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A fila de pessoas esperando para olhar o corpo vazio serpenteia para fora da igreja e dos degraus até a calçada. Acordes sombrios do órgão deslizam pela noite, transformando nossos sapatos em blocos de concreto e puxando nossos rostos para baixo até que nós parecemos com árvores dependuradas com folhas pretas.

Todos estivemos aqui antes. Na quinta série foi Jimmy Myers, leucemia. Na oitava, Madison Ellerson e seus pais morreram em um engavetamento de trinta carros durante uma nevasca. No ano passado, foi um garoto da equipe de tênis, o que fez o estadual. Não afivelou seu cinto de segurança, não tinha airbags. Quando seu carro bateu num caminhão, ele foi lançado através do para brisas em um arco perfeito até que ele aterrissou, emaranhado e lanceado, nos braços de um pinheiro. A fila para seu velório virou o quarteirão.

Andando pela porta da frente, eu sou atingida pelo zumbido de pessoas falando, mas tentando não serem ouvidas. Pais desabotoam seus casacos e desajeitadamente os colocam sobre os braços. Suor borbulha nas bochechas dos garotos, apoiados nas paredes com suas mãos em seus bolsos e suas gravatas afrouxadas. Garotas cambaleiam em seus saltos altos e agradecem a Deus por não serem elas no caixão à frente.

Tiro meu casaco, o fecho aberto. Pela primeira vez na semana, estou quase quente. Velas de plástico com lâmpadas laranja tremeluzem junto às janelas escuras.

A fila se move em um ritmo constante, como se estivéssemos na apresentação de um concerto ou num jogo de futebol. Quando o time de futebol caminha até o caixão, a capitã entrega uma bola assinada por todas as garotas ao pai de Cassie. Ele a entrega para um homem de preto que coloca o oferecimento junto ao cadáver, gentilmente, assim ela não acordará.

Chama-se velório, mas ninguém realmente quer ver o morto levantar.

Quanto mais perto do caixão eu chego, mais quente fica. Pétalas de crisântemos amarronzadas caem ruidosamente das coroas de flores que estavam empoleiradas em suportes de metal. Estou murchando também, e minha cabeça está se enchendo com pregos enferrujados. Eu não deveria estar de jeans desgastados. Idiota.

Há uma fenda entre mim e o cara a minha frente, um espaço grande o suficiente para quatro pessoas. Uma mulher atrás de mim, sibila — Mova – se.

De repente, a organista para de tocar. As pessoas param em um meio murmúrio. A organista pega algo sobre ela e uma pilha de livros cai no chão, ecoando através do mármore como um tiro. Pessoas pulam.

Eu consigo ver a parte inferior do caixão agora. A bola de futebol repousa ao lado de uma blusa preta dobrada da equipe de teatro. Os pés de Cassie estão escondidos sob um lençol de veludo branco, as pontas dos dedos esticadas para cima. Espero que coloquem chinelos quentes nela, e meias confortáveis. Espero que deixem seu anel de dedo.

A música começa novamente, um longo, um trêmulo acorde menor.

O cara a minha frente caminha até os pais de Cassie. A mãe dela soluça e ele coloca seus braços em torno dela. Ele é um tio, o divertido, o que nos ensinou esqui aquático. Ele está chorando, gemendo, também. Eles são as duas únicas pessoas nesta igreja quente, lotada, pétala morta fortes o bastante para dizer e fazer o que estão pensando.

Minha vez de olhar. Minha vez de violar a morta.

A Bela Adormecida está vestindo um vestido azul celeste com gola alta e mangas compridas. Seu cabelo parece como uma peruca bem escovada de bonecas, amarelo cansado com desbotadas luzes vermelhas chegando ao fim. Ela não está usando nenhum brinco ou seu colar de sino prata, mas seu anel de turma estava empurrado em seu dedo. O piercing no nariz e as cicatrizes de acne estão escondidas sob uma base passada em sua pele. Usaram o tom errado de pálido.

Eu quero tirar seu vestido e ver se abriram a barriga dela. Eu quero olhar para dentro. Ela poderia, também, porque sempre falamos sobre isso, as criaturas escondidas com inquietas asas e antenas que nos cutucava e nos enviava tropeçando para o banheiro, Cassie ia até a privada assim ela poderia se livrar de tudo, e eu ao espelho assim a garota no outro lado me manteria forte e com nervos de aço.

Deveriam ter colocado sua agulha de crochê na caixa ao lado dela, e fios assim ela teria algo para fazer na Eternidade. Um pouco de Gaiman, Tolkien, Butler, e alguns tabloides, menta – hortelã, não gaultéria – suas faixas de natação e insígnias da Girl Scout, os cartazes das peças nas quais ela esteve. Aposto que ela gostaria de uma caixa de cereal para comer, também: comida confortável para a viagem.

A mãe dela soluça mais alto que o órgão.

Coloco a mão no bolso da minha jaqueta e puxo o pequeno disco de ver-vidro verde, nascida no coração de um vulcão, capaz de prever o futuro. Eu a roubei do quarto de Cassie quando tínhamos nove anos, mas nunca a fiz funcionar, não importava o quanto as estrelas estavam alinhadas.

Eu deslizo o vidro mágico para a mão congelada dela.

Os dedos de Cassie a enrolam.

Meu coração gagueja.

Ela aperta o disco verde com força, e então pisca – uma, duas vezes – abre seus olhos arregaladamente, e olha diretamente para mim. Ela a levanta e toca o cabelo. Eles saem de sua cabeça como um ninho de dentes-de-leão. Alguns fios flutuam até as velas de verdade queimando o topo da caixa. Eles se inflamam como faíscas.

Eu não consigo respirar.

Cassie se senta lentamente. Ela segura o vidro mágico no seu olho azul, olha através e ri, um baixo, som sujo que apenas sai as duas ou três horas da manhã. Ela põe o vidro na boca e o engole, em seguida, limpa a boca com a mão, manchando os dedos com cera e sangue.

Ela franze a testa e abre a boca – não. Ela não está sentada lá. Ela nem está lá. Não há sangue, nem nuvem de cabelo de boneca queimando na chama da vela.

Eu pisco. Ela desapareceu do caixão. A bola de futebol rola para trás. Os pés dela não estão lá para apoiála. Eu pisco. para o lado como se ela não tivesse ouvido o alarme soar e agora estivesse realmente atrasada e seu pai iria pegar o carro novamente e ela teria que dirigir comigo, e isso é um pouco assustador.

Ela ainda está desaparecida, o lençol de veludo branco jogado para o lado como se ela não tivesse ouvido o alarme soar e agora estivesse realmente atrasada e seu pai iria pegar o carro novamente e ela teria que dirigir comigo, e isso é um pouco assustador.

A música do órgão derrama e inunda a igreja.

A fila atrás de mim murmura. As pessoas tem lugares para ir e coisas para fazerem e novos episódios irão ao ar em meia hora, e além disso, todos são muito educados para perceberem que o caixão está vazio. O tio divertido está abotoando seu casaco. O espaço na frente dos pais de Cassie espera por mim.

Uma mão toca meu ombro e um garoto sussurra em meu ouvido: —Tá tudo bem. Vá em frente. Estou bem atrás de você.

Eu tropeço, em seguida, me arrasto, olhos para baixo, sobre a mãe dela. A Sra. Parrish envolve seus braços ao meu redor sem uma palavra e deita a cabeça em meu ombro. Eu a acaricio nas costas. O Sr. Parrish aperta a mão do garoto atrás de mim e diz algo que eu não consigo entender por que a mãe de Cassie é tão pesada que está me arrastando sob a água profunda em harmonia no santuário e para baixo através do chão de mármore. Ela quer nos afundar sob o subsolo para a formigante quente sujeira, onde Cassie tem um cômodo esperando, então nós três poderíamos nos enrolar em bolas de bichos e esperar a primavera.

A mão me toca outra vez. O Sr. Parrish puxa – nos para fora do chão e desgruda sua esposa de mim. Ele beija fortemente minha testa, mas não consegue achar nada para dizer.

— Estamos tão pesarosos por sua perda, — diz o maquiado cara Elijah com uma mão segurando a minha. — Palavras não são suficientes.

Ele me puxa pela maré que se movimenta até a porta. Eu tropeço, e ele agarra meu braço para me impedir de cair.

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Obs: Onde tiver essa marcação ["----"] em negrito significa que a personagem esta apenas pensando e não falando.

A garota de vidroOnde histórias criam vida. Descubra agora