor amarela. Provavelmente um estimulante que os doutores haviam o receitado. Ele era jovem demais para ingerir tantos remédios. Era injusto que algo tão profano acontecia com uma criança. Um ser totalmente puro e de luz.
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Found Footage
ParanormalA história a seguir consiste em fatos reais, não inventados, manipulados ou baseados em terceiros. Os nomes dos indivíduos retratados (se conhecidos) foram modificados para a segurança dos familiares e envolvidos.