Capítulo 2

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Depois de meses sem sequer passar no portão da mansão em que cresceu, ela precisou ir para vistoriar a casa e saber o que precisava ser feito para que tudo fosse vendido. Os móveis e quadros, tudo que foi de sua família seria dado com a venda da casa, mesmo que Christine sentisse que era errado, pois eram lembranças demais para serem entregues nas mãos de estranhos daquela maneira. Após tanto tempo, tantos anos, aquele lugar não tinha mais lembranças felizes para ela. No final, queria que fosse uma boa recordação para alguém, mesmo que não fosse para si.

Já entrando na mansão, ela olhou ao redor e notou o quão suja e abandonada estava aquela casa que já tinha sido seu lar e seu cativeiro. "Lar, Doce Prisão", pensou ligeiramente enquanto deixava sua bolsa sobre uma mesinha redonda que ficava no corredor de entrada. Imaginou não ter ninguém ali, se sentindo então confortável o suficiente para tirar o pesado casaco que vestia. Era um sobretudo marrom bem escuro, preso em sua cintura por um cinto largo também marrom e de fivela de ferro grosso.

Usava uma blusa de mangas compridas e gola alta com alguns babados. Era em tom carmim, bem vibrante e muito bonita. Uma pena que estava sempre escondida abaixo de um casaco tão pesado. Usava também uma calça de couro não muito justa e de pala alta. A cintura bem definida mostrava que apesar do medo de se mostrar, aparentemente era uma mulher bonita, atraente.

Ela caminhou mais um pouco e deixou o casaco sobre um cabideiro que ficava próximo de um espelho. Tal qual ela usou para se mirar e ver se nada de sua maldição aparecia. Ela tocou a máscara com delicadeza e pareceu entristecer. Olhou suas luvas e quis tirá-las, pois estava com um pouco de calor, todavia preferiu ficar como estava. Seu par de botas era belíssimo, aliás. Era uma bota da coleção de inverno, exclusiva, da Armani. Ela adorava. Eram de couro, pretas e tinham o cano alto, além do salto não muito fino e que apesar de alto, dava uma pisada macia para a elegante Senhorita.

Ao chegar finalmente na sala principal do casarão, suspirou, o ar pesado de poeira não a incomodava muito. O piso de madeira maciça fazia barulho que parecia alto por não ter ninguém em casa além dela mesma. Tocou o sofá coberto por um lençol. Parou ao chegar próximo da lareira, onde havia um enorme quadro de seus pais. Eram dignos de um reinado.

— Sinto falta dela... — Sussurrou a misteriosa mulher, enquanto tocava a prateleira acima da lareira. As flores mortas não exalavam perfume e a poeira já as devorava. Era um cenário cinza e macabro. Misturado a tons de marrom por conta dos entalhes de madeira por toda a casa.

Ela deixou a sala principal e seguiu para a sala de jantar, não ficou ali por tempo suficiente para saber que alguém esteve ali. Seguiu caminho, chegou finalmente no lugar que queria. Tocou o corrimão da escada. Era feito de cerejeira e tinha detalhes em ouro e prata. Os degraus eram de mármore branco.

Ela subiu os degraus lentamente, seguindo para a ala esquerda da mansão, onde havia um enorme salão de bailes, claro, estava empoeirado e as mesas e cadeiras todas estavam cobertos por enormes pedaços de pano. Ela olhou o lugar e lentamente abriu cada uma das janelas, deixando uma brisa fresca entrar. Puxou os lençóis que cobriam grandes móveis até achar o que queria: O Piano.

O instrumento era feito de madeira, era em um tom de marrom puxado para o vermelho. Feito de Pau-Brasil, com entalhes originais de um homem chamado Pietro Cazarrov, um artista que seu pai mandou trazer da Rússia para moldar aquele piano em especial, somente para sua mãe. Ela sentou-se no banco de frente para o instrumento e tocou uma das teclas com delicadeza. O som entranhou pelas arruelas da casa grande e em seguida uma sequência de notas começava a encher o lugar.

Além das notas tocadas com maestria e destreza, seguia-se na música uma voz entoando um canto quase lírico. A voz feminina enchia o salão. De olhos fechados a Lady Mascarada imaginava em seus anseios aquele enorme salão cheio de pessoas, como costumava ser. Um baile de alta classe, onde as mulheres disputavam o vestido mais bonito e os cavalheiros conversavam e riam entre si, decidindo qual charuto era o melhor. A música que seguia a trilha sonora da festa era tocada pela própria mascarada, que também cantava, levando os homens e mulheres a se olharem e sem pensar, rodarem o salão até seus pés doerem no ritmo que era imposto pela entonação e pela dedilhada da musicista.

Christine - Ela É A Fera [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora