Alma de Golem (completo)

Capítulo 12 - Sistema distópico

Para todos aqueles que apoiaram e incentivaram a minha leitura e amor por esse vasto e incrível universo dos livros

Ele nem havia acordado direito e já sentia uma dor na panturrilha esquerda. Faz uma careta de dor. Diferentemente das outras vezes em que ele acordara de um desmaio, a superfície onde se encontrava deitado era macia e confortável, como uma cama.

Wander mudou de posição e abriu os olhos lentamente, logo se viu encarando um teto branco. Olhou ao redor e constatou estar em um quarto. Desta vez arejado, ventilado e iluminado, o completo oposto do anterior. Se levantou e deu uma olhada ao redor. Nas paredes haviam estantes cheias de livros e ao lado da cama onde estava havia um criado-mudo.

Acima do móvel se encontravam uma pequena caixa de remédio com o recado: "Caso sua perna volte a doer ou infeccione. Os curativos devem ser repostos diariamente e as ataduras estão no armário da cozinha"; além de um pen drive com a inscrição: "Assista-me". Talvez aquilo fosse explicar a sua situação.

Wander o pegou e saiu do quarto. O cômodo seguinte era uma sala com um sofá virado para um rack e uma TV, e havia um balcão o separando da cozinha — fogão, geladeira, micro-ondas e armário. O garoto se lembrou da mensagem e olhou a perna esquerda, que ardia um pouco. Estava enfaixada e bem cuidada. O curativo parecia ter sido trocado naquele dia mesmo.

Quantas horas seriam? O Sol já estava alto. Wander vasculhou a sala com os olhos, mas não achou nenhum relógio. Desistiu e plugou o pen drive na televisão. Pegou o controle remoto no rack e a ligou. Para a sua surpresa, em um dos cantos estava um relógio que marcava 10:30 am.

Na tela um vídeo começou. O novo hino do Brasil passou com o brasão no fundo — o antigo fora descartado. Após, surgiu a imagem do presidente com a bandeira do Brasil esvoaçando de fundo.

— Queridos cidadãos e cidadãs... — ele iniciou seu discurso — Se estão assistindo isso, creio que estejam desnorteados em relação a tudo que está acontecendo, e estou aqui para esclarecer. Isso é o nosso plano para o caso de uma rebelião. A sua cidade foi completamente isolada do restante do mundo e nós aplicaremos um novo sistema até que todos os rebeldes sejam devidamente punidos. — "Devidamente punidos, ou seja, mortos", pensou Wander — Quando a rebelião estiver acabada, tudo voltará ao normal.

"Neste momento, — continuou — vocês devem estar se perguntando: "Mas que novo sistema é esse?" Esse novo sistema se trata de um isolamento e divisão em condomínios através de castas. Durante esse tempo em que sua cidade ficará de quarentena, você irá morar em prédios, alojamentos, junto as pessoas com a mesma classe de vocês. Por exemplo; quem tem golem de ar morará no condomínio de ar, e assim vai."

"— Isso pode parecer um pouco rigoroso, mas é tudo para a sua segurança própria e seu bem estar! Sair dos limites ou contato com pessoas de outros condomínios é estritamente proibido, e será punido com açoitamentos públicos, ou, dependendo do nível de infração, com a execução! Friso novamente: Isto é para o seu bem. Qualquer dúvida quanto as regras, basta procurar o soldado mais próximo."

"— Por fim, para encerrar, o toque de recolher é às dezoito horas, e não será permitido ninguém fora do apartamento depois desse horário ou será açoitado publicamente no dia seguinte. Outra proibição é a de menores de dezoito anos visitarem o apartamento de qualquer um do gênero oposto. Quanto às tarefas diárias, as aulas voltaram normalmente e os trabalhos serão designados a você. Fora isso, estão livres para fazer tudo oque quiserem"

O hino passa novamente, com o brasão de fundo e a tela escurece. Wander já levantava o controle para desligar a televisão quando uma imagem apareceu na tela. Se tratava de um mapa da cidade, dividido em quatro partes, cada qual com uma cor.

A legenda embaixo mostrava quais eram os limites dos condomínios. O condomínio de ar, representado pela cor branca, se estendia desde o centro até o litoral. O condomínio de Terra, representado pelo verde e o de menor extensão, ficava no noroeste da cidade e era banhada pelo litoral. Todo o Sul da cidade era predominante do condomínio de fogo, com a cor vermelha. Por fim, de cor azul, o condomínio de água, que se encontrava na fronteira com a Bolívia. Aquele grupo fora colocado ali por ser o mais confiável. Apenas pessoas puras e inocentes têm golens de água, por isso, são os mais confiáveis de se ficar na fronteira. Qualquer outra classe daria muito trabalho aos guardas, tentando fugir frequentemente.

Wander esperou para ver se ainda havia mais alguma coisa para mostrar. Porém, o mapa continuava na tela, estático. Por fim, o garoto desistiu e desligou a TV.

Sem nada para fazer, se afundou no estofado macio do sofá. Suas esperanças estavam sumindo às mínguas. Sua mãe, seu pai e sua irmã vieram à memória. Tudo oque ele queria naquele momento era o carinho de sua namorada. Suas palavras de consolo, sua boca doce e seus abraços calorosos. O cabelo com cheiro de rosas, a pele sedosa, a voz suave. Ela não se abalava.

Não, aquilo certamente estava errado. Era óbvio que Marah se entristecia. Ele estava tão cego com o próprio sofrimento que se esqueceu dela. Em momento algum ela citou os pais. Nenhum. Provavelmente vieram a morrer naquele caos. E a sua preocupação com Wander, achando que ele morreria. Nenhum amigo ou amiga para lhe fazer companhia. Ela precisava dele naquele momento tanto quanto ele precisava da dela.

Aquilo lhe deu esperanças. Se tornara o seu novo foco. Fugir dali e voltar para a Maravilhosa, não importa oque custasse, os dois sobreviveriam àquela guerra política! Porém, até lá, o melhor era tentar se adaptar e formular um plano eficaz. Encontrar aliados não seria difícil, ele estava cercado por pessoas explosivas e que com certeza também odiavam aquela situação tanto quanto ele.

"Só espere, Marah; é só uma questão de tempo até que nós saiamos desse caos, juntos e ilesos", pensou Wander, mais determinado que nunca.