18.

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Adriana foi incapaz de se mover. Teodora descansava uma das mãos na maçaneta dourada, olhando para a investigadora como se a visse pela primeira vez. Tudo no escritório era silêncio, exceto pelo som distante do cortador de grama que entrava pela porta aberta. As duas se avaliaram, e Adriana abaixou o folheto ao perceber o olhar fixo de Teodora sobre ele.

Ela não parecia exasperada ou furiosa por ver a investigadora ali, invadindo seu espaço e seus segredos. Teodora, como sempre, estava impassível, mais exausta do que surpresa. Mais oca do que predisposta e explodir em acusações. O primeiro intuito de Adriana, naqueles momentos silenciosos, foi pedir perdão, porém a confirmação do que seu cérebro processava há dias anestesiou o corpo da investigadora. A única mensagem que vinha de sua cabeça era Martin é pai de Estefano, Martin é pai de Estefano, repetindo-se infinitamente no intervalo daqueles segundos eternos.

— Eu sinto muito — disse Adriana.

Ela só não saberia dizer por quê. Sinto muito por ter invadido teu escritório, sinto muito por ter mexido nas tuas coisas. Sinto muito por Martin ser pai de Estefano. Teodora a encarou e fechou a porta lentamente, se aproximando. Seus sapatos de salto baixo ecoaram no piso de madeira, até o som cessar. Teodora, sem demonstrar qualquer sentimento, observou a fotografia que descansava sobre a soleira da lareira. Seus olhos verde-escuros, profundos, faiscaram por um momento. Adriana esperou.

— Por que não faz a pergunta que a trouxe até aqui? — perguntou ela. Para a surpresa da investigadora, a voz de Teodora não continha um pingo de raiva ou desprezo, apenas cansaço. Uma estafa profunda que Adriana desconfiou ser permanente. Num tom curto, ela arrematou: — Estou a seu dispor, investigadora. Faça a pergunta.

— Não é necessário. Já sei a resposta.

— A senhora sabe. — Teodora riu como se aquilo fosse uma piada sem graça, pegando o panfleto que Adriana deixara na soleira da lareira. Acariciando a fotografia antiga de Martin com a ponta dos dedos, Teodora perdeu-se nas próprias memórias. Com outro sorriso cansado, ela balançou a cabeça para a fotografia. — A senhora pensa que sabe, mas na realidade não faz ideia.

Adriana engoliu em seco. Teodora traçou as feições de Martin como se ele pudesse saltar da fotografia amarelada. Ela apertou os olhos verde-escuros por um momento, conversando em silêncio com o rosto estático de Martin.

— Éramos tão jovens — continuou Teodora como se Adriana não passasse de uma estátua, uma parte da mobília. — Tudo era tão diferente, tão novo. Meu Deus, éramos tão... tão vivos.

Adriana desviou o rosto, sentindo-se uma intrusa naquele momento. Não era essa a confirmação que tu queria? Teodora suspirou para o panfleto, esperando por uma resposta de Martin que não viria. A investigadora quis interrompê-la, dizer que aquilo não era relevante para o caso, mas sua maldita curiosidade pinicava, atordoava seus movimentos e mantinha seus lábios cerrados.

— Foi tão breve, mas eu... nós nos amávamos tanto. — A voz de Teodora, embalada na dor anestesiada pelo tempo, vacilou por um segundo. Adriana trincou a mandíbula quando ela apertou o folheto, os lábios se transformando numa linha fina. — Mas meu pai descobriu e foi rápido em arranjar um casamento com um homem mais velho. Saulo foi um bom marido, um pai carinhoso, mas amor? Não. Amor, não.

Adriana umedeceu os lábios. Agora que confirmava suas desconfianças, queria que Teodora se calasse. Não queria simpatizar com ela, com sua história triste. Não queria se importar. Não queria ouvir, saber dos pormenores que levaram àquele desfecho. Mas eu quero ouvir e saber, ela pensou. Quero me importar. A investigadora encarou Teodora com um aperto na garganta quando ela deixou escapar uma risada melancólica.

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