Ali não havia a visão das árvores para que pudessem contar-lhe o que estava prestes a acontecer, contudo, Loki soube imediatamente quando abriram a porta de sua masmorra, que havia chegado a sua hora.
Deixou que levassem-no com um guarda pegando cada um de seus braços e quase arrastando-o pelas masmorras, seus tornozelos doíam a cada passo que dava, mas ainda conseguia caminhar se mancasse bastante. Loki não queria ter parado de resistir, mas estava tão fraco e ferido que tinha consciência que havia chegado a hora de abaixar a cabeça, do contrário, acabaria apenas recebendo mais humilhação e sofrimento.
O obrigaram a ficar de joelhos, fazendo Loki pensar por um breve instante que seria para rezar ou confessar seus pecados, forçando-lhe a passar por toda aquela ladainha mais uma vez. Contudo, se surpreendeu ao ter sua barba puxada, o obrigando a olhar para cima, encarando o carrasco com a navalha em mãos. Loki engoliu em seco, sentindo o restante de sua vaidade quebrar-se por dentro, mas de toda forma, permaneceu firme, não querendo mostrar uma única expressão de abalo, por mais que aquilo doeria muito em seu interior.
De maneira rude, puxando seus fios de forma propositalmente dolorosa e passando a navalha a seco para que irritasse sua pele, rasparam toda a sua barba. Deixando assim o seu rosto liso – e com alguns cortes – como em sua triste juventude. Quando outro carrasco puxou seus cabelos para trás com força, pensou que raspariam sua cabeça também, mas no lugar só foi cortado bem rente com uma tesoura, deixando os cabelos ruivos domados pela primeira vez.
Em seguida os carrascos lhe jogaram uma trouxa de roupas, mandando que se trocasse. Sabendo que não tinha escolha, Loki começou a retirar os trapos que vestia, vendo depois de dias os resultados de seus hematomas, tão roxos e escuros que alguém mais leigo poderia até achar tratar-se da peste tomando seu corpo. Ao ver os calções e a túnica branca que lhe ofereceram, quase chegou a ter pena de profanar o tecido limpo com seu corpo imundo dos dias de cárcere.
Seus pulsos foram amarrados mais uma vez, libertados antes das correntes, mas agora estrangulados por uma corda que lhe queimava a pele. E sendo arrastado pior que um animal no cabresto, Loki se viu fora das masmorras pela primeira vez em dias, com o céu azul e límpido cegando seus olhos quando o levaram para o pátio da fortaleza dos Castel, o vento fresco batendo em seu rosto tomado pela poeira e trazendo-lhe um alívio momentâneo, que perdurou somente até o último puxão para obriga-lo a andar.
Ao abrir os olhos por fim, acostumando-se a luz do sol, Loki olhou atônito para suas laterais, formadas por uma muralha de cavaleiros que lhe cercavam. Não sabia dizer se para protegê-lo do povo ensandecido que esperava sua aparição lá fora, ou para que eles fossem protegidos dele. À sua frente, uma carroça puxada por dois cavalos de tração brancos vestindo mantos carmim o esperava.
Loki não esperou que lhe puxassem feito uma besta fera, de queixo erguido adentrou ao veículo sem pestanejar. Sentou-se e se pôs a olhar o seu arredor, fazendo questão de estudar para as faces dos cavaleiros a lhe escoltarem que o encaravam ora com repulsa ora com temor. De forma altiva, posicionou-se de maneira mais nobre que um detentor de sangue azul seria capaz de fazer, como se estivesse no controle daquele instante e não temesse o que estava por vir.
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Ode aos desafortunados
Historical FictionDISPONÍVEL AGORA NO AMAZON KINDLE VENCEDOR DO WATTYS 2020 na categoria Ficção Histórica. Um andarilho pagão luta diariamente para sobreviver na Inglaterra do século XIV. Vivendo como um curandeiro e sempre escapando dos olhos do clero, nem mesmo as...