Narrado por O.X
4 meses haviam se passado desde que comecei a me sentir como se não fosse mais o mesmo. Agora a neve já tinha derretido e a primavera dava seus primeiros suspiros. Aquela seria a minha primeira primavera e eu ainda não tinha nem mesmo completado as quatro estações naquele mundo. Embora não sentisse as diferenças de temperatura, demorava para que eu me acostumasse a andar na neve, ou a sentir a claridade dos fortes raios de sol, ou ainda com as ruas cheias de folhas secas e agora com as flores que viriam. Tudo era uma novidade para mim, mas ultimamente eu me perguntava por quanto tempo aquele seria o meu mundo, quanto ainda me restava daquela calmaria.
Sam não vinha reparando muito nas minhas mudanças bruscas de humor e nas minhas saídas cada vez mais comuns. Ela estava nos últimos meses do ensino médio e tudo em que conseguia pensar era em qual faculdade iria estudar e o que iria fazer da vida no próximo ano. Eu conseguia entender aquele sentimento, como se o futuro fosse uma folha em branco diante de nós, especialmente nos últimos dias. Antes era fácil pensar que eu passaria o resto de meus dias de robô ao lado dela, mas agora era como se isso fosse um sonho bonito que jamais se tornaria realidade.
Eu tinha mudado, e diferente do que Tei tinha me dito, eu não estava ficando melhor. Em algum lugar dentro de mim, eu sabia que eu nunca iria melhorar. Eu não queria que Sam percebesse disso, não queria que ela soubesse os pensamentos horríveis que eu tinha em minha mente agora. Eu queria que ela se lembrasse de mim como a pessoa que eu era antes, mesmo que aquele não fosse o meu eu real. Eu estava cada vez mais convencido de que a pessoa que eu era hoje era o que eu sempre fui, só que aqueles sentimentos ainda não tinham aflorado em mim antes.
Eu era um assassino, alguém sedento de sangue. Talvez aquela simplesmente fosse a minha alma, uma alma ruim. E você não quer que as pessoas que você ama saibam que você é ruim. Então você esconde e você mente. Isso é algo que eu aprendi, faz parte de amar alguém. Você só quer ser o seu melhor para aquela pessoa, mas quando você não consegue, você só...
É a única solução.
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Narrado por Sam
Oxy estava cozinhando algo enquanto eu me cobria em folhas e folhas de papel, formulários, testes vocacionais e tudo o mais que você possa pensar sobre o ensino superior. Deus, por que era tão difícil decidir? Para mim, pelo menos, aquilo vinha sendo o inferno. Não importava o quanto eu pensasse, eu não conseguia me ver fazendo nada, tendo uma profissão. Eu não era especialmente boa em nada e nenhuma profissão em especial me agradava. Eu pensava em algo relacionado a design, mas depois cogitava música ou administração. No fim das contas, até advocacia já tinha passado pela minha cabeça, o que era motivo de riso já que minhas notas não me ajudariam a entrar nem na faculdade que o moço da feira podia criar. Eu era uma bagunça.
E o pior é que era só eu. Daisie tinha certeza absoluta do que queria fazer, ela queria ser uma médica igual aos seus pais, mais especificamente uma pediatra. Ela vinha estudando bastante e tentando manter as notas altas, já tinha várias universidades em mente e com certeza não estava rolando em testes vocacionais no momento. Lola planejava cursar administração e já tinha até conseguido uma vaga numa universidade em uma cidade próxima. Eu era realmente uma bagunça.
– Sam – Oxy apareceu diante de mim e eu me assustei, afinal de contas estava ocupada choramingando por cima de um teste que disse que eu seria uma boa enfermeira. Logo eu que odeio agulhas??? – Você pode cuidar da comida pra mim por um minuto? Preciso sair para comprar um ingrediente que faltou.
Assenti, embora deixar alguém como eu controlando a comida não era uma escolha muito sábia, mas na falta de outra pessoa... Oxy saiu apressado e me deixou mexendo uma panela de sopa no fogão, enquanto eu tentava me imaginar com uma roupa de enfermeira e sentia arrepios só de pensar.
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Projeto O.X: Alma
FantasyEm 2117, os robôs são a mais alta tecnologia, sendo divididos em dois grupos: os ajudantes e os para relacionamento. Foi nesse contexto que o cientista Dumas Frondel criou O.X, seu humanoide mais impecável, absurdamente humano em todos os aspectos...