Manu fechou os olhos, e eu, em um gesto de cumplicidade, fiz o mesmo. O silêncio que nos envolvia era quase sagrado, quebrado apenas pelo suave sussurrar da brisa noturna que parecia consolar nossas almas.
— Decepção? — Ela rompeu o silêncio, abrindo os olhos e me observando com uma intensidade que me fez sentir vulnerável.
— Scott não é o pai verdadeiro da minha filha. — A declaração pairou no ar como uma sombra densa, e eu franzi a testa, processando a gravidade da revelação. Othon, o verdadeiro pai de Valentina.
— E o que aconteceu com esse Othon? — Perguntei, a determinação se infiltrando em minha voz. A ideia de que ele pudesse ter machucado Manu despertava uma fúria latente dentro de mim.
— A verdade é que nem eu sei. — Ela desviou o olhar para as estrelas, talvez buscando consolo na sua imensidão. — Quando eu estava grávida de Valentina, Othon me deixou. Ela tinha apenas nove meses. — Uma pausa pesada se seguiu, como se cada palavra a machucasse. — Mas parece que isso não foi importante para ele.
— Ele te disse o porquê estava indo? — A pergunta escapuliu dos meus lábios, tingida de preocupação e indignação.
— Não, apenas pegou suas coisas e foi embora.
Sua voz tornou-se suave, e uma sombra de tristeza passou por seu rosto. O silêncio que se estabeleceu era pesado, mas eu permaneci atento, aguardando que ela continuasse.
— Pelo que conhecia de Othon, ele não era esse tipo de cara. Ele me amava, disso eu tinha certeza. Estávamos tão felizes com a chegada de Valentina, mas, de repente, tudo mudou. As promessas que ele fez, os votos de amor, tudo se tornou irrelevante. — As lágrimas começaram a escorregar por suas bochechas, tornando seu semblante ainda mais angelical e triste. — Sofri muito, Ethan. Fechei-me por tanto tempo, incapaz de abrir meu coração novamente. Aquele homem destruiu minhas chances de ser feliz, de acreditar em alguém, e isso me atormentou por cinco longos anos.
Minhas emoções se misturavam à raiva e à tristeza, enquanto a compaixão por ela se aprofundava. Eu queria gritar, querer me vingar de Othon por fazer Manu passar por tanto sofrimento, mas o silêncio era a única resposta que eu poderia oferecer.
— Mas, graças a Deus, tive pessoas que não me abandonaram: meus pais e minha amiga Chloe. Eles me apoiaram na criação da minha filha, uma garotinha que cresceu sem saber quem era seu pai e sem o amor que merecia.
— Ao ouvir sua história, percebo quão valente você se tornou. Você não deixou que a dor e a decepção a arrastassem para um abismo ainda mais profundo. — O nó na minha garganta se apertou, e um profundo desprezo por Othon se formou em mim.
— Eu sei que agi de maneira impulsiva. Talvez devesse ter esperado o casamento para me entregar a alguém. Mas Othon e eu estávamos juntos há tanto tempo que não vi mal nisso. Estávamos sonhando com o futuro juntos, planejando nosso casamento.
— Safira e eu também tivemos um filho fora do casamento, mas isso não diminui o que você é, Manu. A verdade é que esse desgraçado não deveria ter brincado com seus sentimentos assim. — A fúria pulsava em minhas veias, enquanto a proteção que sentia por ela crescia a cada instante.
— Sabe, o que eu penso é que, de alguma forma, Deus está me punindo por algo que fiz, e que nem eu sei exatamente qual seja.
— Talvez isso não seja um castigo, mas sim um livramento. — Sequei as lágrimas de seu rosto com o polegar, o gesto suave contrastando com a intensidade da conversa. — Esse homem poderia ter causado ainda mais dor se vocês estivessem juntos.
Fiquei um longo tempo perdido em seu olhar, acariciando suavemente seu rosto angelical com o dedo polegar. O desejo de beija-la crescia, mas a consciência da sua situação me impedia. Manu estava comprometida, e mesmo que eu quisesse seus lábios unidos aos meus, essa linha não poderia ser cruzada.
Aproximei-me um pouco mais, envolvendo-a em um abraço protetor, como se quisesse ser seu escudo contra todas as dores que já enfrentou. Fechei os olhos e me perguntei se alguma vez na vida já havia vivido um momento tão perfeito desde a perda de Safira. Eu estava apaixonado novamente, e essa sensação era ainda mais maravilhosa do que eu poderia imaginar.
Nunca pensei que voltaria a me apaixonar, mas agora compreendia que estava errado. As pessoas se vão, e outras surgem para preencher o vazio que elas deixaram.
E, agora, Emanuely era uma delas. Ela me mostrou que a vida não é apenas sobre o que perdemos, mas também sobre o que podemos ganhar. As experiências e as pessoas que nos rodeiam nos ajudam a curar as feridas e a restaurar a fé no amor. Sei que nenhuma pessoa substitui a outra, pois somos únicos, mas elas têm a capacidade de suavizar as cicatrizes que carregamos.
— Olha. — Manu se afastou ligeiramente de mim, seu olhar voltado para o horizonte.
O sol estava se pondo, tingindo o céu com uma paleta vibrante de cores que tornavam o cenário ainda mais encantador.
— Que lindo. — Ela deu um passo à frente, e eu a segui, perdido na beleza do momento.
Seus olhos se aprofundaram nos meus, refletindo uma admiração mútua que pulsava entre nós.
— Sim. — Sorri, minha alma aquecida pela simplicidade daquele instante.
Manu e eu passamos um longo tempo ali, observando o espetáculo que a natureza nos oferecia. Cada minuto ao seu lado era precioso, e a conexão que estávamos formando parecia tão forte quanto a beleza da paisagem diante de nós.
A montanha, o pôr do sol e Manu eram um lembrete de que a vida, com suas reviravoltas e surpresas, tem um jeito especial de nos conduzir a lugares que nunca poderíamos imaginar.
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Você É Tudo Que Eu Tenho! - Concluído.
RomanceEmanuelle Miller, uma jovem resiliente, enfrenta os desafios implacáveis da vida enquanto luta incansavelmente para sustentar sua pequena filha de cinco anos. Em meio à turbulência de uma realidade cada vez mais opressiva, sua esperança vacila, até...