Loki andava pela estrada de pedra de maneira contente, quase saltitando feito uma criança. Segurava na mão um punhado de moedas, dois florins de cobre e um de prata, chacoalhando e fazendo com que tilintassem conforme se movimentava. Havia sido um bom dia de trabalho, sem calote, perseguição morte ou peste, angariando assim mais alguns dias de sustento. Seria uma verdadeira benção se todos seus dias fossem daquela forma, porém, como não eram, apenas lhe restava aproveitar aquele breve pedaço de alívio e felicidade.
Que por vezes ele dava uma de tolo realmente era verdade, mas não significava que era totalmente estúpido. Alguém aparentando alegria com dinheiro na mão era um grande alvo de assalto, enquanto andava em meio às choupanas. Por isso ao perceber certos olhares em sua direção, tratou logo de meter as moedas na pequena bolsa amarrada em seu cinto, além de fazer a maior cara de cansado e mau humorado que podia. Era melhor deixar a alegria apenas em seu interior.
Assim percorreu o restante do caminho, afastando-se cada vez mais do aglomerado de casebres que começavam a se dispersarem pela paisagem, dando uma melhor visão dos campos de trigo e das ovelhas que pastavam tranquilamente nas colinas verdejantes. Dirigia-se para o local onde haviam montado acampamento, esperando encontrar Friedrich que havia permanecido para cuidar de certos pertences, além de haver assim um ponto fixo para que a clientela pudesse encontrar seus serviços. Com um indo atrás de clientes e outro esperando pelos mesmos, as chances de um dia produtivo aumentavam consideravelmente.
Foi inevitável ter acabado com aquela falsa face de ranzinza ao ver de longe a imagem de Friedrich, voltando a sorrir sem ele próprio notar a princípio. Ajeitou o cabelo rebelde para trás e bateu um pouco o pó das roupas, tentando se mostrar um pouco apresentável frente ao outro – mesmo que o companheiro já o tivesse visto em situações piores.
Friedrich não notou a aproximação do outro tão cedo, estava concentrado demais enfaixando cuidadosamente uma tala no braço de uma criança. A menina de longos cabelos negros tinha os olhos avermelhados por chorar e fungava o nariz repetidamente, olhando lacrimosa para um grande homem abaixado ao seu lado que conversava com ela durante o processo, tentando distraí-la em meio à dor e ao choque.
– Ora o que temos aqui, precisaremos de um gancho, pelo jeito? – Loki indagou com seu ar de saltimbanco, fazendo sua pessoa presente para todos.
– Não dê ouvidos ao meu amigo, está apenas sendo um bufão. – Friedrich tranquilizou os clientes antes que houvesse problemas com a petulância desavisada do companheiro. O homem que acompanhava a menina o observou com suspeita, as sobrancelhas grossas quase se unindo enquanto lhe encarava. Possuía a testa proeminente, pele machucada pelo sol e diversas rugas no rosto, o cabelo e a barba de cor escura eram desgrenhados e com alguns poucos fios grisalhos salpicados aqui e ali. Apesar da aparência divergente entre o homem e a menina, um portando uma imagem de brutalidade enquanto a outra a mais pura inocência e delicadeza, era possível notar algumas semelhanças entre seus traços.
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Ode aos desafortunados
Historical FictionDISPONÍVEL AGORA NO AMAZON KINDLE VENCEDOR DO WATTYS 2020 na categoria Ficção Histórica. Um andarilho pagão luta diariamente para sobreviver na Inglaterra do século XIV. Vivendo como um curandeiro e sempre escapando dos olhos do clero, nem mesmo as...