20.

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— Bem, e esses foram os dados conclusivos da Perícia — disse Dante.

Reunidos ao redor da mesa naquela sexta-feira excepcionalmente quente, nenhum policial ousou dizer qualquer palavra. Os ventiladores velhos giraram e giraram e nem Bernardino, que sempre tinha um pitaco irritante a compartilhar, abriu a boca.

— Tu tá me dizendo que um cara entrou no quarto de Érica e que ele não deixou nenhum material genético pra trás? — perguntou Luís, vincando as sobrancelhas. — Nenhum fio de cabelo, nenhuma digital... nada?

— Fora a pegada da bota na janela, estamos sem nada. — Dante deu de ombros.

Adriana encarou a fotografia do solado no parapeito da janela branca do quarto de Érica e respirou fundo. Num viés otimista, aquilo confirmava a suspeita de que o invasor era um homem — ou uma mulher com uma pegada avantajada. Num viés pessimista, aquele amontoado de terra nem ao menos se parecia com o solado de uma bota. Todos os policiais murcharam, exceto Luís, que fechou a cara e cruzou os braços.

Se a investigação possuía fases, seu parceiro também. Se não tinham suspeitos, provas ou ao menos indícios, Luís ficava insuportável. Como uma criança mimada, queria respostas, novas linhas de investigação e, se possível, uma confissão por escrito, lavrada em cartório pelo principal suspeito. Às vezes esse senso quase assassino pela verdade era um tônico para superar os dias difíceis, mas às vezes era a própria recriação do Inferno.

Do outro lado da mesa, ele coçou a barba que recomeçava a nascer. Depois de Felipa dizer que não resistia a homens de barba, a primeira coisa que Luís fez foi aparecer na quinta-feira sem um pelo no rosto. Acostumada a vê-lo com aquela barba por fazer, Adriana franziu o cenho quando viu o parceiro entrar na delegacia cheirando à loção pós-barba e parecendo outro cara.

Perdida nas próprias observações sobre ele, a investigadora não percebeu que Miranda falava. Sua expressão era sem graça e, quando ela não passou nenhum arquivo a eles, Adriana sentiu-se derrotada. Dando de ombros, a jovem policial balançou a cabeça.

— Nada de novo sobre os desaparecimentos. Não conseguimos localizar os familiares das moças desaparecidas, e os familiares dos últimos desaparecimentos saíram da cidade.

— Ligamos para as cutelarias da região e da capital, também. — Ricardo assentiu para Adriana discretamente, seu olhar vagando entre os colegas e voltando para ela. — Nenhuma lâmina especial foi vendida recentemente. Podemos expandir a busca, mas...

Todos entenderam o que ele queria dizer. Sérgio tinha o rosto magro apoiado numa das mãos, Jorge rabiscava, cabisbaixo, em seu bloquinho e o delegado, na ponta da mesa, começava a se impacientar. Girando a cadeira e enchendo a sala com o som irritante, Bernardino umedeceu os lábios. Seus olhinhos miúdos focaram Dante por um instante.

— Não temos nada de novo? — perguntou ele, olhando para os policiais. — Ora, o que vocês andam fazendo por aqui? Esse caso já não deveria estar resolvido? Já vai fechar um mês e meio!

Dante encarou Adriana com as narinas dilatadas e o rosto pálido vermelho como o de um camarão. Discretamente, ela balançou a cabeça. Relaxa, Dante. Esse filho da puta não vale a pena. Ele engoliu em seco, organizando os papéis com um gesto irritado. Dante sabia ser a criatura mais tranquila do planeta, mas não suportava quando era cobrado ou duvidavam de seu trabalho.

E Bernardino, aquele gordo miserável, fazia de uma vez só as duas coisas que realmente tiravam Dante do sério. Girando na cadeira, ele esperou por uma resposta. Dante trincou a mandíbula e ergueu as sobrancelhas.

— Investigações de homicídio são assim, senhor. Os dados demoram, os suspeitos não cooperam e a vítima, infelizmente, ainda não pode voltar do além-túmulo pra apontar o dedo em direção ao culpado.

Sob a Pele de Érica | ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora