XIII - Elara

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Meu nome sempre foi, formalmente, Elara Merandus. Os registros me identificam como tal, mesmo que eu seja Eliea. Temi no momento em que Mackenzie apareceu na tela. Ela poderia me desmascarar por completo na frente de toda a corte, provocando uma verdadeira balbúrdia na solidez de meu governo. Duvido que eu consiga me manter nessa posição por muito tempo. Mackenzie provavelmente deixou Tiberias viver. Ambos. Penso no que essa interrupção de Mackenzie pode ter provocado nos meus planos para o futuro do reino. Temo que tenha que ser adiado ou não saia como planejado. Preciso de Tiberias morto. E o príncipe herdeiro exilado.

Não demoro muito a devanear. Assim que assumi o controle da situação, as grandes casas já me observam de perto, esperando encontrar uma brecha para me derrubar em qualquer erro que eu cometa. Por isso sigo rígida e atenta a tudo e todos. Não paro por muitos instantes. Rujo ordens, assino papéis, atendo telefonemas a todo momento. Os generais parecem esperar meu declínio também, pois tenho certeza que costumavam ser mais independentes antes que eu assumisse.

- Ataque em Corvium. - Um general vocifera, nervoso.

Corro até ele e observo o monitor.

- Últimos movimentos do Ataque Meândrico, general?

- Acredito que não, majestade. Isso parece outra coisa.

Não espero outra resposta mais vazia que essa, e ajo.

- Coloque o general Skonos na linha. Ordene que suas tropas instaladas em Corvium confiram o que está havendo e dêem um jeito nisso! Não podemos nos desgastar demais com rebeldes derrotados. Talvez seja uma armadilha para algo maior.

- General Viper, quero que você organize uma escolta e envie novas tropas para Corvium, quero estar preparada e com força máxima para quando ela... para caso ela apareça.

O general faz uma reverência rígida, e assim que ele abaixa um pouco a cabeça, vejo Maven vindo em minha direção com um semblante preocupante.

- Mãe!

- Maven, querido. O que está fazendo aqui?

Antes que ele possa responder, nos interrompem bruscamente.

- Majestade, há movimentação suspeita de dirigindo a Corvium pelo sudoeste. Estamos contabilizando mas de mil soldados na linha de frente, além de veículos e transportes aéreos.

- Me deixe ver. - Ordeno.

E como eu suspeitava, um comboio padronizado. Conheço a formação real, e acredito que a própria Mackenzie está sendo transportada. Talvez seja uma enganação, mas se não for ela, alguma coisa, ou alguém importante é.

- Tenente, prepare um V-18 para mim, meus sentinelas e e soldados.

- Certeza que não quer seu próprio jato, majestade?

Meus olhos azuis congelam os seus cor de âmbar.

- Eu ordenei que preparasse um V-18, tenente. O que ainda está fazendo aqui?

Ele se afasta rapidamente após uma reverência e eu quase esqueci que Maven ainda estava aqui. Já sabendo o que se passa em sua mente, me antecipo:

- Sim?

- Você vai até ? - Ele quase grita.

- Sabe que tenho treinamento, não é? Posso cuidar disso, querido.

- Você tem treinamento mas não é soldada, mãe. Você é a rainha! Precisa ficar aqui.

- Maven, sou a única aqui que conheço Mackenzie. Minha irmã possue poucos pontos fracos, e posso usá-los. Ela não está blindada. Preciso ir. - Por um momento, esqueço como Elara Merandus, a rainha de Norta, age. - Estou indo.

Os olhos de Maven se arregalam e não tenho paciência para aguentar sua mente agora. Me desligo dele despercebida.

- Eu também vou. E Mare.

Tá, eu não esperava por isso. Minha surpresa chega aos olhos e não a contenho. Maven precisa ver que não o vejo como um lutador porque ele não é um.

- Jamais! Nem você e nem Lady Mareena virão. Fiquem aqui sobre a proteção que posso lhes oferecer. - Vendo que convecê-lo será difícil, apelo. - Preciso de você vivo, Maven. Para o futuro.

Sinto que não o conveci. E tenho razão.

- Eu vou, mãe.

Aceno de imediato para um sentinela

- Não. Acho que não.

Meus passos ecoam pelo mármore e abafam as reclamações de um Maven teimoso. Disparo em direção a saída.

*****

A turbulência chacoalha todo o jato e as pessoas em seu interior. Sou controlada o suficiente para evitar tremer por outra coisa que não seja a turbulência. O pensamento de rever Mackenzie após tantos anos me deixa ansiosa. Tantas coisas ficaram pendentes. Mas afasto a ideia de que Mackenzie ainda é a irmã que eu costumava ter. Ela mudou. Não pensa mais como antes. E não estamos mais do mesmo lado.

- Majestade. - Sou chamada e percebo de imediato do que se trata. Aceno para ele e me aprumo.


O monitor explode em um chiado ruidoso. Uma bandeira cor de ouro com um brasão semelhante a uma explosão surge. Carrega um P discreto no centro. A cena da lugar a um rosto idêntico ao meu. Explodo de ódio pela minha cópia, minha irmã gêmea. Ela me assusta. Meu rosto me assusta.


Mackenzie sempre foi muito boa com as palavras, mas o que realmente dominou essa transmissão foi o silêncio. Foi em silêncio que ela acenou para que ele entrasse em cena. Foi em silêncio que Tiberias VII aparece, fitando o chão. É em silêncio que todos assistimos ao herdeiro ser ajoelhado ao lado de Mackenzie. É em silêncio que Maven se aproxima, seguido por um sentinela inútil. E é em silêncio que o que resta de seu coração cede mais um pouco. Seu irmão está esfarrapado, seus ossos saltados, e contusões por todo o corpo. Mas o pior são os olhos. O castanho cor de mel escureceu, enquanto os azuis de Maven vibram de medo.


Temo o quão envolvido Maven possa estar a ponto de estragar meus planos. Preciso que ele seja forte e veja o quão melhor sua vida pode ser sem a interferência da sombra de Tiberias.

- Tiberias VII. Futuro rei de Norta. - Mackenzie cantarola e pressiona suas costas para que se incline mais. - O herdeiro se ajoelha a nós. A mim.

Presto atenção ao local em que estão. Com certeza não é um veículo, o que me faz questionar o que há dentro do veículo que se dirige a Corvium. A razão por estarmos nos dirigindo para lá. E se realmente existe algo.

- Ela não está indo a Corvium. - Consto.

Seu sorriso sarcástico me corta por dentro. Mas não tanto quando o barulho que se aproxima.

- ELA ESTÁ AQUI! - Rujo para ninguém em especial, já que todos entram em desespero. Estamos sob ataque.

Algo colide contra o jato. Muitos passageiros se desequilibram, mas permaneço em pé. Uma bomba atinge a asa do jato, e antes que magnetrons possam fazer algo, já somos atingidos novamente. O jato se despedaça pelas mãos de magnetrons inimigos, e caímos.

Caio por menos de dez segundos, mas parece uma eternidade dentro de minha cabeça. Lembro de quando Mare caiu no escudo elétrico. Porém, olho para baixo e tudo que vejo é uma grama seca se aproximando muito rapidamente. Penso que será como um tapa na cara, mas minha queda é evitada por alguém. Fico a pouco metros do chão e me descem lentamente.

Meu coração ainda bate descontroladamente. Tento me recompor, olhar para cima e levantar. Mas tudo que consigo fazer é erguer os olhos.

E ela está lá, imponente em sua armadura tão dourada como seus cabelos. Seus olhos azuis são tão cortantes como facas. Mas nada se compara aos seu sorriso afiado. Puro escárnio.

- Olá, Eliea.


Príncipe EsquecidoOnde histórias criam vida. Descubra agora