Acordei assustada olhando em volta e percebendo que ainda estávamos no avião. Minha cabeça descansava na curva suave no ombro dela, seus cachos me acolhendo e me envolvendo no cheiro de flores que emanava deles. Eu sentia minhas têmporas latejando.
-Ei mulher acorda!
Levantei a cabeça e olhei para ela.
-Tá tudo bem?
-Tá, só um pouco de dor de cabeça.
-Quer que eu peça algo para a aeromoça?
-Não precisa, é só por que não dormi direito essa noite e to cansada.
Seu sorriso se tornou maior, os lábios felinos sorriram com malicia para mim. Senti o arrepio me subir pela coluna ao me lembrar do seu jeito insaciável, me procurando com os lábios e não me deixando dormir. Ela parecia saber que seria nossa ultima vez juntas.
Eu estava em um impasse.
Eu amava Vitoria. De uma forma única. Eu sabia que Letícia nunca iria ocupar esse espaço todo no meu coração. Mais uma parte de mim também amava ela. Eu não sabia o que fazer para enfrentar e passar por tudo isso. Eu sabia que no fim uma de nós teria o coração despedaçado.
Descemos do avião e sua mão tomou a minha. Me assustei com o gesto, mais me deixei segui-la sem contestar. Ao descer as escadas rolantes do aeroporto, senti uma vertigem ao identificar Letícia me esperando. Ela vestia a minha jaqueta preferida, os cabelos lisos brilhando na luz. Em suas mãos uma folha sulfite com os dizeres : meu amor.
Senti Vitoria congelar ao se dar conta dela, e recolher a mão que segurava a minha.
-Ei!
-Ei! Como você sabia que a gente ia chegar agora?
-Fui eu que comprei as passagens lembra? Quis fazer uma surpresa e vim buscar vocês. Gostou?
-Claro que sim!
-Então vem aqui me dá um abraço! Morri de saudades de você esses dias.
Senti seus braços me envolverem e fiquei sem reação. Eu tinha traído ela. Tinha amado Vitoria com todo o meu corpo. Com todas as minhas forças. Traído Letícia da pior forma possível. Não consegui pensar nela, antes de cometer a loucura de ceder à tentação. Teríamos que conversar. Tentaria me explicar sobre o que tinha acontecido e esperava que conseguir finalmente tomar uma decisão.
-Ta tudo bem? Você ta tensa.
-Só um pouco de dor de cabeça.
-Humm. Ei Vi! Como foi a viagem? Aproveitaram o Rio.
-E como menina. Foi lindo demais.
-Que bom. Vamos, preciso estar na faculdade daqui duas horas.
Ela nos deixou na porta do nosso prédio. Enquanto Vitoria subia, senti suas mãos adentrarem meus cabelos e sua boca tomar a minha. Foi estranho. Sentir a textura e o sabor diferentes. Ela percebeu que eu não correspondi .
-O que foi Ana? Isso é mais que uma dor de cabeça. Aconteceu alguma coisa?
Eu senti minha garganta se fechar. Meus olhos encheram de lagrimas.
-Sim aconteceu e a gente precisa conversar.
Os olhos castanhos me encararam e ela ficou branca.
-Aconteceu?
-O que?
-Não se faz de sonsa Ana. Você e ela! Aconteceu?
-Sim.
-Sai do carro.
-Não Le, a gente precisa conversar.
-Não tem conversa Ana! Sai! Eu preciso esfriar a cabeça.
Desci do carro com as pernas bambas. Não sabia se subia para o apartamento, ou se saia correndo sem rumo. Eu tinha machucado ela, meu amor tinha machucado ela. Respirei fundo e subi. Abri a porta de casa e as malas de Vitoria estavam jogadas em um canto. Ouvi o barulho do chuveiro e sua voz cantando uma musica qualquer.
Procurei meu celular dentro da bolsa e liguei para a única pessoa que iria saber o que fazer.
-Sis!
-Eita, você me ligando a essa hora boa coisa não é! O que aconteceu.- Contei de forma resumida a historia e esperei a bronca que ia levar. Barbara respirou fundo antes de começar a falar.
-Olha Ana o que você fez foi errado. Letícia não merecia o que aconteceu. Como você mesma disse foi uma traição e você tem que contar a historia toda para ela e pedir perdão, por que você errou.Mais ao mesmo tempo eu te entendo. Vocês duas juntas ali deve ter sido difícil resistir.
-Não foi só resistir. Eu esperei muito tempo para isso acontecer. E quando ela mostrou que também queria..eu só deixei acontecer.
-Tá na hora de você tomar uma decisão. De quem você quer na sua vida.
-Você não entende Bá. Vitoria sempre vai estar na minha vida. Seja no duo, ou nas musicas que eu escrevi para ela. Sempre. Mais eu não quero perder a Letícia. Ela é importante para mim.
-Mais como ela é importante Ana? Como mulher, como amiga? Ao nível de Vitoria?
-Acho que eu nunca vou amar alguém como eu amo a Vi. Mais ao mesmo tempo eu também to apaixonada pela Letícia. Não é só amizade, mais também não posso comparar com o que eu sinto pela Vitoria.
-Então Ana é a sua hora de agir.
Ouvi o chuveiro sendo desligado e a porta do Box abrindo.
-Tenho que desligar sis, Vi ta saindo do banho e acho que eu preciso primeiro conversar com ela.
-Ok. Mais quero saber de tudo ouviu? Se você não me ligar em duas horas eu chamo os bombeiros.
-Engraçadinha. Te amo sis.
-Apesar de tudo Ana, eu também te amo.
Desliguei o celular e olhei as malas jogadas no chão. Me sentia sufocada, triste e perdida. Esperava que essa conversa não acabasse com tudo que a gente tinha construído juntas.
-Ei ouvi sua voz no telefone- Ela caminhou em direção as malas jogadas, a toalha envolvendo o corpo e os cabelos molhados roçando seus braços. Ela se abaixou retirando uma calcinha da mala e descartou a toalha no chão enquanto a vestia. Senti meu corpo tremer, ao ver o corpo nu ainda úmido de água.
-Tava falando com a Barbara. –Minha voz mal saiu.
-A sim.
-Vi, a gente precisa conversar.
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Depois de Você
FanficFreud dizia que Nós nunca somos tão desamparadamente infelizes como quando perdemos um amor. Eu podia dizer mais. Perder Vitoria foi como ser queimada viva. Era como ser engolfada pelo mar. Mal conseguia respirar , nunca senti tamanha dor na vida...