Karen, na noite das apresentações
Volto do banheiro pela quinta vez na noite e estanco no lugar, encosto no balcão onde o barman servia coquetéis aos convidados. Olho em direção a roda de amigos onde eu estava e foco em Callie, minha melhor amiga, ela precisa saber.
– Senhorita Andrade? – Saio dos meus pensamentos e olho em direção a voz que me chama, um homem alto e magro se posiciona na minha frente.
– Sim? – O olho curiosa.
– Sou Enrico Ruggeri, Diretor da Escola de Danças Artísticas na Itália. – A oportunidade pela qual me preparei a vida inteira, sendo oferecida a mim e teria que recusar.
– É um prazer. – Falo por educação, mas bem triste por dentro. Estendo a mão e ele aperta.
– Seu número solo foi uma aula de interpretação Senhorita, estamos oferecendo bolsas a talentos como você de outros países, gostaria de lhe ter conosco.
Se ele soubesse que não estava interpretando, que toda aquela dor é real talvez repensasse sua proposta. Bom, se fosse antes, eu não pensaria duas vezes em aceitar, mais as coisas mudaram.
– Obrigada pela oportunidade Senhor Ruggeri, mas não pretendo sair do país. – Falo com um firmeza forçada na voz.
O homem me olha desacreditado, afinal todo aluno de dança tem o sonho de estudar fora e na primeira oportunidade não deixaria passar. É raro uma recusa acontecer, eu sei e ele também.
– Pense bem senhorita, qualquer coisa entre em contato comigo até janeiro. – Diz e me entrega um cartão, com números de telefone e e-mail.
– Obrigada. – Abro um sorriso fraco e o homem pede licença e se afasta. Olho para o cartão desanimada, queria muito viver isso mas minha decisão estava tomada. Não é só eu agora.
– Era de onde? – Callie pergunta, apontando o homem que acabou de sair com os olhos. Não tinha percebido sua aproximação, ela está empolgada.
– Itália – Respondo sem ânimo, antes que possa terminar de falar ela bate palmas e me abraça apertado.
– Sabia que iria conseguir. – Fala com um sorriso no rosto. – Você merece amiga. – Completa.
– Eu não vou Callie. – Falo triste.
– Como assim não vai?
Ela me olha com a mesma cara do homem a uns instantes atrás, só que sem nenhum pingo de sutileza. Sua boca formava um O e suas sobrancelhas se unem demostrando confusão.
– Não posso ir, preciso te falar uma coisa.
Pego sua mão e a tiro do salão, andamos pelos corredores e entro em uma das salas vazias, coloco ela pra dentro e tranco a porta. Viro para encara-la e antes que eu possa contar o que está engasgado a alguns dias, ela já está falando.
– Amiga eu sei que você tá abalada mas focar na sua carreira pode te ajudar, tenho...
– Callie, estou grávida. – Lanço a bomba, ela fica sem expressão por uns segundos como se processasse o que acabei de dizer.
Seus olhos se arregalam como se fossem sair da caixa e depois se enchem de lágrimas, leva as mãos a boca e fica em silêncio. Vejo em seus olhos a pena, a impotência de não poder fazer nada. Vejo sua vontade de entender como eu estou me sentindo para enfim me ajudar com algumas palavra.
Mas palavras não vão ajudar nesse momento, estou grávida, grávida do cara que amei e que agora está morto. Uma parte dele está dentro de mim, parte essa que viria ao mundo com seus traços. Descobri a alguns dias e já chorei litros até processar o fato e aceitar a responsabilidade, estou decidida a ter essa criança, eu já a amo, lembro exatamente o dia em que a fizemos, quando esquecemos de usar camisinha, eu tinha tomado a pílula do dia seguinte, só que obviamente não funcionou, e não me arrependo, então não vou me acovardar.
Pablo me daria todo o apoio se estivesse vivo, posso até imaginar o sorriso dele com a notícia, mimando a mim e a criança sempre que pudesse. Ele será como um anjo pra mim e para o nosso filho. Sem falar nada ela me abraça, choro ao lembrar dele, choro pela criança que não teria um pai. Depois de alguns minutos ela me solta e limpa o rosto.
– Tem certeza disso? – Ela pergunta, ainda sem acreditar.
– Tenho, não sinto muitos sintomas, só desconfiei porque minha menstruação estava muito atrasada e com tudo o que aconteceu não liguei muito, só parei pra pensar nisso esses dias. – Falo e minha voz está embargada. – Então fui em uma clínica e fiz o Beta HCG, estou de oito semanas.
– Seus pais sabem? – Não, vou contar logo, sei que vão me apoiar.
– E a sua carreira Ka, o que você vai fazer? – Pergunta preocupada.
– Depois que o bebê nascer e passar uns seis meses, volto a ativa e corro atrás de algo pra mim.
– Qualquer coisa que você precisar me avisa, vou estar em LA mas posso mandar algum dinheiro pra você. – Ela diz apertando minhas mãos.
– Vou ficar bem amiga, vamos nos falar no WhatsApp sempre que você puder. – Falo sorrindo e ela me abraça novamente.
– Você não está sozinha, conte sempre comigo cadela. – Ela fala do nosso jeito carinhoso de sempre.
– Eu sei piranha. – Rimos juntas. Tenho certeza que minha vida não será mil maravilhas, sei que vou passar por dificuldades, afinal ser pai e mãe não é fácil, mas vou dar o melhor de mim.
E vou conseguir, meu filho será feliz e muito amado, saberá que o pai foi um homem bom.
![](https://img.wattpad.com/cover/127682627-288-k122215.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
AO SAIR DO MORRO (Completo)
RomansaCallie é uma jovem dançarina, dedicada fielmente a sua carreira, onde batalha diariamente para receber uma tão sonhada bolsa para estudar fora do país. Seu foco muda ao aceitar um convite, e esse convite a levará a um rosto conhecido, e mesmo que a...