Quando Loki acordou no dia seguinte, assustou-se com a fogueira a poucos metros de si. O fogo era algo que ainda o apavorava vez ou outra, por mais que precisasse dele em sua vida nômade, ainda assim sempre sentia uma dor em seu âmago. O trauma era latente mesmo depois de tantos anos.
Imaginando que Friedrich ainda não estivesse pronto para seguir viagem, levantou-se com calma, sentindo o ar fresco da manhã em seu rosto sonolento. Era uma manhã silenciosa e nublada, nem os pássaros ousavam cantar.
– Peguei emprestada uma navalha que encontrei em suas coisas, espero que não se importe. – Foi como Friedrich iniciou aquela manhã, fazendo com que Loki se surpreendesse ao ver a nova aparência do outro. Seus fios loiros haviam desaparecido por completo, deixando a cabeça completamente raspada, com alguns cortes aqui e ali provocados pela lâmina sem fio.
– Nova tendência entre os monges? – Perguntou com um riso abafado, sendo respondido com um meio sorriso do outro que tinha consciência que não tinha ficado muito bom.
– Cortamos o cabelo daquela forma para nos diferenciarmos. Mas agora não preciso mais disso. – Explicou fechando o cenho, ficando com o olhar perdido, como se pensasse em algo que gostaria de esquecer. Era óbvio para Loki, observador como sempre, perceber que, seja lá o que tinha feito, Friedrich andar sozinho pela floresta não era algo bom. Por isso tratou de desviar do assunto.
– Melhor que sua família consiga te reconhecer assim. – Comentou e pode ver o esboço de um sorriso surgindo de Friedrich, o que o alegrou de certa forma.
– Mesmo com a cabeça de um frade eu tenho minhas dúvidas se conseguiriam saber ao certo que sou eu, não os vejo fazem mais de dez anos. Entrei no mosteiro aos quinze, desde então nunca mais os revi. – Friedrich contou com um olhar nostálgico no rosto, era latente sua ansiedade para rever seus entes queridos.
– Tenho certeza que irão te receber de braços abertos.
– Espero que sim. – Friedrich jogou um pedaço de graveto na fogueira, fazendo as chamas crepitarem com mais intensidade. Loki olhou para o fogo por vários segundos, quase que hipnotizado. – Alguma sorte com a caça?
– Sequer os ossos. – Bufou descontente ao lembrar-se da armadilha vazia em todas as vezes que foi checá-la.
– Talvez possamos encontrar algo melhor quando chegarmos à vila, não é uma boa época, mas sempre se consegue alguma coisa por uns florins ou pence. – Comentou começando a se levantar, com dificuldade, apoiando-se em um tronco até que se sentisse firme o suficiente para permanecer em pé. – Alguma previsão de partida?
– Não com você neste estado. – Loki o repreendeu, se levantando na hora para ajudá-lo a se por em pé, mas assim que chegou Friedrich já parecia estável, quase podendo enganar quem o visse.
– Posso andar, ademais terei tempo para me recuperar quando estiver em casa. Não falta muito e quanto antes chegarmos será melhor para ambos. – Tentou se explicar, mas tudo o que recebeu foi um olhar de censura do druida, os olhos verdes parecendo ficar mais escuros por conta de seu humor. Friedrich sentiu um arrepio subir por sua espinha, pois para ele aquele homem estava com a face do diabo. – Tudo o que mais anseio agora é voltar para casa, não sei como poderei me sentir melhor sem isso.
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Ode aos desafortunados
Historical FictionDISPONÍVEL AGORA NO AMAZON KINDLE VENCEDOR DO WATTYS 2020 na categoria Ficção Histórica. Um andarilho pagão luta diariamente para sobreviver na Inglaterra do século XIV. Vivendo como um curandeiro e sempre escapando dos olhos do clero, nem mesmo as...