Prólogo

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         Em 1996, 84 anos após a maior tragédia marítima ocorrida em toda a história, um grupo de caça tesouros liderado por Christopher Morgan parte em busca dos destroços que restaram do colossal transatlântico Titanic — o Navio dos Sonhos que naufragara após uma colisão à estibordo num Iceberg na noite de 14 de abril de 1912 — que, agora, jazendo na escuridão numa completa confusão de aço e fragmentos corroídos, estava completamente submerso a 4 mil metros de profundidade no Atlântico Norte.

       A equipe de Chris estava a procura do colar de diamantes denominado "Coração do Oceano", diamante este que um dia pertencera à coroa de Luís XVI. Motivados a explorar todo o navio em busca da joia perdida com seus submersíveis robóticos ou tripulados, eles vasculhavam cada minuciosidade do desvão do Titanic. Mas embora aparentemente parecesse uma missão impossível de se obter êxito, levando em consideração os demasiados destroços e escombros que dificultavam tanto a localização quanto o caminho, além de haver muitos lugares a serem descobertos ainda, a equipe tinha uma breve noção de onde poderiam encontrar o cofre de Finn.

       Christopher, Steven Blanchett e mais dois tripulantes vagueavam deliberadamente por uma área específica da superfície do navio com seus submersíveis e, depois de contemplarem o estado fantasmagórico que o Titanic se encontrava, repousaram superficialmente na proa em decadência. Logo, soltaram o mini submarino robótico (controlado por Blanchett por meio de um controle remoto) em direção a um dos Decks, dado que o submersível em que estavam era grande demais para caber/entrar em certos lugares.

        Christopher observava atentamente tudo o que se passava pela tela transmissora das imagens capturadas pelo robô subaquático e, ao mesmo tempo, instruía Steven a seguir pelo caminho que levava ao quarto de Finn Collins — o ricaço que deu de presente à noiva o colar desaparecido durante o naufrágio que, agora, toda a equipe almejava encontrar. Muitos minutos se passaram, todo o cuidado que tiveram foi pouco, já que qualquer deslize deles contribuiria para o desabamento das estruturas extremamente frágeis. Todavia, passado um bom tempo de busca, eles conseguiram, finalmente, achar o lugar e o objeto, para a felicidade de todos. 

        Extasiados e animados, recolheram-se e voltaram à superfície com o cofre que todos acreditavam estar guardando a joia valiosíssima. Tão logo retornaram ao barco de pesquisas, toda a equipe se acoplou no convés para comemorar o sucesso do trabalho e, também, a bela recompensa: o pagamento. Entretanto, toda aquela animação desmedida durou muito pouco, porque perceberam que o colar de diamantes nunca esteve lá dentro e que a comemoração foi em vão. Com a mesma rapidez que a festança surgiu, desapareceu. Decepcionados e frustrados, não se importaram em verificar naquele instante o que encontraram, nem mesmo o caderno preto de desenhos todo sujo fora capaz de despertar a curiosidade neles.

         Horas mais tarde, quando o sol já tinha se posto, uma análise dos itens achados dentro do cofre foi feita e Chris conversava com um dos sócios ao telefone enquanto acompanhava todo o processo de avaliação. Ele estava um pouco distraído tentando convencer Jay Stewart a fazer uma nova busca pelo navio a procura do diamante, porque estava certo de que havia alguma coisa em meio a todo aquele destroço e, em algum momento, encontraria. Mas algo chamou a sua atenção, deixando-o demasiado surpreso. Uma imagem que apareceu de repente no visor a sua frente, para ser mais precisa, tanto que ele deixou o homem do outro lado da linha falando sozinho por um segundo. Morgan imediatamente se aproximou do pessoal que analisava o papel cor pardo manchado pelo tempo, porém muito bem conservado para uma folha que ficou dentro de um cofre a 400 hectares abaixo da superfície do oceano há tantos anos. Christopher arregalou os olhos cético com o que viu, impressionado, quase duvidando do que seus próprios olhos presenciavam. Era a imagem de uma bela mulher completamente nua desenhada à mão. Todavia, o que lhe chamou mesmo a atenção não foi nem o fato do desenho ter sido desenhado justamente no dia 14 de abril de 1912, a data em que o navio colidiu-se com o Iceberg, mas sim o que a mulher do desenho carregava no pescoço: o diamante que toda a equipe de Chris estava procurando durante tantos meses. Ele sorriu diante daquilo, um sorriso que rasgava a sua face.

         Com a descoberta, Morgan deu uma entrevista expositiva a um canal de tv no dia seguinte, pela tarde, explicando o feito. Posteriormente, já noite, a equipe insistiu em continuar com a busca à joia tão preciosa. Eles estavam realmente dispostos a achá-la, ainda mais depois do que encontraram, e fariam isso nem que tivessem que vasculhar cada cantinho do navio, embora grande parte dele já tivesse sido explorado. Christopher permanecera no comando e iria mandar mais um submersível ao oceano quando Doug lhe chamou, um amigo seu de equipe, dizendo a ele que havia alguém ao telefone que valia muito a pena atender. Relutando por um momento, decidiu pegar o telefone e, em menos de 20 segundos de conversa, a pessoa do outro lado da linha conseguira chamar sua atenção, deixando-o bastante surpreso. Tratava-se de Clarke Fairchild Daenerys, ou só Clarke Daenerys, uma das sobreviventes do naufrágio do Titanic e, coincidentemente ou não, a mulher que desenhara o desenho.

           Dois dias depois, durante a manhã, o helicóptero do navio de pesquisas, após buscar Clarke e sua neta em Nova Iorque, sobrevoava o oceano atlântico, voltando à origem da partida. Os olhos da primeira encheram-se de lágrimas ao recordar-se do dia em que tudo aconteceu, as lembranças ainda mantinham-se frescas em sua mente, em especial as mais tristes, no entanto evitou chorar para não preocupar a jovem ao seu lado. Desviou o olhar da janela e olhou para Oliver, o seu cachorrinho de estimação, e o acariciou tentando ocupar-se com algum outro tipo de pensamento enquanto não chegava. Então, pensou em seu desenho. Depois de todos aqueles anos, jamais lhe ocorreu a possibilidade de voltar a vê-lo, nem em um milhão de anos. Acreditava que ele já tivesse até mesmo se desfeito pelo tanto de tempo dentro da água, mas não, pela TV percebeu que ele estava praticamente novo em folha. Ela ainda tinha a imagem em sua mente, lembrou-se que fotografara aquele momento com sua memória e sabia que jamais esqueceria de algo tão precioso quanto àquela lembrança e àquela pessoa. E, agora, finalmente, poderia contemplar de novo a imagem do amor de sua vida, a garota de olhos verdes que dera sentido a tudo, que a amou até o último suspiro e a fez ver o quão especial realmente era. Aquele desenho definitivamente seria a sua joia mais valiosa.

           Não demoraram para pousar no heliporto do navio e, portanto, todas as bagagens foram retiradas. Clarke e sua neta, Susan, acomodaram-se no quarto dado a elas e não tardou para que o homem bonito de cabelos loiros desgrenhados e charmosos, Chris, e o homem moreno de grande simpatia, Steven, aparecessem no cômodo perguntando a elas se precisavam de algo. Sem pensar duas vezes, a resposta saiu da boca de Clarke prontamente, como se estivesse esperando justamente por aquela pergunta. Ela pediu para ver o desenho.

          Com o desejo concedido, fora levada ao lugar onde estava sendo feita a análise e, ao ver a imagem, a senhora não relutou em deixar algumas lágrimas quentes e saudosas inundarem o seu rosto. Fechou os olhos e permitiu-se ser levada ao momento antes do naufrágio, onde a recordação que ganhara destaque fora justamente o sorriso e o olhar sempre tão vivo da garota do desenho ao ser desenhada. Daenerys sorriu, apreciando a obra-prima guardada em sua memória e levou uma de suas mãos calmamente ao rosto para limpar as lágrimas derramadas. Quando voltou a abrir os olhos, deparou-se com os olhares curiosos e compreensivos dos que estavam presentes ali. Logo, Christopher se adiantou e foi mostrando o restante dos itens que encontraram nas buscas que fizeram pelo navio. Steven, por sua vez, após isso, explicou pacientemente à senhora o vídeo que passava na tela simulando passo a passo o que de fato ocorrera antes do Titanic afundar completamente no Oceano Atlântico. Entretanto, Clarke sabia que não tinha sido exatamente daquela maneira, ela vivera aquela tragédia e, mais do que ninguém, sabia como tudo tinha acontecido. Somente ela podia contar toda a real história, detalhe por detalhe, e o faria. Na sala onde estavam, Susan, Christopher, Steven e Johnny — um homem alto de pele negra que chegou um pouco depois —​ ficaram ao redor de Clarke, que estava sentada em sua cadeira de rodas devido à idade que a impossibilitava de ficar muito tempo em pé. Morgan pegou um gravador e o colocou sobre a mesinha de centro, dando assim total liberdade para a senhora começar a falar. Ela respirou fundo e, preparada, esboçou um pequeno sorriso:

— Foi há 84 anos... 

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