8.Malditos nudes

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Eu sei que depois do primeiro beijo nada romântico com direito a pegada na bunda, você deve estar pensando que o Rafael é história passada. Mas não é. Estou com vergonha de contar sobre essa fase da minha vida, mas eu não estou aqui para enfeitar minha adolescência, então vou jogar tudo no ventilador.

Rafael era muito bonito, ele sabia disso, as meninas do colégio sabiam disso, eu sabia também. Mas quando ele me mandava mensagens, eu sentia que era a única que chamava sua atenção. Ele conhecia os truques de como me conquistar, cada conversa era mais pessoal e envolvente, eu estava apaixonada e pensei que ele também estava se apaixonando por mim.

Morango me falava: "Amiga, você sabe que homens são safados, Rafael não é diferente." Mas eu pensava que uma hora ele iria ficar só comigo. Não estávamos namorando, só uns beijinhos de vez em quando, então se ele ficasse com outras eu não poderia falar nada. Eu sabia, ouvia as histórias, haviam outras meninas. Mas o que os olhos não veem (ou não querem ver) o coração (burro) não sente.

Eu ouvia muita coisa sobre os homens, principalmente sobre como os hormônios o deixavam loucos por sexo. "Os homens são assim", eu ouvia e consentia. "Eles buscam por sexo, é da natureza deles". Então como eu já estava ciente dessa verdade universal sobre o sexo masculino, eu não me importava com as investidas de Rafael, ele queria aquilo, "normal", eu pensava. Era o comportamento padrão do macho, enquanto eu me apegava ao comportamento padrão da fêmea de recusar. É... eu sei o que deve estar pensando... olha para o seu passado que você vai ver muita coisa envergonhante também.

Todos nós já ouvimos sobre o que é esperado da gente. De nós meninas, exigem a pureza; dos meninos, a putaria. Então eu não julgava Rafael (e os outros de sua idade) quando eles agiam como safados atrás das moças, procurando o máximo passar uma mão aqui ou ali, chamar para a casa vazia numa tarde qualquer, pedir um nude. Era tipicamente deles, quem poderia julgar, coitados, eram escravos de sua biologia.

Para falar a verdade, eu até gostava quando Rafael dizia que me queria, que estava louco por mim e pelo meu corpo. Eu ficava derretida "Ele me quer, ele me deseja", era minha vaidade me traindo. Assim, após alguns meses ficando com Rafael, numa das nossas conversas por whatsapp, ele me surpreendeu ao me mandar uma foto.

Primeiro foi a frase: "Olha como eu fico ao pensar em você". Depois veio a imagem, um recorte que ia do joelho a barriga, era seu corpo nu e rígido. Deixei o telefone cair no chão, morta de vergonha. Minha mãe passava pela sala bem naquele momento, pegou o celular e me devolveu, muita sorte ela não ter visto, talvez estava distraída com o meu rosto idêntico aos dos caminhantes brancos de Game of Thrones.

Aquilo me deixou agitada por muito tempo. Foi a primeira vez que vi um homem nu, pelo menos, parte dele. Ele me pediu uma foto também, disse que confiava em mim, então eu também deveria confiar nele. Claro que eu ainda não tinha percebido como era o mundo: Homem mandar nude e ser descoberto: normal, machão, nada envergonhante. Mulher descoberta por mandar um nude: vadia, piranha, dadeira.

No entanto, para mim, aquela foto dele era um símbolo de seu amor, estranho amor devo dizer, um amor de homem que é algo mais sexual, eu pensei. Demorei alguns dias para ceder ao seu pedido, após mil e uma juras de que ele nunca mostraria para ninguém. Não mandei um nude total, nunca teria coragem, mas enviei uma foto minha de calcinha e sutiã, o par mais bonito que eu tinha. Pensei que era muito esperta ao cortar a minha cabeça da foto, aparecia só o meu corpo do ombro para baixo; assim como várias campanhas publicitárias e filmes já fazem, tirando a cabeça da mulher e deixando só o que eles pensam que interessa nela: o corpo.

Estava tranquila de que, mesmo se ele mostrasse a foto, eu nunca seria descoberta. Até me senti bem em fazer aquilo, afinal, estava mais próxima de Rafael, nosso relacionamento avançava. Eu nao sabia naquela época que o nude dele foi mandado com a mesma frase de abertura para várias outras ficantes.

Alguns dias depois minha foto circulava por toda a escola, tanto meninas quanto meninos já tinham visto minha lingerie lilás. O pior, eu tinha sido descoberta após análises minuciosas de quem não tinha nada melhor para fazer. Acredite se quiser, meu cabelo descia até o ombro e um pedaço da mecha rosa que eu tinha do lado esquerdo, aparecia quando se colocava determinado zoom. Eu infelizmente era a única do colégio com aquela maldita mecha rosa.

Não adiantava negar, não adiantava pintar o cabelo, todo mundo sabia que eu e Rafael tínhamos alguma coisa e todo mundo acreditou que era eu naquela foto. Logo virei o assunto do colégio. Eu tinha a atenção de todos, o engraçado é que por muito tempo era isso o que eu buscava. Nunca pensei que ter essa atenção seria uma das coisas mais envergonhantes que eu já passei, saber que meu corpo era fundo de tela para vários celulares da minha sala.

Não podia falar para minha mãe, ainda mais que todo mundo falava que eu tinha feito sexo com Rafael por causa disso, então com certeza minha mãe pensaria o mesmo. Eu não poderia sair do colégio no meio do ano letivo, então aguentei calada aquela humilhação. Mas como dizem, poderia ser pior, então aguentei com resignação.

Você deve estar pensando que depois disso eu nunca mais falei com o Rafael, não é mesmo? Calma, não me odeie, só quem já foi uma boba apaixonada sabe como é ser feita de idiota e continuar do lado do traste. Eu acreditei nele quando me disse que um colega mexeu no celular e pegou a foto. Eu gostava dele, não me julgue. Sem falar que eu ainda acreditava naquele mito do homem safado ser a coisa mais normal do mundo. Confesso que mesmo se ele tivesse dito: "eu mandei a foto para todo mundo mesmo" eu teria achado uma desculpa para ficar ao lado dele.

Eu ainda não tinha totalmente aprendido essa lição naquela época, mas vou adiantar para vocês: a paixão nos emburrece.

Nunca fale sobre UnicórniosOnde histórias criam vida. Descubra agora