Et in Arcadia Ego

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"Então você agora tira pó das estantes do Ollivander?"

Hermione lançou um olhar feio na direção do loiro, que estava debruçado sobre o balcão da loja enquanto ela tentava organizar as caixas de varinhas nas prateleiras. Malfoy parecia entediado, como sempre acontecia quando ele saía do Ministério e ia visitá-los, com os olhos cansados e roupas escuras que não pareciam combinar com ele. Roupas de funcionários do Ministério, dos membros mais prestigiosos das Casas do Parlamento, não as roupas do rapaz bon vivant que ele era.

"Estou ajudando Garrick em tudo que posso," ela explicou. "De vez em quando ajudo até mesmo na fabricação das varinhas."

"E como é?" o garoto perguntou, mudando o peso sobre os pés. "Fabricação de varinhas é um ofício super mistificado."

A bruxa parou o que estava fazendo por um momento, tentando achar um jeito de explicar. Como ela podia descrever a sensação de entrar no atelier de Ollivander e sentir a magia pesando no ar? Ou o jeito como o homem sabia combinar cada madeira com núcleo e terminar de forjar o objeto com o formato perfeito? Nem ela sabia como Garrick reconhecia todas as varinhas que tinha ali dentro, mas ele fazia isso e ainda as tratava como velhas conhecidas.

"É... Diferente," a bruxa falou, encolhendo os ombros. "Não é o tipo de coisa que aprendemos em Hogwarts. Claro, tem uma técnica, mas boa parte do que Garrick faz parece... Intuição."

"Intuição?"

"Ele sabe quais madeiras e núcleos usar, mas na hora de combiná-los... É como se os materiais conversassem com ele? Não sei explicar." A jovem voltou para perto do balcão, depois de dar uma última olhada na prateleira recém arrumada. "Ele pode fazer duas varinhas de teixo com núcleo de fênix, mas as duas serão diferentes, seja porque ele as esculpiu de forma diferente ou colocou uma magia diferente ali... Elas são... Quase vivas."

Malfoy ficou em silêncio, o rosto apoiado na mão, enquanto a olhava. Então, suspirou profundamente e puxou o relógio de bolso pela corrente, abrindo-o.

"Deve ser divertido trabalhar com algo diferente," ele murmurou, fechando a tampa do objeto com um estalido metálico. "Vamos? Tommy já deve estar saindo."

A garota assentiu. Deu um último aceno com a varinha para organizar o balcão e enfiou a cabeça pela porta dos fundos para se despedir de Garrick, que estava tão absorto em esculpir o cabo de uma varinha que mal a viu saindo.

Abraxas já a esperava do lado de fora da loja. Era interessante como a postura dele mudara nas últimas semanas: se antes ela o encontrava com os ombros relaxados e as mãos no bolso de forma descontraída, agora ele mantinha a coluna e ombros retos, como se as roupas o impedissem de se mexer. Na rua, ele normalmente mantinha essa postura, como se tivesse medo de sair do padrão, mas era só entrarem no apartamento (ou, como ele gostava de chamar, o muquifo bolorento) de Tom que ele voltava a relaxar. Hermione se sentia mal de ver o quão contido ele ficava longe deles.

"Como vai o Ministério?" perguntou Hermione, enquanto desciam o Beco Diagonal.

"Uma chatice," Malfoy resmungou e batucou algo no chão. Só então a garota percebeu que ele estava com a bengala com o cabo de cobra, a mesma que ela já vira Lucius Malfoy usando. "Leis e mais leis. Puro-sangues propondo projetos e mestiços e nascidos trouxas os vetando e vice versa. De vez em quando tem um julgamento de verdade e eu posso ir assistir... Mas os últimos foram bem ridículos, como o de uma bruxa que azarou a prataria da vizinha trouxa para as peças dançarem can-can no jantar."

"Eu não sei se devia ficar feliz que essa é a coisa mais grave que está acontecendo agora no mundo bruxo ou se devia ficar triste pelo seu tédio," a bruxa falou, virando na Travessa do Tranco.

Kolybel'nayaOnde histórias criam vida. Descubra agora