Loki acordou com o som de água pingando, abrindo os olhos e encontrando apenas a escuridão. Mal podia sentir os próprios braços, estando atados para cima em correntes de ferro a machucarem seus pulsos, estremecendo inteiro pelo frio daquele lugar tomado de umidade. A cabeça e o corpo doíam como se tivesse levado uma surra daquelas, onde conforme as memórias confusas passavam por sua mente, lembrava-se de como havia sido trazido de forma bruta e violenta, intensificada por sua determinação em continuar lutando. Não conseguiu.
Finalmente estou aqui. Pensou, sequer ficando impressionado com seu estado e onde se encontrava. Não era o que estava destinado? Era muita inocência sua pensar que escaparia para sempre do cárcere sendo aquele espírito rebelde de sempre.
– Rébecca? Está aí? – Uma voz sofrida soou na escuridão, junto a mais correntes tilintando uma na outra. Loki não estava sozinho, mas não conseguia dizer onde o outro homem se encontrava naquela masmorra fria.
– Não, apenas outro prisioneiro. – Loki respondeu.
– Judeu também? – O desconhecido indagou com a voz rouca e ferida.
– Não.
– Ah. – Foi a última coisa que ouviu do outro por um bom tempo.
Loki imaginava que o haviam prendido por ter atacado um oficial, era o que lembrava antes de provavelmente desmaiar com alguma pancada forte em sua cabeça, recebida depois de tanto lutar contra os soldados que tentavam contê-lo. Fora uma ideia estúpida, ele sabia disso, mas foi o que fez no desespero de proteger Friedrich. Mesmo que cada feudo e terra tivessem suas próprias leis, havia certo padrão em quase todas, com Loki não esperando uma punição que fosse além de uns dias de trabalho forçado ou umas chicotadas nas costas. Contudo, sua mente enérgica se punha a trabalhar, visto que pensar era a única coisa que conseguia fazer naquele lugar insalubre, sentindo a garganta ficar cada vez mais seca pela sede e tendo que catar pelos pingos que caiam no teto de pedra. Torcia para que não fosse o esgoto da cidade.
Se era um preso por rebeldia, deveria estar com outros rebeldes, foi o que concluiu primeiramente. Contudo, estava ao lado de um judeu. Por que de um judeu? Só poderia ser heresia. Porém, não foi por isso que havia sido preso, a não ser que descobriram algo a mais... Mas como? Havia se portado bem nos últimos tempos em meio ao povo, deixando sua verdadeira identidade para ser mostrada somente às sombras e a solidão. Dessa forma, teria mais alguém o visto fazer os rituais além de Friedrich? Loki ficou confuso, onde apesar de estar sempre amortecido pelas calamidades de sua vida, estava assustado também com o que o futuro lhe reservava naquele ambiente tão sinistro que o fazia ter a impressão de ouvir os sussurros dos fantasmas que já passaram e sofreram naquelas paredes.
Som de ferrolho e ferro pôde ser ouvido, uma chave a abrir uma grande fechadura e em seguida o ranger estridente das grades. Loki mirou para a tocha que surgiu, mesmo com os olhos sofrendo com a luz que se desacostumara, tentando interpretar o ambiente à sua volta. Paredes de pedra negra, chão enlameado de terra e dejetos, com os ratos a se esconderem pelos cantos. O cavaleiro que segurava a tocha se aproximou dele, o rosto coberto inteiramente por um elmo quadrado, armado de uma longa e afiada espada atada ao cinto que segurava o manto branco por cima da armadura...
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Ode aos desafortunados
Narrativa StoricaDISPONÍVEL AGORA NO AMAZON KINDLE VENCEDOR DO WATTYS 2020 na categoria Ficção Histórica. Um andarilho pagão luta diariamente para sobreviver na Inglaterra do século XIV. Vivendo como um curandeiro e sempre escapando dos olhos do clero, nem mesmo as...