13.Eu te amo pra sempre

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Pepe estava convencido de que Morango só tentou chamar a atenção dele e dos pais, que ela não queria mesmo se matar. Dizendo ele, remédios e cortes no pulso não matavam ninguém, dizia que aquilo era besteira dela e que se ela realmente quisesse morrer, ela já teria feito. Eu estava sem tempo, filmando o final da novela, hoje percebo que fui uma idiota em ouvi-lo, eu deveria ter apoiado Morango ao invés de ter continuado com minha vida.

Morango começou a faltar muitas aulas, me lembro de visitá-la e dar conselhos quando fui levar o conteúdo que ela perdia. Como eu era idiota. Nunca diga para alguém deprimido: "Porque você não tenta se sentir melhor? Porque simplesmente não se esforça para amar a vida?". É como pedir para um gripado evitar tossir, como pedir que se esforce para não produzir muco no nariz. O nosso corpo nem sempre nos obedece, uma tristeza não vai embora quando a gente manda.

Eu pensava que tudo aquilo era por causa de Pepe, mas não era. A rejeição dele foi apenas uma cerejinha no bolo, ou a gota d'água para aquele sentimento que ela não era o suficiente para ninguém. Ela pensava que nunca seria amada, afinal, nem ela mesma se amava. Morango estava triste, fraca, muito magra e completamente deprimida. Eu só percebi isso ali, na casa dela, no seu quarto escuro e sujo.

No fim daquele dia, ela me confessou que não queria realmente morrer, só queria que toda aquela dor emocional fosse embora. Eu não sabia que ela estava daquele jeito por muito tempo, para mim aquilo era novo, recente, mas ela confessou que passou anos sofrendo, se cortando, evitando comer porque assim a dor no estômago disfarçava a dor na sua alma. Pela primeira vez ela se abriu para mim e foi honesta com os demônios que viviam dentro dela.

Eu queria muito voltar no tempo até aquele dia, abraçar minha amiga e dizer para ela que eu sempre estaria do seu lado, que eu pegaria todo meu dinheiro e viajaria com ela pelo mundo, até ela ver que há muitas coisas bonitas nesse planeta para ser visto antes de morrer. Queria muito voltar naquele dia e dizer para a minha amiga que ela era linda, inteligente e especial. Queria muito dar meu colo para que ela chorasse sem medo de parecer fraca ao invés de mandar ela ser forte. Eu queria lhe dar muito mais do que aquelas frases que lhe dei sobre pedir ajuda para deus. Deuses, anjos, fadas, papai noel e unicórnios não nos respondem em momentos de angústia, era para mim ter feito esse papel. Queria que eu pudesse ser o alívio que ela procurava ao invés de sair por aquela porta tentando me livrar de toda aquela energia negativa que sentia vindo dela. Eu fui egoísta.

Dois dias depois estive em seu velório, no mesmo dia que o último episódio da minha novela passava na televisão. Eu estava devastada, me sentia culpada por não ter feito o meu melhor para tentar ajudá-la. Eu não esperava aquilo, para mim os problemas de Morango começaram quando Pepe a rejeitou, mas vinha muito antes disso. Eu era sua melhor amiga, porra. Aonde eu estava com a cabeça que não tinha visto aquilo chegar aonde chegou?

Dizem que somente os fracos se matam, mas vejo diferente. É preciso muita força para tirar a própria vida, é preciso estar muito comprometido em se livrar da dor e da angústia para fazer algo tão extremo. Não falem que os suicidas são fracos, eles não são, eles são vítimas como qualquer outro ser assassinado, eles são vítimas de sua própria biologia e da sociedade doente que alimenta todo tipo de distorção de nós mesmos.

É doloroso passar por coisas assim, mas não importa a situação, sempre podemos aprender alguma coisa. Aprendi que a vida é muito frágil e que a morte nunca fracassa, ela vem, seja por nossa escolha ou pelo destino. Por isso nunca podemos nos despedir de alguém que amamos sem deixar claro nosso amor por eles, pode ser a última vez que os vejamos.


Sofrimento é passageiro, mas desistir é para sempre. Be strong!

Nunca fale sobre UnicórniosOnde histórias criam vida. Descubra agora