XIII

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XIII
VICTÓRIA


A cidade estava um caos, a onda de poeira trouxe consigo muito mais que pó, veio junto o desespero e fez aflorar inúmeras doenças na população, os prontos socorros estavam lotados. Victória estava nervosa, tinha a leve sensação de já ter lido algo referente a isso. Na verdade tinha certeza que já lera algo, mas o que mais a deixava confusa era o fato de estarem no sul de um país que não se tinha relatos de tempestade de areia. Afinal de contas, eles não estavam no deserto, não é mesmo? Pelo que ela sabia, elas começavam gradativamente e não de uma hora para a outra como tinha ocorrido hoje.
Victória pega seu celular no bolso e digita uma mensagem para Alice:

Hey, pode vim aqui em casa, tenho a sensação de que já vi algo sobre isso, sei lá, é muito confuso.
-V

Precisava se acalmar, sabia disso, e também tinha certeza que um chá não resolveria nada. Estava preocupada com Erick que até agora não tinha vindo para casa e nem ligado, se dirigiu para a cozinha e abriu uma garrafa de vinho. Assim que bebeu o primeiro gole a campainha toca e ela sai correndo e tropeçando nos móveis e abre a porta depressa, pois a poeira ainda não tinha passado. Era Alice.
—Tava no meio do caminho? — pergunta tentando disfarçar o nervosismo.
— Na verdade, sim. — ela tira o casaco que estava completamente sujo agora e joga no chão. — a cidade esta em pânico e eu não queria ficar sozinha em casa. Tia Regina foi até o café e tio Marcos está no hospital, ele me ligou querendo saber se eu estava bem, e a Analu esta segura na casa de uma amiga.
— Eu sei, tô entrando em desespero porque o Erick não atende minhas ligações e até agora não chegou em casa.
— Hey, o Erick sabe se virar, ele provavelmente está dentro dos galpões do vinhedo. Ele vai ficar bem, Vick. — dizendo isso ela segue até o banheiro para lavar o rosto.
Bebendo mais um pouco de vinho Victória dá um pulo da cadeira dizendo:
— Eu sabia que já tinha visto isso!
— Isso? A poeira? Não é alguma praga bíblica? Ouvi umas velhas senhoras falando sobre isso ainda pouco, na rua.
— Não, não, lá é chuva de gafanhotos que se cai sobre o faraó. — ela está subindo as escadas até seu quarto. — Lice, eu não fui realmente sincera com você, você falou sobre um grimório não foi?
— Sim, mas o que isso tem a ver com o que ta acontecendo aqui? Não tô entendendo. — responde confusa ao acompanhar a amiga.
— Olha, desculpa, mas tenho um grimório. É estranho sei, e sim, fiquei mexida quando você falou do sonho e de tudo aquilo, foi muita informação! — ela para subitamente de procurar o pequeno livro no meio das suas coisas e se volta para a Alice. — Eu tenho um grimório, ganhei da minha mãe, eu… eu meio que sou… uma bruxa. É esquisito eu falar isso, sei… — Foi interrompida.
— Vick, eu sou, sei lá, uma espécie de vidente. — Alice disse e levou as mãos ao alto. — Eu só não entendo por quê você não me contou antes.
Victória parou com os olhos arregalados e tomou mais um longo gole do vinho.
— Não sei, talvez seja porque nem eu mesmo quero me aceitar, mas ultimamente tenho meio que treinado. Desculpa não ter contado antes.
— Tudo bem, mas do que você tava falando?
— Ah sim! Sobre a poeira, eu já li sobre ela. — ela se vira e abre a terceira gaveta pegando o livro bem velho. — Ou foi algo parecido. O grimório contém feitiços, ingredientes e tudo mais, mas também tem algumas histórias, tipo lendas, como o folclore brasileiro. São partes cheias de histórinhas, como um livro de contos de família e tem uma referente a isso. Olha!
Ela entrega o livro aberto e aponta para o trecho que lhes interessava, Alice leu prendendo a respiração.
— Foi exatamente o que aconteceu, uma onda de poeira repentina.
— Exatamente, mas aqui diz que é um feitiço para proteção dos sobrenaturais, para se protegerem dos humanos, das caçadas frequentes.
— Não faz sentido, quem estaria caçando sobrenaturais em uma cidade tão pacata quanto Alcântara? — indaga Alice.
— Eu sei, é meio estranho, vamos lá para baixo, tenho uma garrafa de vinho que não vai se secar sozinha. Vamos tentar pesquisar sobre isso.
— Com essa poeira toda as redes de ‘internet’ devem estar péssimas.
— Verdade, mas podemos tentar. Vou mandar uma mensagem para a Kat, não sei se ela está sozinha, mas se tiver é bom nós irmos até lá.
— Ou ela vir para cá, é você que está sem ninguém em casa, vamos ficar aqui com você.
— Verdade, vou chamar ela até aqui e pedir que traga o grimório dela.
— Espera! Ela também tem um?
— Sim e eu não devia ter falado, mas isso tudo — aponta para a janela — está me deixando apavorada.
— Vick, todos esses grimórios são livros velhos?
— Mais ou menos, eles são heranças de família, e vem sendo repassados a gerações, então provavelmente são bem velhos. — ela pega o celular no balcão e digita a mensagem para a prima.
— Eu acho que já vi um desses... na minha casa. Eu nunca dei muita atenção pra ele, sei lá, nunca me atraiu, mas depois da briga com meu pai, ele mandou algumas coisas até aqui e eu acho que esse livro veio junto.
— Três grimórios? Será que neles também tem algo falando desse fenômeno? Poderia ser algum tipo de feitiço? No meu não tem nada falando, mas pode ter no de vocês.
Alice desceu até a sala e sentou no sofá de visitas.
— Eu não entendo… — Ela disse enquanto se servia de uma taça mas invés de vinho escolheu suco de uva, em amor a pequena Lorena. — Por que nunca me contaram sobre vocês?
Victória deu de ombros e sentou em frente a amiga também se servido de uma taça, mas de vinho.
— Não posso falar sobre a Kat, mas com certeza para mim nunca foi tão levado à sério. Acho que só agora eu tô começando a realmente acreditar em tudo isso, e mesmo assim ainda me sinto um pouco louca por isso.
— Um brinde à loucura.
Elas ergueram as taças e brindaram. Ambas beberam o liquido vermelho e depois se encararam em um silêncio carregado de tensão.
— Não é engraçado? — Victória foi a que falou primeiro.
— O quê? — Alice sentia realmente a tensão de todo o clima.
— Nós… — Vicky parecia estar com dificuldades para prosseguir. De repente o vinho pareceu não se assentar tão bem em seu estômago.
— Vicky… — Alice começou.
—  Não, eu estou bem. De verdade, Lice. — Ela engoliu o nó que se formava em sua garganta. — Mas nós estamos aqui, sentadas e falando de coisas que qualquer pessoa normal diria que é impossível com uma naturalidade absurda, e lá fora algo ainda mais absurdo aconteceu. Tem centenas de pessoas doentes, céus! Areia… areia aqui?
Um soluço mal contido escapou da garganta de Victória.
— E olha que absurdo, eu estou aqui sentada me sentido de certa forma despreocupada tomando meu bom vinho, enquanto meu irmão está lá no meio de tudo isso. — Nesse ponto ela já chorava. — E eu nem ao menos sei se ele está bem, onde ele está?
Alice pulou do seu sofá até a amiga e abraçou ela.
— Ele está bem, Vicky. Você sabe como ele é, jamais sairia de lá antes de ajudar o máximo de pessoas possíveis.
Vicky ainda chorava em seus braços.
— Você tem noção de como me deixou ainda pior com isso?
Elas se entreolharam. Alice soltou uma pequena risada mal reprimida. Vicky afastou dos braços da amiga com uma expressão de surpresa.
— Vinelly! — Ela exclamou mal contendo a própria risada. — Não posso acreditar no quão insensível você é!
— Me desculpe, Vicky! Eu não posso evitar, quer dizer… eu achei que morreria no meio de toda aquela poeira.
O riso se dissipou com as palavras de Alice e elas encararam o livro antigo na mesa de centro ao lado da garrafa de vinho.
— Você acha que isso é real? — Victória perguntou.
— Acredito nisso com todas as minhas forças. Tem alguma coisa muito errada acontecendo, Vicky…
— E somos nós que temos às respostas?
Mais um longo minuto de silêncio tenso.
— Acho que estamos no meio de algo impossível mas incrivelmente possível segundo seu livro. Talvez esteja aí as respostas para tudo o que aconteceu hoje e só talvez nós possamos ajudar do nosso jeito, inexplicável talvez, mas que só nós poderíamos entender.
Victória suspirou nervosa. Buscou o celular e procurou nas conversas. Primeiro uma mensagem para as amigas. Ela digitou rapidamente:
Estão todas bem? Por favor, nos deem notícias. Alice e eu estamos nervosas.
#SuKaTA
Deu um pequeno sorriso para o código que elas haviam inventado para o grupo. Alice viu a mensagem chegar em seu celular e sorriu nervosa de volta.
Vicky olhou mais uma vez para o celular e digitou uma segunda mensagem:
Ri, você está bem?
-V
Sabia que Alice suspeitava para quem ela enviava a mensagem. Suspirou e deletou toda a mensagem, no lugar digitou uma para o irmão.
Não me mate dos nervos. Se você está vivo e preza pela vida da sua irmã mais nova, por favor, me dê notícias.
-Vicky
Olhou para Alice sentada no sofá olhando fixamente o nada tentando não manter contato visual com Vicky e soube, ela também pensava se Ricardo estava bem. Suspirou.
— Eu tenho certeza que todos estão bem, Lice.
A garota sorriu de volta com o canto dos lábios e Victória sabia que ela entendia o que ela quis realmente dizer. Aproveitou para fazer um promessa, iria saber de notícias do seu amigo depois. Por enquanto focaria nas respostas que buscava. O celular vibrou ao seu lado e um alívio tomou conta do seu coração, era uma mensagem do seu irmão e dizia:
Eu estou bem. Muito ocupado com tudo. Não me mate você de preocupações, venho revirando essa multidão toda procurando saber de você. Eu poderia dizer que estou magoado por sua falta de sensibilidade em vir ajudar os que precisam aqui, mas estou mortalmente feliz por saber que você está em casa segura. Você está em casa, não é?
Ela sorriu e digitou um:
Sim, estou em casa.
A resposta a seguir foi mais curta e dizia que ele não tinha tempo para uma conversa.
Continue aí, está um caos nas ruas. Encontrei a Suzana ainda pouco, Kat também, vou mandar às duas até nossa casa. Melhor do que ficarem andando pelas ruas no caos que está essa cidade hoje. Volto mais tarde.
- E
Um alívio tomou conta dela. Só mesmo o irmão para ficar ajudando em meio ao caos no lugar de voltar para a segurança de casa, mas sabia que ele ficaria bem por hoje. Eles estavam seguros, ou ela imaginava estar.

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Eu ouvi sinos? Siim! Conseguimos postar um capítulo pontualmente! Comemorem essa realização com nós três deixando sua estrela no capítulo. Obrigada por chegar até aqui.
Essas serão notas breves mas cheias de amores. Nosso capítulo de hoje, eu diria que é um dos mais importantes na nossa trama e não muito mais adiante vocês entenderão o por quê. Não é um capítulo cheio de tensões mas diz muito sobre nossos personagens e sobre o caráter deles e as emoções conflitantes que eles carregam. No fim como toda a nossa história, tem muito em partes que vocês precisam entender sobre os nossos bebês, ou como diria a Vicky, nosso grupinho SuKaTA.
Aproveitem muito esse capítulo, estaremos na espera das considerações nos comentários.
Um grande beijo, docinhos..
E até semana que vem,
#Gelalu

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