Anjo da Guarda
Melissa:
Você já dormiu durante uma longa viagem? De imediato, senti que finalmente havia chegado ao meu destino. Cheguei adiantada, antes das lembranças. Devo ter pegado um atalho. O som de um aparelho hospitalar me deixou confusa. Podia ouvir com clareza meu coração pulsar, enquanto minha alma parecia desesperadamente querer escapar.
Reconheci a voz de Clara que me trouxe de volta à realidade com a mesma doçura e a simplicidade de quem abre uma porta e deseja boas-vindas, mas ao mesmo tempo, as palavras soaram como um grande alívio.
— Deus Seja Louvado!
Os sentidos voltaram devagar. Era como se cada um deles precisasse ser acionado por um estímulo. Depois de ouvir o timbre familiar de Ana Clara oscilando com o barulho do aparelho capaz de mapear os meus batimentos, senti que estava desperta. Naquele instante, uma orquestra acabara de quebrar o silêncio no ambiente.
A sinfonia específica parecia ter desencadeado o funcionamento de meus sinais vitais, como se todos os botões de uma máquina perfeita fossem acionados de uma única vez. Era a vida correndo veloz pelas minhas veias, se manifestando furiosamente em cada célula e ocupando todo o espaço naquela sala, cada vez que expirava.
Lá de cima, de algum lugar mais alto, o foco de luz em minha direção ocupava completamente o meu campo de visão. A claridade agrediu as janelas da minha alma que se abriram gradativamente depois de terem permanecidas fechadas durante o período de tempo em que estive longe. Em algum lugar o qual desconheço. Aquela viagem ou "sonho", como gosto de chamar tal experiência, teve a duração de horas, talvez. Isto fez com que aquele foco de luz parecesse tão forte e intenso como o sol do meio dia atrás da cortina, sob meus olhos semicerrados.
— Ela vai ficar bem irmã. Fique tranquila. – Um ser vestido de branco, dono de um semblante nobre se manifestou, descansando a mão direita sobre a sarja que cobria o ombro de Ana Clara.
— Graças a Deus! — Clara desfez o semblante de preocupação e toda a aflição que sentia, agora dá espaço a um sentimento de gratidão.
— Tudo que irmã Melissa precisa para se recuperar completamente é repousar. Ela ainda está sob o efeito de remédios, para o alívio das dores. Você pode ficar se quiser, mas ela provavelmente dormirá por algumas horas. Está sob observação, logo após o resultado dos exames, se correr tudo bem, ganhará alta.
— Eu ficarei aqui e guardarei seu sono, caso não haja objeções. Prometi que não a deixaria sozinha. Preciso rezar por ela.
__Como quiser irmã... Clara?! Espero que esta poltrona esteja confortável. É o melhor que temos aqui. Vou providenciar um travesseiro e um cobertor para melhor acolhê-la.
— Obrigada por se preocupar! Deus te abençoe! Mas não se incomode comigo, por favor! Estou bem! Se não se importar, vou me ajoelhar aqui e rezar.
— Fique à vontade, irmã.
Eu pude ouvir o que eles disseram, mas não encontrei forças para falar. Devo ter sido anestesiada. Ao me pegar consciente, antes de cair no sono, dei por conta de estar cercada por paredes claras em uma sala iluminada, onde seres de vestes brancas passeavam para lá e para cá, fazendo o bem e ao meu lado, havia também um anjo da guarda. Me refiro a Ana Clara, que não me abandonou por um segundo se quer. Enquanto segurava minha mão e rezava, me senti no céu. Logo imaginei estar deitada sobre uma nuvem.
Se conseguisse falar naquele instante, eu agradeceria a Clara, que em cada pequeno gesto e palavra que proferia, estava me ensinando o verdadeiro significado de amizade, compaixão e amor pelo próximo. Ela era a lição viva. A prática a ser copiada. O exemplo a ser seguido e admirado. Então percebi que não estava sozinha. Mas anjos sem asas também cansam e sentem fome. Ela deveria estar exausta. Gostaria que retornasse para o convento, para assim poder tomar um banho, comer alguma coisa e descansar. Creio que não sou a única pessoa carente de cuidados. Mas antes que pudesse vencer a fraqueza que sentia e me manter acordada, peguei no sono mais uma vez.
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O Som da Solidão {EM HIATO}
Fiction généraleMelissa era seu primeiro nome, para brindar a geração de mulheres de sua família com mais uma flor. Aparecida era o segundo, para glorificar a Nossa Senhora. Criada pela mãe e pela avó, Melissa desconhecia a paternidade e de todas as lições que apre...